Viver com a nova normalidade
Por Nuno Pinto de Magalhães,
Chairman da Central de Cervejas e Bebidas
Esta pandemia veio comprovar a fragilidade do mundo em que vivemos, a nossa impotência como humanos face ao universo, pois todos – dos mais ricos aos mais carenciados, dos mais evoluídos aos menos desenvolvidos, com melhores ou mais débeis sistemas de saúde – fomos radicalmente afectados! Trouxe- -nos também a evidência de que a ciência e o conhecimento humano são limitados e por vezes falham. Mas também nos demonstrou que, quando a necessidade é globalmente imperiosa, condicionando vidas e a economia, estes se reinventam e aceleram, ultrapassando obstáculos e optimizando procedimentos, de forma a que, num timing sem precedentes, se conseguisse desenvolver, testar e distribuir mundialmente vacinas eficazes.
Gerou-se uma solidariedade nunca vista a nível interplanetário: todos juntos por uma causa – a vacina e/ou o remédio para a cura… porque já se percebeu que esta nova realidade está para ficar e temos que nos adaptar.
Sou daqueles que acha que o Mundo vai, aliás já está, a mudar em muitos aspectos, nomeadamente na nossa forma de trabalhar, reiterando, tal como Darwin há muito comprovou, que os seres vivos têm uma capacidade de adaptação extraordinária. Passámos a interagir e a relacionarmo-nos presencial ou digitalmente, consoante as possibilidades, com quem precisámos… e tudo funcionou! Mas, desta experiência, deveremos retirar muitos ensinamentos, e não fazê-lo seria um desperdício. Desde logo, aprendemos a conciliar o planeamento essencial para que as actividades sigam o curso das estratégias definidas de acordo com os objectivos traçados, com a constante flexibilidade para introduzir na gestão todos os imponderáveis e imprevistos com que esta inesperada realidade nos surpreendeu – sobretudo nós portugueses, com a nossa já famosa arte do improviso, passámos rapidamente a gerir o “logo à tarde” e o “amanhã” de acordo com as novas necessidades que encontrámos a cada passo, e a responder de imediato, mesmo quando tendo que replanear com base na total incerteza, navegando à vista.
Também ao nível das consequências e considerações que esta imprevisibilidade que se instalou, e ainda persiste a todos os níveis, é urgente reflectir: da economia ao desemprego, da resiliência e capacidade de resistência das empresas, aos apoios que existirão para as ajudar a continuar, na capacidade de resposta do sistema de saúde e nos eventuais efeitos da doença nos que dela padeceram, bem como dos efeitos secundários das vacinas e sua validade em termos de prazo, na evolução, ramificações e novas vagas, bem como das medidas de contenção da mesma, com mais ou menos confinamentos.
É todo um outro mundo, aquele em que actualmente vivemos e no qual temos que reaprender a viver, como se tivéssemos nascido de novo. Para tal, há que rapidamente conseguir identificar os mais afectados e prontamente apoiar quem mais necessita. Sabemos já que se estima a existência de mais 400 mil pessoas em situação de pobreza, face ao início de 2020. Em termos de sectores de actividade, um dos mais afectados é o da hotelaria e restauração, para não mencionar o mercado nocturno e de eventos.
Se aos primeiros se tem exigido uma adaptação constante, face ao abre e fecha, fecha e abre, limitações horárias, rearrumação de espaços, investimentos em equipamentos e descartáveis preventivos, aos segundos tem-se imposto uma extrema resiliência, para se conseguirem aguentar… Neste último caso, não existe um número certo de quantos estabelecimentos já terão encerrado definitivamente com a pandemia face ao estimado universo prévio de cerca de 80 mil, mas a percepção é de que será entre 15% e 30%, apesar de que, e contra todas as expectativas, e não contabilizados nestes valores, outros estabelecimentos abriram.
Esperemos que o Plano de Recuperação e Resiliência, recentemente aprovado no final da Presidência Portuguesa da UE seja justa e criteriosamente aplicado, nesse sentido.
Caberá também à sociedade civil – a cada um de nós – estar atenta e ser também catalisadora de boas práticas na devida utilização destes fundos, que podem constituir uma excelente oportunidade para a realização de reformas estruturais fundamentais e há tanto tempo adiadas.
Para terminar, não posso deixar de referir a recomendação permanente do Papa Francisco da importância de sermos solidários e disponíveis para ajudar quem mais necessita, deixando egoísmos e zonas de conforto e indo ao encontro das periferias, onde se encontram os mais carenciados, pois neste planeta somos todos irmãos e devemos promover a Igualdade e a Liberdade, que só se conseguem atingir com a prática da verdadeira Fraternidade.
Artigo publicado na edição n.º 300 de Julho de 2021