Todos somos consumidores

Por Sara Peixoto, advogada na Dower Law Firm

Celebrou-se, a 15 de Março, o Dia Internacional do Consumidor.

Benjamin Franklin é o autor da famosa citação “…nothing is certain except death and taxes…”. Atrevemo-nos a acrescentar que, na sociedade normativa actual, certo é que, mais cedo ou mais tarde, todos seremos consumidores.

Embora desconhecido da sociedade em geral, e vislumbrado, muitas das vezes, apenas numa óptica de “bom senso das práticas comerciais”, o direito do consumo tem propósitos de tutela específicos, que merecem a atenção dos mais desatentos.

Por um lado, visa assegurar a protecção do consumidor, conferindo previsibilidade e harmonia de aplicação substantiva e processual das normas em causa. Por outro, confere linhas orientadoras do comércio que visam criar condições de estabilidade, segurança e profícua concorrência, o que sucede num mercado cada vez mais exigente e globalizado.

Actualmente, seja em contexto nacional ou mesmo internacional (destacando-se o plano europeu), são vastos e variados os meios de defesa ao dispor do consumidor, através dos quais se procurou assegurar-lhe uma tutela especializada, célere, eficaz e harmoniosa. Mas, se é certo que existiu essa procura, é, igualmente, verdade, que as respostas asseguradas, ainda que em número sejam suficientes, não o são em celeridade e eficácia.

Foi em 2019 que “novas” promessas de maior rapidez e aproveitamento no tratamento dos litígios de consumo surgiram. A Lei n.º 63/2019, de 16 de Agosto, veio prever, em alteração à Lei de Defesa do Consumidor, que os conflitos de consumo com valor até 5000 euros ficariam sujeitos a arbitragem necessária ou mediação quando, por opção expressa dos consumidores, fossem submetidos à apreciação de tribunal arbitral adstrito aos centros de arbitragem de conflitos de consumo legalmente autorizados.

Bem recebida pelos consumidores esta novidade, a mesma rapidamente veio demonstrar que se procurou resolver “a doença” sem dotar “o médico de ferramentas para a tratar”. Contraditório? Pois bem, de facto foi. Deparamo-nos, actualmente, com uma ferramenta de tutela que, apesar de efectivamente útil, porquanto não foi precedida de um investimento nos centros de mediação e arbitragem de consumo, não logra ser utilizada.

A opção de tutela apregoada como célere, eficaz e progressiva, não cumpre o seu papel. Se os tribunais judiciais e os julgados de paz se encontram, verdadeiramente, assoberbados, muitas vezes acabando os processos de consumo de menor valor por ser tratados como “litigância menor”, a verdade é que os centros de arbitragem não dispõem de meios humanos, tecnológicos e de espaço, para dar uma verdadeira, rápida e justa resposta (seja do ponto de vista do profissional ou do consumidor). Frustrados foram, portanto, os intentos do legislador, pois se o princípio é bom, sem meios a boa vontade não chega!

As críticas poderiam somar-se… porém, por hoje, deixa-se apenas o apelo: se os investimentos na justiça (e naquela que é de proximidade) são caros, a morosidade e litigância improdutiva no sistema judicial são fatais ao desenvolvimento social, dos mercados e do próprio conceito e sentimento de justiça.

A verdadeira poupança faz-se de investimentos. Até porque a verdade, é: todos somos consumidores.

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