Deloitte desvenda 7 tendências de Marketing: do mundo sem cookies às experiência híbridas

O propósito dos profissionais de Marketing será criar a melhor experiência possível para os clientes. No entanto, este conceito terá diferentes significados consoante a época e o contexto. Actualmente, e num mundo cada vez mais tecnológico – mas também preocupado com a sustentabilidade do Planeta –, o propósito parece ser a linha orientadora a manter em mente.

Não é de estranhar, por isso, que esta seja uma das tendências identificadas pela Deloitte no relatório “Global Marketing Trends 2022”, sendo logo a primeira de um conjunto de sete caminhos apontados para as marcas definirem as suas estratégias.

João Matias Ferreira e Filipe Sampaio, associate partners da Deloitte, marcaram presença na 18.ª Conferência Marketeer na pele de keynote speakers precisamente para dar a conhecer estas tendências – resultado de um estudo desenvolvido anualmente e que tem por base um inquérito a mais mil executivos de topo a nível global e 500 consumidores em Portugal.

De acordo com os responsáveis, o top 3 de prioridades dos executivos para os próximos 12 meses é composto por: vontade de melhorar a produtividade e eficiência; melhorar o engagement com os clientes; e acelerar a transição digital e tecnológica. Logo depois, surge uma preocupação com o bem-estar dos colaboradores e a necessidade de aumentar o impacto da organização na sociedade.

E é neste cenário que surgem, então, as sete grandes tendências de Marketing para este ano:

1 – Propósito

Filipe Sampaio explica que o propósito é um verdadeiro motor de crescimento. E não é de agora. A palavra tem estado nas bocas do mundo e continua a revelar-se fundamental para o crescimento das marcas, mas também das empresas. Segundo o keynote speaker, o propósito está muito ligado à procura natural do ser humano por um significado para a sua existência.

Como consequência, todos os consumidores se sentem mais ligados a marcas que vão além da obtenção do lucro e que têm um impacto positivo na comunidade e no ecossistema que as rodeiam. Esta constatação será verdade tanto para os consumidores (no processo de escolha de um produto ou serviço) como para o talento (os profissionais querem trabalhar em empresas com as quais se identificam).

Mas basta ter propósito? Filipe Sampaio não hesita em dizer que não. O preço e a qualidade continuam a ser os principais critérios na escolha de um produto (60 a 80%). Porém, são características que os clientes tomam como garantidas, pelo que estarão à espera de mais. O propósito surge, então, como forma de as empresas se diferenciarem. Como? Através da incorporação do propósito de forma holística, ou seja, que vai além da comunicação. Não é suficiente dizerem que têm um impacto no mundo. Têm de o demonstrar, integrando o propósito nos diferentes processos e áreas da organização, incluindo o recrutamento e a escolha de fornecedores, entre outros. Segundo o estudo da Deloitte, são estas as empresas que mais conseguem crescer.

Importará também saber medir o propósito, garantir que há métricas para perceber se o mesmo está a ser incorporado, de facto.

2 – Marketing autêntico e inclusivo

Diversidade e inclusão são outras das palavras repetidas com frequência quando se fala de comunicação (e não só) das marcas. João Matias Ferreira lembra que, hoje, conhecemos melhor a diversidade da população e que, também por isso, já não haverá desculpas para fechar os olhos. A questão que se coloca é qual será o papel do Marketing… O mesmo estudo mostra que os consumidores estão mais disponíveis para interagir, comprar bens e serviços a marcas com uma preocupação autêntica com os temas da diversidade e inclusão.

É claro que existem diferenças geracionais. Os mais novos parecem mais sensíveis a estes temas, mas, ainda assim, é uma preocupação presente nas várias faixas etárias.

Também aqui as empresas que mais crescem são aquelas que estão um passo à frente no tratamento da diversidade e da inclusão. São as que têm a capacidade de definir métricas e objectivos que o evidenciem, como a contratação de colaboradores, a sua retenção, o modelo de gestão de evolução de carreiras, a construção da estratégia de comunicação (interna e externa), os critérios de investimento na comunidade e sociedade, entre outros.

