Vinhos portugueses devem sair mais caros

Os vinhos portugueses são «reconhecidos internacionalmente como tendo uma excelente relação custo-benefício, um grande “value for money”, mas podemos puxar mais os nossos preços para cima. E isso exige uma mudança de atitude dos produtores». Quem o diz é Jorge Monteiro, presidente da ViniPortugal.

O responsável falou à Marketeer à margem da Prowein 2017, a maior feira de vinhos do mundo, que terminou ontem em Düsseldorf, na Alemanha. Neste evento, Portugal esteve representado com 364 produtores, a sexta maior comitiva – a seguir a Alemanha, França, Itália, Espanha e Áustria. Muitos deles estão presentes através do stand da ViniPortugal, a associação que tem como objectivo a promoção dos vinhos portugueses no exterior através da marca Wines of Portugal.

Para Jorge Monteiro, os números dizem bem da capacidade do sector vitivinícola português em se promover como um todo, mas há ainda um trabalho de fundo a realizar na melhoria qualitativa de alguns vinhos, bem como na capacidade negocial dos produtores, por forma a aumentar o preço médio de exportação. Segundo os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística (INE), este valor rondava os 2,70 euros por litro no primeiro trimestre de 2016.

Qual a importância da Prowein para o sector vitivinícola português?

Esta é a grande feira mundial de vinhos. Há aqui compradores de todo o mundo que se deslocam para conhecer as novidades, descobrir novos operadores e destinos de vinho. O facto de estarmos aqui com mais de 350 empresas é sinal dessa importância.

Temos sabido acompanhar o desenvolvimento da Prowein, desde o início. Hoje, não somos uma extensão que vale a pena ir visitar, mas uma das zonas mais frequentadas da feira, o que significa que vamos ganhando credibilidade e que as pessoas sentem cada vez mais atracção por conhecer o que Portugal anda a fazer neste sector. Estamos a afirmar uma imagem colectiva dos vinhos portugueses.

Entre todos estes produtores, há players de grande dimensão, mas também outros mais pequenos que têm mais dificuldades para estar presentes. Como é que a ViniPortugal procura nivelar ao máximo a presença das empresas portuguesas na Prowein?

Nós não temos uma preocupação particular em relação à dimensão. Não comungamos da opinião de que temos de proteger os pequeninos! Vivemos num quadro de competitividade e as empresas têm que saber adaptar a sua dimensão no mercado em que disputam. Obviamente que uma empresa de grande dimensão pode ter uma oferta melhor distribuída na gama, enquanto as empresas de menor dimensão vão ter de se especializar em nichos.

Nós tratamos da mesma forma os pequenos e os grandes [produtores], mas é evidente que uma presença colectiva é muito mais relevante para os primeiros. O problema que nós pretendemos resolver é criar dimensão e aparecer com a marca-País, debaixo da marca Wines of Portugal.

Preocupa-o o crescimento do mercado português e a gestão necessária ao nível da área agrícola? Há o risco de perda de qualidade dos vinhos?

Teoricamente, sim, na prática, não. Na Europa, o sistema de regulação e contingentação não permite um crescimento elevado do plantio. Os regulamentos comunitários permitem uma emissão não superior a 2% de direitos de plantação em cada país, e Portugal vai ficar abaixo desses valores, o que significa que não há um cenário de crescimento de vinha nos próximos anos.

Por outro lado, se tivermos em conta que, nos últimos anos, Portugal tem rondado os 6,4 milhões de hectolitros de produção e estamos a consumir cerca de quatro milhões de hectolitros e a exportar cerca de três, isto significa que neste momento temos um défice de produção crónico, ou seja, o somatório do que consumimos e do que temos sido capazes de exportar é superior ao que produzimos. Mas eu acho que este desequilíbrio pode ser benéfico se formos inteligentes! Porque há vinhos produzidos em Portugal com potencial de melhoria qualitativa, se houver investimentos na enologia, na adega.

Para crescer também em valor?

Sobretudo para crescer em valor, sim. Esta sobrecapacidade de colocação dos vinhos portugueses pode ser aproveitada para melhorar a nossa qualidade e a percepção que o consumidor tem dessa qualidade. Somos reconhecidos internacionalmente como tendo uma excelente relação custo-benefício, um grande “value for money”, mas podemos puxar mais os nossos preços para cima. E isso exige uma mudança de atitude dos produtores. Não basta estarmos convencidos que somos tão bons como os outros; temos que colocar essa convicção na mesa de negociações, mas muitas das vezes caímos na armadilha do preço.

Andámos 40 anos a viver para mercados condicionados. Aquilo que não tinha colocação em Portugal era vendido para as ex-colónias. A qualidade não fazia parte dos nosso objectivos. E ainda não temos gerações suficientes educadas num primado do mercado, com boas técnica de negociação, e isso demora algum tempo.

Quando fala nessa “falha” de planeamento nas exportações, inclui Angola ou é um caso à parte? Ainda acredita numa recuperação do mercado angolano?

Tenho alguma esperança, mas o futuro do vinho português não vai depender disso. Cometemos um erro de uma excessiva dependência de Angola, sendo certo que era um mercado com uma fidelidade enorme à marca Portugal. Mas essa fidelidade mantém-se. O problema de Angola é a indisponibilidade de produto. Assim que o produto volte às prateleiras, eu não tenho dúvidas que o consumidor angolano vai continuar a preferir vinhos portugueses.

Quais são as alternativas?

Já foram encontradas. Nós perdemos 70 milhões de euros em exportação para Angola em dois anos e fechámos 2016 com o mesmo valor de exportações que em 2014, o que significa que Portugal teve um comportamento extraordinário. O produto que deixámos de colocar em Angola nestes dois anos foi colocado noutros mercados. Hoje, o nosso principal destino de vinhos de mesa são os EUA, estamos a crescer a um ritmo elevado no Canadá, Japão, Suíça, Polónia, China, Rússia… ou seja, não fomos colocar o que se perdeu em Angola num outro mercado qualquer, mas num conjunto de mercados.

E isso ajuda a mitigar o risco.

Exactamente.

E quando Angola retomar?

Vai ser um ganho marginal, porque o que estava em Angola já está colocado. O sector encontrou alternativas, demonstrando uma capacidade de reacção muito interessante.

Texto de Daniel Almeida, em Düsseldorf

Artigos relacionados