Experiência é a madre de todas as cousas

Por Francisco Viana
Director de Comunicação e Marca da CGD

Um dos primeiros califas da dinastia omeia, no final do século VII, tornou-se célebre por preferir a persuasão ao uso da força. Dizia «não uso a espada quando o chicote é suficiente, nem o chicote quando a minha palavra chega e, mesmo que só um cabelo me separe dos meus homens, não deixo que ele se corte; quando eles puxam, eu afrouxo, quando eles afrouxam, eu puxo». Muito antes da sofisticação dos webinars, dos summits, dos brainstormings, dos pitches, a forma de tirar melhor partido do rendimento de um grupo era preocupação dos líderes. Não tinham, decerto, a sistematização do pensamento, nem a estruturação de ideias e de objectivos que nós temos. A preocupação com a importância das formas de bem liderar está presente ao longo dos tempos. Assume, por vezes, expressões literárias. Luís de Camões escreveu «o fraco rei faz fraca a forte gente» e «não houve forte capitão que não fosse também douto e ciente».

É impossível resumir em três ou quatro palavras aquilo que representa liderança. Ou mesmo defini-lo de forma taxativa. Mas há princípios que nos são caros e nos focam em permanência. E que não se afastam muito das ideias de “motivação” e de “acção” que estavam subjacentes ao pensamento do califa Muwaiya e ao de Luís de Camões. Tal como ser douto e ciente e ter uma atitude de proximidade para com os que lideram são, antes de mais, exemplos de compromisso prático com a realidade. E com uma continuada prática. Vale a pena recordar uma frase de Henry Mintzberg: «A liderança, como nadar, não se pode aprender fazendo leituras, unicamente.» A afirmação não é mera boutade de boa disposição.

É por isso que, quando falamos de execução estratégica e eficiência dos quadros de topo (diversas lideranças), nos focamos na necessidade de incentivar a resiliência, garantir o compromisso e promover o alinhamento com a estratégia da organização a médio e a longo prazo. Tal como nos é essencial aceitar a diversidade dentro da equipa, promovendo o comprometimento com valores morais, éticos e sociais, conduzindo comportamentos e uma cultura que determina a performance. Assim como, finalmente, é importante conseguir as pessoas certas para perseguir as metas estabelecidas, desafiando-as e mantendo-as focadas nos objectivos finais.

Muitas vezes, a linguagem que utilizamos tem algo de castrense: performance, estratégia, agilidade, coordenação. Mas a verdade é que, da experiência de terreno dos militares e da sua capacidade de condução de homens podemos tirar muitos e úteis ensinamentos. É significativo que tenha sido um militar, o gen. Edward M. Flanagan, Jr. a escrever, em 1985, “Before the battle: a commonsense guide to leadership and management”. Mais interessante é notar que um, hoje usadíssimo, decálogo sobre liderança tenha sido enunciado nessa obra. O gen. Edward M. Flanagan, Jr. tinha passado por diversas guerras (II Guerra Mundial, Coreia, Vietname…), o que lhe conferira conhecimento, que passou depois à escrita. O conhecimento da realidade prática assume aqui papel de destaque, a que não é alheia uma permanente necessidade de adaptação ao mundo. Regressemos aos clássicos. E recordemos as palavras de Duarte Pacheco Pereira no Esmeraldo de situorbis, «a experiência é a madre de todas as cousas, por elas soubemos radicalmente a verdade». É essa permanente procura, de mais experiência, mais verdade, que estão na base de uma acção de que não nos podemos desviar, num mundo que se move a uma velocidade cada vez maior.

Artigo publicado na Revista Marketeer n.º 281 de Dezembro de 2019

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