Certo é que «não é uma questão de publicidade, de construção de mensagens publicitárias», frisa João Matias Ferreira. É, sim, uma questão de princípios e verifica-se uma responsabilidade na área do Marketing no sentido de conseguir fomentar esta cultura e consistência no tratamento da diversidade e da igualdade.

3 – Dados inteligentes

A função dos marketeers e Chief Marketing Officers (CMOs) mudou muito na última década, começa por afirmar Filipe Sampaio. Antigamente, eram profissionais que geriam equipas compostas, na sua maioria, por talentos criativos, mas agora não se pode – ou não se deveria poder – dizer o mesmo.

Com a transformação do consumidor (hoje mais autónomo e digital), os marketeers assumem uma função de «quase guardião de informação do cliente». Segundo Filipe Sampaio, isto obriga a que as equipas de marketing sejam completamente diferentes, estando as marcas em busca de perfis mais analíticos.

O problema é que estes perfis não olham, habitualmente, para o marketing, como uma primeira escolha. Daí que também seja tão crucial a delineação de estratégias de captação e retenção de talento – que poderá passar, por exemplo, por uma colaboração mais estreita com outras áreas e com outras empresas.

Outra solução em cima da mesa passará para por olhar também para outros perfis, como é o caso dos influenciadores digitais, uma vez que são figuras que conhecem muito bem o produto e o consumidor. São pessoas próximas dos consumidores, pelo que o associate partner deixa o conselho: «Puxar o influenciador para dentro da empresa.»

4 – Um mundo sem cookies

Caminhamos progressivamente para um mundo sem cookies, ou, pelo menos, as cookies tradicionais que conhecemos (as chamadas third party). João Matias Ferreira considera que o grande desafio, neste âmbito, será continuar a conhecer os clientes da forma que as marcas conseguem conhecer hoje, mas sem as ferramentas a que estão habituadas.

É que, à medida que o volume de dados tem vindo a aumentar ao longo dos últimos anos, também a capacidade das organizações de trabalhar e transformar os dados em insights relevantes que permitam a personalização cresceu.

Porém, hoje, vemos uma mudança de paradigma – impulsionada, por um lado, por obrigações regulatórias e, por outro, pela exigência dos consumidores, que compreendem a importância da privacidade dos seus dados. Existe também um aumento de consciência por parte da sociedade face ao valor dos dados pessoais e uma maior análise crítica ao custo-benefício da cedência dos mesmos.

Entre as empresas de maior crescimento, mais de 60% já adoptou uma estratégia diferente, assente dados first party. Esta abordagem permite maior controlo e autonomia na captação de dados e na sua transformação em insights para continuar a fazer mais e melhor personalização.

Para enveredar pelo caminho do first party, é preciso ser criativo, encontrar novas formas de ir buscar dados diferentes, que complementem a informação que as marcas têm de base. «Sem dúvidas que os temas de loyalty e gamificação terão um papel importante nesta matéria», adianta João Matias Ferreira, acrescentando que first party não significa que a organização se vire para si própria. O responsável alerta mesmo que se trata do contrário: está mais do comprovado que os ecossistemas são importantes, nomeadamente para encontrar parceiros que ajudem a desenvolver propostas de valor diferenciadoras. Ou seja, ganhar vantagens competitivas. «Olhar para fora e procurar parceiros para ter informação que permita enriquecer a minha base, conhecer melhor os meus clientes e o mercado em que opero», conclui.

5 – Experiência de dados… humana

Parece contraditório, mas não é. Filipe Sampaio afirma que existe uma fronteira muito ténue entre os dados que são utilizados pela empresa e a que o consumidor reconhece alguma utilidade e aqueles que o consumidor vê como intrusivos, ou até mesmo assustadores.

A Deloitte apresentou 10 cenários aos consumidores inquiridos para perceber a sua percepção em relação a práticas como active listening e tracking de georreferenciação (mais intrusivos) ou recomendações com base em hábitos de consumo (menos intrusivos). «É como um primeiro encontro», diz Filipe Sampaio: seria muito estranho dizer a alguém que, com base no que fez num dia, deveriam escolher determinada actividade. «Porque ainda não tenho relação com a pessoa. Ao fim de cinco ou seis encontros, se calhar já estou mais receptivo a receber recomendações de restaurantes, por exemplo.»

