Marketing financeiro – entre a espada e a parede

Miguel Magalhães Duarte
Director de Marketing de uma instituição financeira

Publicado na edição de Novembro de 2013 da revista Marketeer

[Nota – As opiniões expressas são puramente pessoais e não reflectem qualquer posição oficial da instituição em que desempenho funções.]

Se há sector que esta crise abalou de alto a baixo foi o financeiro, com especial incidência na banca. Aconteceu de tudo, a quase todos: má gestão do risco, fraudes, irresponsabilidades, imprudências, erros, omissões, desvalorizações de activos, golpes palacianos, e tudo o mais. Não foi só em Portugal, varreu o sector dos Estados Unidos à Europa, dos pequenos e médios aos grandes e poderosos.

Em resposta a esta tempestade perfeita, qual foi a reacção das autoridades internacionais, que as nacionais tiveram de importar e, muitas vezes, decidiram ampliar? De imediato injectar liquidez no sistema (obrigado Sr. Trichet, obrigado Sr. Draghi), e depois regulação, regulação, mais regulação.

Primeiro foi a regulação prudencial – níveis de capital, buffers, rácios de desalavancagem, etc. – depois a contabilística – regras cada vez mais conceptuais e voláteis de valoração de activos, inspecções de crédito cada vez mais puristas – e, por fim, comportamental – restrições publicitárias, eliminação de comissões, aumento assimétrico de direitos e garantia dos consumidores. Em pouco mais de seis anos a indústria passou de uma sub-regulação (em especial nos EUA) para uma hiper-regulação, muito dela sem sentido, e que vai ser contraproducente, como se viu já no enorme credit crunch ocorrido em Portugal resultante das metas brutais de desalavancagem impostas aos bancos. Infelizmente vai demorar alguns anos até se ver o efeito perverso desta política regulamentar. Não nos esqueçamos que demorou-se anos de sub-regulação até se produzir esta crise, que é no essencial fruto dos excessos que aquela possibilitou. Muito possivelmente daqui a alguns anos veremos os resultados desta overdose de regulação.

E que tem a ver isto com o marketing financeiro? Tudo! O negócio da banca é, no essencial, simples: captar recursos, conceder crédito, ganhar uma margem, e complementar essa actividade com oferta de produtos e serviços financeiros necessários à vida de pessoas e empresas (cartões, seguros, transferências, bolsa, pagamentos, etc.) e por essa via assegurar comissões por serviços prestados. O marketing financeiro tem de assegurar que os clientes têm bons produtos (leia-se, simples, fiáveis e adequados às necessidades e perfil de risco de cada um), com preços justos e com serviços que realmente precisam e lhes são uteis. Mas é aqui que começa o desafio. Como oferecer cada vez mais – melhores taxas, produtos mais completos e flexíveis, canais automáticos mais robustos – com cada vez menos receitas e graus de liberdade? Como conquistar novos clientes e aumentar volume de negócio, quando temos cada vez mais desemprego, empresas a fechar, e estruturas de distribuição que temos de reduzir para poupar custos? É neste paradoxo que reside justamente o verdadeiro valor acrescentado do marketing: encontrar (ou pelo menos tentar sem desistir…) o novo paradigma de banca, adequado aos tempos de hoje, às suas dificuldades e condicionalismos.

Pessoalmente penso que numa época em que os produtos e a tecnologia são “commodities”, em que a regulamentação condiciona e uniformiza enormemente os produtos e serviços financeiros, a resposta reside na capacidade de oferecer “coisa diferente”. A única, verdadeira e duradouramente diferente, é a qualidade da relação, a capacidade de estar próximo e servir cada cliente, cada empresa, cada particular, cada família com a atenção e o cuidado que cada um precisa; não, a banca não se está a tornar num serviço impessoal e transaccional, bem pelo contrário, volta cada vez mais a ser um negócio de proximidade, de personalização, de “dar a cara”. Convém não esquecer: quanto mais complicada é a situação, normalmente mais simples é a solução – não disse mais fácil, disse, sim, mais simples… Mas, hélas, nada é mais complicado que reinventar a simplicidade… bem avisei no título: estamos mesmo entre a espada e a parede!

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