O Estado na 3.ª pessoa! E o penalti de Portugal!

ricardo-florencio Ricardo Florêncio

Director Editorial Marketeer

Editorial publicado na edição de Julho de 2012 da revista Marketeer

Júlio César, imperador da Antiga Roma no século I antes de Cristo, costumava falar de si próprio na terceira pessoa.

Curiosamente, ouvimos cada vez mais portugueses falar do Estado na terceira pessoa.

Contudo, enquanto o objectivo de Júlio Cesar era o seu endeusamento, o enaltecimento, a divinização da sua pessoa, dos seus feitos, os portugueses referem-se ao Estado na terceira pessoa, pois pensam que é “alguém”, uma entidade, que nada tem a ver com eles. Quando se referem ao Estado, ao nosso Estado, referem-se como se de uma entidade estranha, e à parte, se tratasse. O Estado isto, o Estado aquilo, o Estado é que vai pagar, roubaram ao Estado, etc., etc.

Contudo, o português esquece-se que o Estadoé ele próprio. Não é uma entidade à parte. Somos nós!

Somos nós, os portugueses, quem paga o Estado. Somos nós, através dos diversos, inúmeros, impostos que pagamos, directos e indirectos, que suportamos todos os custos do Estado. Somos nós que pagamos as PPPs, os buracos e prejuízos das empresas do sector público estatal. Nós somos o Estado. E assim, quando roubam o Estado, somos nós que estamos a ser roubados. Quando o Estado paga mais do que devia, somos nós que estamos a pagar mais do que devemos. Quando se destroem activos que são do Estado, somos nós que teremos de pagar. Quando se refere que o Estado tem de pagar indemnizações a empresas, não se ouse encolher os ombros, pois somos nós todos que pagamos.

Acabemos já com a loucura de acharmos que o Estado é uma entidade que não nos toca, com a qual nada temos a ver. Só nos estamos a enganar a nós próprios.

Ao ver os últimos penaltis da meia-final entre Portugal-Espanha deste campeonato da Europa, lembrei-me de imediato do fantástico filme de Woody Allen, “Match Point”. Este filme começa com a imagem de uma bola de ténis a bater na parte superior da tela da rede que separa os dois campos, sem se conseguir prever para que lado irá cair. A diferença entre cair num lado ou no outro é a de um vencedor e um vencido. E o narrador refere: “O homem que afirmou ‘prefiro ter sorte a ser bom, tinha uma grande intuição’; e ‘temos que admitir que grande parte da vida depende da sorte’.”

É a sorte ! É a sorte que dita e influencia uma parte das nossas vidas.

No caso, foi a diferença entre o penalti marcado por Portugal, em que a bola bate na parte interior da barra, e não entra, e o penalti seguido marcado por Espanha, em que a bola bate no poste, mas entra. Há alguma ciência que diferencie as duas situações? Arte, engenho? Não, apenas a sorte! E assim, e apenas baseado na sorte, se define um vencedor. E assim, numa ínfima fracção de segundo, se concluem das semanas e anos de trabalho, de selecções que trabalham e preparam para ganhar um Campeonato da Europa de Futebol.

A sorte, às vezes, tem-se, outras vezes, não.

Obviamente a sorte em si nada resolve, mas tenhamos em mente que a sorte desempenha um papel fundamental nas nossas vidas.

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