Adeus Marca Portugal
A marca Portugal está prestes a conhecer mais uma vicissitude grave, que certamente afectará a percepção internacional dos seus produtos e activará nos seus públicos uma reacção de repúdio pelo seu discurso institucional, comercial e financeiro.
Com a mais do que certa crise de pagamentos externos, a República Portuguesa dá mais um passo na sua já longa e persistente senda de fracassos enquanto marca nacional.
Se, em vez de um País, Portugal fosse uma empresa global, seria inevitavelmente prescrito um rebranding profundo, para sinalizar de modo extremo a refundação organizacional e fazer um reset para um novo tempo, centrado em compromissos mais sérios e programados com os seus clientes, fornecedores, credores e stakeholders.
Tratando-se de uma nação soberana – com o que limitadamente isso signifique hoje – o rebranding pode parecer uma solução exótica e o mais certo é que nos fiquemos por uma mudança do Conselho de Administração e alguns acertos na comunicação.
Porém, os efeitos do calote que vamos pregar aos nossos credores afectarão mais do que a imagem de Portugal, pois a magnitude e impacto do evento transmitirão uma mensagem estrutural acerca do que somos e da forma como reiteradamente nos comportamos para com os outros.
Significa, pois, que o adivinhado “haircut” das nossas dívidas afecta mais do que a nossa Imagem internacional, impregnando com profunda negatividade a nossa própria Identidade como País e, nesse sentido, é um gravíssimo problema para a Marca Portugal.
A reiterada incapacidade da Empresa Portugal para manter uma actividade económica competitiva no plano global e saldar honradamente os compromissos financeiros com fornecedores, clientes e credores diminui também o valor profissional de todos nós que exibimos a marca nacional no Bilhete de Identidade e no Passaporte.
Patriotismo à parte, não há dúvida nenhuma que, no plano internacional, se manifesta uma presunção de incompetência sobre o cidadão de um País incompetente. E também é certo e sabido que se presume que qualquer cidadão de um País competente é capaz e sério.
É claro que estas presunções – nascidas de percepções reiteradas pelos factos e a comunicação sobre os factos relativos ao País – prejudicam efectivamente os portugueses competentes e beneficiam, por exemplo, os alemães e suecos que sejam patifes e preguiçosos.
Esta consideração leva-nos a um ponto essencial da reflexão sobre as Marcas País, que é o de saber que produto ou produtos são por ela suportados e vendidos.
Marcar as pessoas
No mundo globalizado em que nos movemos, parece cada vez mais evidente que o papel das marcas País se manifesta hoje, sobretudo, como presunção internacional de valor ou desvalor sobre os seus cidadãos nacionais.
Relativamente a um País que funciona mal em matérias de governação pública, os mercados formulam uma expectativa geral de mau funcionamento também nas empresas e nas pessoas privadas. Basicamente, acreditam que se, nesse País, houvesse pessoas e empresas capazes e honestas, e em número suficiente, elas não deixariam que a governação pública descambasse. Contudo, em todos os países com dificuldades de governação pública há excelentes pessoas e excelentes empresas privadas, que vencem nos mais competitivos mercados internacionais, não deixando que os maus exemplos da política nacional afectem o seu desempenho empresarial.
A estas empresas excelentes localizadas em países medíocres há quem chame “the right companies in the wrong country”, o que, na minha opinião, é uma das mais cruéis expressões insultuosas que se podem proferir sobre uma nação.
Mas a dureza da frase pode também chamar a nossa atenção para a intensidade do valor económico que uma marca nacional pode ajudar a criar, se o País conseguir apresentar-se como razoavelmente bem governado.
Se o produto base da Marca-País é a qualidade da governação, então a ideia central de Portugal só pode ser estabilidade política e equilíbrio nas contas externas. Infelizmente não podemos apresentar nem uma nem outro.
Resta aos cidadãos e às empresas desmentirem com actos competentes as presunções de incompetência que a marca nacional lhes propaga e, vencendo as dificuldades, reduzir a marca nacional à irrelevância comercial.
Artigo publicado na edição Abril 2011 da Revista Marketeer