A sustentável leveza do ser

ricardotomaz2PepsiCo, um dos maiores compradores de batatas a nível mundial, acaba de anunciar a sua intenção de reduzir em 50% nos próxi­mos cinco anos as emissões de carbono e a utilização de água associados às colheitas, e para tal, desenvolveu, para o mercado inglês, um sistema de gestão “web-based” chamado i-crop, uma verdadeira inovação no domínio da sustentabilidade agrícola.

Podíamos juntar à Pepsi, nesta frente da Res­ponsabilidade, a Johnson & Johnson, a Kraft Foods, a Microsoft, todas no topo do reco­nhecimento público no conhecido ranking do Boston College Reputation Institute, empre­sas que integraram melhor do que outras os efeitos da “accountability” na sua reputação.

O conceito de “accountability” é difícil de traduzir e confunde-se com noções como a ética ou a sustentabilidade; na realidade, o que interessa é que ele configura o direi­to que todos temos de esperar das empresas que elas prestem contas sobre a sua actuação – ao nível da cidadania (responsabilidade so­cial), do “corporate governance”, das condi­ções de trabalho.

Este imperativo de transparência apareceu no período pós-Enron, quando a lei Sarbanes­-Oxley – mais conhecida pelo nome de SOX – instituiu novos padrões de inspecção, regu­lação e disciplina das organizações, sobretu­do financeiras.

Para as empresas em geral, e para as mar­cas em particular, esta necessidade reverteu­-se numa oportunidade: a responsabilidade passou a ser uma componente importante da imagem de marca.

Simultaneamente, desenvolveu-se outro fe­nómeno: todos os públicos interessados nas marcas (consumidores, investidores, forne­cedores, parceiros, colaboradores) passaram a “escrutiná-las” nas mais diversas platafor­mas Web (sobretudo nas redes sociais), re­tirando-lhes o monopólio da comunicação, e exigindo delas muito frequentemente um comportamento “hiperético”.

Quando, em 1996, a imprensa mostrou a foto­grafia do jovem paquistanês Tariq, de 12 anos, a colar solas de sapatos para a Nike, a blogos­fera não tinha a força que tem hoje e o Face­book nem existia. Mesmo assim, houve apelos ao boicote comercial e a marca viu-se tempo­rariamente prejudicada na sua reputação.

Hoje em dia, é simples imaginar os efeitos devastadores que a história teria por causa da forma perigosamente viral como encon­traria eco “material” e “moral” na internet. Qualquer mãe de família, coerente consigo própria, não só deixaria de comprar sapatos produzidos nestas condições, como arregi­mentaria um exército de seguidores escanda­lizados no Facebook.

As marcas navegam esta onda de forma equilibrista: aproveitam a “moda” do novo consumidor, ávido de se mostrar bem-com­portado e socialmente correcto, e tentam an­tecipar as expectativas.

Provavelmente, ninguém se lembra hoje da companhia aérea inglesa Silverjet, a primei­ra companhia aérea “neutra em carbono”. Desde o seu lançamento em 2006, todos os bilhetes incluíam obrigatoriamente no preço uma contribuição para anular as emissões de carbono, a qual revertia a favor de projec­tos “amigos do ambiente”. A empresa foi galardoada com o prémio “Environmentally Aware Airline 2007”.

Um ano depois, a contribuição obrigatória incluída no preço passou a facultativa, dei­xando-a ao critério dos clientes mais sensí­veis ao ambiente. Um ano depois, a compa­nhia faliu.

Ironicamente, os “first movers” podem es­barrar no paradigma mais perverso: é que, em regra geral, somos todos responsáveis enquanto ganharmos alguma coisa com isso.

Artigo publicado na edição Novembro 2010 da Revista Marketeer

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