A comunicação para crianças e jovens deve ser diferente como?
Na actualidade digital, os ecrãs estão presentes em todas as partes e o difícil é não conseguir aceder à internet. Com todos os impactos positivos que esta evolução trouxe ao dia-a-dia de milhões e milhões de pessoas, há também as consequências negativas, especialmente quando o tema são as crianças e os jovens.
Patrícia Dias é professora e coordenadora da pós-graduação Social Brands – Comunicação e Marketing em Ambiente Digital na FCH-Católica, tem a seu cargo o projecto “0-3 DigiKids – Uso de Tecnologias com Ecrã Tátil por Crianças até aos 3 anos” e lidera equipa portuguesa do estudo “Uso de Tecnologias Digitais por Crianças e Jovens durante a pandemia COVID-19”. Em entrevista à Marketeer, a profissional revela que a investigação científica também ainda não tem uma resposta conclusiva sobre a utilização das tecnologias digitais por jovens em idades formativas.
«Tanto podem prejudicar o desenvolvimento de competências sociais, como promovê-lo. Tanto podem promover o sedentarismo e a obesidade infantil, como podem ser usadas para combater estes problemas. Mas há concordância num ponto: as consequências negativas das tecnologias digitais resultam do seu uso excessivo.»
Assim, impera que a consciencialização continue a ser feita, com conta, peso e medida. «A investigação sobre mediação parental das tecnologias digitais também nos diz que proibir o uso é uma má solução. A melhor estratégia é ensinar a usar através da utilização conjunta. Penso que este princípio se aplica aos locais de ensino formal também», sugere Patrícia Dias.
Para a professora, o papel deveria predominar no Pré-Escolar e no Primeiro Ciclo, mas que depois disso é importante que as crianças aprendam a usar ferramentas com as quais terão certamente que lidar no seu futuro profissional e aprendam a navegar em segurança o ambiente digital em que inevitavelmente vivem. «Se uma criança vivesse num barco, certamente acharíamos importante que aprendesse a nadar.»
E o papel das marcas e plataformas?
Fazendo a tecnologia parte intrínseca da vida quotidiana, que papel têm as marcas e plataformas quando comunicam directamente para crianças e jovens? Deveriam ter uma estratégia de comunicação pensada especificamente para este público, reitera a professora. Dando como exemplo o YouTube Kids, Patrícia Dias salienta que «estas empresas têm sempre os seus próprios objectivos estratégicos por detrás», tornando-se difícil confiar num negócio que pretende fazer com que «os utilizadores passem o máximo de tempo possível na sua plataforma para poder recolher os seus dados e monetizar mostrando-lhes publicidade».
Esse trabalho seria «desempenhado com maior integridade e credibilidade por entidades públicas, e por entidades do terceiro sector», tendo por base a ética, já que o conceito de empresa-cidadã diz que esta participa na sociedade e, como tal, tem a responsabilidade de zelar pelo bem comum. «Assim, todas as entidades que usam tecnologias digitais para comunicar com crianças e jovens devem ter em conta alguns princípios éticos, como não estimular o uso excessivo destas tecnologias, não invadir a privacidade destes utilizadores, não os explorar comercialmente.»
Além disso, se as organizações agirem tendo o bem-estar e a segurança dos jovens como um dos seus objectivos, será maior «a probabilidade de passarem no filtro da mediação dos adultos, e também de estas crianças e jovens manterem ligações com essas organizações ao longo da vida».
O que esperar do futuro?
O desconhecido é sempre preocupante, de uma forma ou de outra. Portanto, neste caso, o que mais inquieta a profissional está relacionado com plataformas e soluções de Inteligência Artificial, com a forma como serão adoptadas, com o modo como poderão mudar o ensino, o trabalho. «Preocupa-me que a Inteligência Artificial, com todos os potenciais benefícios que encerra, nos torne menos humanos.»