Resumindo: enviar alertas de saldos, tendo em consideração pesquisas já realizadas por determinada pessoa, é permitido; ouvir aquilo que estão a dizer junto ao telemóvel já não é tão bem visto.

O que fazer, então? Em primeiro lugar, criar uma relação para que o cliente esteja mais aberto a receber sugestões – ou seja, promover interacções. Depois, apostar na honestidade e explicar ao cliente para que fins serão utilizados os seus dados e que benefícios poderão ter por os ceder. Por último, investir na coordenação com outras áreas das empresas, como a de segurança, para perceber se a privacidade dos consumidores não é posta em causa.

6 – Experiências híbridas

Desenvolver e melhorar a experiencia híbrida (combinação do mundo físico e digital) é outra das tendências apontadas pela Deloitte. João Matias Ferreira recorda que, desde o início da pandemia, assistimos a uma evolução significativa no espaço digital e que há exemplos muito bem conseguidos de melhoria, nomeadamente no sector financeiro, com cada vez mais clientes a utilizarem os canais digitais (como o mobile banking). Aliás, nesta área, o crescimento em cerca de dois anos terá sido o equivalente ao que se esperaria que acontecesse em três a cinco anos.

«O caminho de transição para o digital não vai parar!», realça João Matias Ferreira. Contudo, existe um consenso entre os executivos auscultados no sentido de ser preciso equilibrar e proporcionar uma experiência consistente no mundo digital e físico. O omnicanal.

75% dos gestores pretende investir no híbrido, numa abordagem também conhecida como phygital. Quais os benefícios? A possibilidade de personalizar melhor a oferta, inovar no seu desenvolvimento, ter melhores momentos de interacção com os clientes, gerar mais engagement e ter experiências mais inclusivas.

A intenção é dar capacidade de escolha ao cliente: este decide que canal mais lhe convém. Pode até querer transitar entre canais sem perder contexto, sem disrupção. «Só assim a escolha será verdadeiramente livre. Caso contrário, estará condicionada pela nossa própria limitação em proporcionar experiência», afirma João Matias Ferreira, referindo-se à oferta das marcas.

O caminho passa por ter estruturas e sistemas que suportem esta fluidez entre canais, repensar a jornada em ambos, além de monitorizar a satisfação a cada momento e em cada canal. Acima de tudo, ter capacidade de orquestração de canais. Segundo o associate partner da Deloitte, há muito caminho ainda para percorrer. «Há investimentos a serem feitos, mas, seguramente, será uma tendência sobre a qual iremos falar muito nos próximos tempos.»

7 – Potenciar o apoio ao cliente com Inteligência Artificial

O serviço ao cliente sempre foi visto como algo reactivo em termos de promoção. As equipas de contact center tendem a ser olhadas como equipas que recebem chamadas, ajudam a tratar pedidos e reclamações, ficando longo do título de “proactivas”.

Mas Filipe Sampaio acredita que não tem de ser assim. No inquérito que a Deloitte realizou aos consumidores, ficou claro que aquilo que mais valorizam é que tenham uma oferta no timing certo e um serviço ao cliente com conhecimento de causa, que os ajude de facto. Em suma, que seja útil!

Neste cenário, que tal potenciar este desejo dos consumidores com a Inteligência Artificial (IA)? Hoje, já várias empresas usam IA nos canais de serviço ao cliente, nomeadamente através de chatbots. No entanto, a utilização de chatbots por si só não melhora a experiência. Torna-a mais imediata, mas carece de componente humana.

Filipe Sampaio sugere ainda que o customer service pode ir mais longe, se puder de facto encontrar a melhor oferta e timing para o cliente. Muitas empresas já fazem pilotos em torno deste tema através do natural language processing, ou seja, a utilização da IA para perceber, com base no que o cliente diz (palavras, tom de voz, expressões), qual é o momento ideal para promover um produto ou serviço.

A mensagem a reter, neste caso, é: «Não perder o lado humano. Usar a máquina para potenciar a qualidade humana. E não temos de ser especialista em IA, as ferramentas estão disponíveis e podemos fazer bom uso delas.»

Texto de Filipa Almeida

Foto de Filipe Pombo

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