A lição dos “4 sem Trunfo”

Por Carlos Furtado, empresário/director-geral da Porto de Ideias

Acredito que serão poucos os portugueses que não conhecem um jogo de cartas e que pelo menos uma vez na vida não se sentaram numa mesa de jogo para uma boa partida entre amigos. Esta é uma das mesas onde se revela a educação e o carácter de uma pessoa. A outra é a mesa das refeições. E tanto numa como noutra encontro tanta falta de educação onde não deveria que fico preocupado. Mas não é a etiqueta que aqui me traz mas sim a lição dos “4 sem Trunfo”.

Desde pequeno que adoro jogar cartas. Em criança, as paciências ensinadas pelas avós evoluíram para o crapô e canasta que partilhei em muitas noites familiares. Momentos calmos e relaxantes. Mas fui crescendo e, sem esquecer o que aprendi, entrei na fase da sueca e da “lerpinha”. Já metia dinheiro, fumo e cerveja. E, claro, eram jogatinas noite dentro. Depois veio o “King”, o “21” e o póquer. A parada subiu. Financeiramente nas apostas e a cerveja foi trocada por whiskys, o que também era mais dispendioso. O “Português Suave” sem filtro mantinha-se. E chegou o jogo mágico: o bridge. Onde tudo se transforma em ponto maior. A concentração é fundamental. Saber as convenções é essencial. E aprender novas é obrigatório, pois só assim fica garantida a evolução. A confiança de e no parceiro é indispensável para encontrar o caminho da excelência. Conhecer o valor dos adversários é super importante. No bridge a competição é elevada ao seu expoente máximo. E a prática é fundamental, essencial, obrigatória, indispensável e importante.

Se deixarmos o prazer das cartas e passarmos para a desafiante vida empresarial encontramos todos os paralelismos em todas estas caraterísticas que enunciei serem necessárias a um bom jogador de bridge.

Se não estivermos focados no nosso negócio é bem possível que o projecto fique pelo papel ou tropece às primeiras dificuldades. A concentração é importante não só para o empresário mas para os seus colaboradores. Saber as regras e as leis do nosso sector de actividade parece natural mas é muitas vezes descurado e é bem importante para não cometermos erros infantis. Manter esse nível de aprendizagem constante ao longo da vida vai permitir a evolução da nossa empresa, criar riqueza e vencer os desafios com que nos deparamos. Conhecer quem nos acompanha nessa “viagem”, comungando das mesmas ideias e, acima de tudo, com um elevado grau de confiança permite enfrentar as adversidades com maior tranquilidade. E, claro, não menosprezar os concorrentes, antecipar as suas jogadas, acompanhar os seus movimentos. Quem pensa que joga sozinho o jogo é porque ainda está na fase das paciências.

Não cresceu.

Mas, afinal, qual a lição dos “4 sem Trunfo”? Remonta aos meus primeiros passos no bridge.

Jogava eu em mais uma animada noite de terça-feira no Ateneu Comercial do Porto, com João Queirós o meu paciente parceiro. “Mãos ricas” levaram a um animado leilão e o meu parceiro com toda a sua sapiência anuncia “4 sem Trunfo”. O adversário passa. Eu bloqueio. Pensei. E pensei. O que significava? Que convenção era? E passei. Entre o ar incrédulo do meu parceiro e o ar admirado dos meus adversários percebi que tinha feito asneira. Lá me explicaram e pude corrigir o erro. E aprendi para sempre.

Qual a lição do “4 sem Trunfo”? Que só praticando, só arriscando, e sem medo de falhar, conseguimos aprender e evoluir. Em Portugal, o erro não é compreendido como fazendo parte do processo de crescimento, de aprendizagem. É sempre um estigma negativo. Mas só erra quem tenta. Só erra quem faz. E quantas vezes os erros são os nossos melhores “professores”? Na vida empresarial como no bridge.

E, depois da minha vez, correctamente dada pois já era sabedor da resposta a dar, o meu parceiro respondeu com “5 sem Trunfo”. E será que aprendi com novo erro ou já tinha aprendido com o erro anterior? E na nossa vida empresarial repetimos o erro?

O certo é que o bridge tem tudo o que precisamos para singrar na vida empresarial. E, chegada a reforma, um excelente modo de passar o tempo. Já não nos deixam é fumar.

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