
«A ideia é promover uma maior colaboração entre os agentes do sector», assume Ricardo Bramão (Iberian Festival Awards)
É já este sábado, dia 15 de Março, que se realiza a 9ª edição dos Iberian Festival Awards. Apresentada por Fernando Alvim (RTP) e Laura Piñero García (da rádio espanhola Cadena Ser), trata-se de uma noite de celebração que visa homenagear os melhores do sector pelos seus feitos durante o ano de 2024.
Depois de Barcelona, Vigo, Granada, Lisboa e Maia em edições anteriores, desta vez é Almancil a cidade que recebe a gala. Com um total de 26 categorias e com 2 prémios de excelência (personalidade e entidade do ano), a gala conta também com uma Welcome party e after party, activações de marca, live acts (Best Youth, Tó Trips, Kanela e DJ Hiantt), open bar e área lounge e networking.
A poucas horas de mais uma edição, a Marketeer falou com Ricardo Bramão, fundador da Associação Portuguesa Festivais de Música (APORFEST) e organizador dos Iberian Festival Awards que tem entre os seus objectivos «promover um sector mais colaborativo e fortalecido a nível colectivo».
Como surgiu a ideia de criar os Iberian Festival Awards e qual foi a inspiração para o fazer?
A primeira edição dos Iberian Festival Awards surgiu em 2016, como uma evolução natural do Talkfest, que vinha acontecendo desde 2012. Percebemos que este evento já era um incentivo para reunir os promotores a nível ibérico, mas queríamos dar um passo além. Em Portugal, conseguíamos juntar os promotores para debater o estado da arte dos festivais, mas o nosso objectivo era expandir essa rede para além-fronteiras. E nada melhor do que estreitar laços com os nossos vizinhos espanhóis para o fazer. Além disso, já existiam prémios dedicados a festivais na Europa e no Reino Unido, mas a realidade ibérica era distinta. Sabíamos que os festivais portugueses tinham poucas oportunidades de competir a nível europeu, não apenas pelo tamanho da nossa população, mas também por outros factores. Então, pensámos: “Por que não criar uma premiação ibérica?” A verdade é que a iniciativa deu resultado. Hoje, vemos mais artistas portugueses a actuar em Espanha, mais artistas espanhóis a actuar em Portugal, e um maior número de compras colectivas de artistas. Além disso, os promotores estão a trabalhar mais em conjunto, fortalecendo a cooperação no sector. Foi para isto que os Iberian Festival Awards nasceram: mais do que distinguir vencedores e vencidos, a ideia é promover uma maior colaboração entre os agentes do sector. Para além dos festivais de música, também quisemos integrar outras áreas da cultura. O foco principal são os festivais, mas reconhecemos a importância de todos os seus stakeholders, desde fotógrafos e videógrafos até marcas que se activam nestes eventos. O objectivo é valorizar toda a cadeia que contribui para o sucesso dos festivais de música. Salvo no ano do covid-19, os Iberian Festival Awards realizaram-se tanto em Portugal como em Espanha. O evento já passou por Granada, Vigo, Barcelona, Maia e Lisboa, e agora chega pela primeira vez ao Algarve, na recém-elevada cidade de Almancil.
Quais são os principais objectivos dos Iberian Festival Awards e como têm evoluído ao longo dos anos?
É exactamente isto, na continuidade da pergunta anterior. A evolução tem sido notável, esta foi a edição com o maior número de nomeados até agora e a segunda com o maior número de entidades candidatas. Estamos a assistir a uma transformação na forma como os festivais de música se estruturam e isso são excelentes indicadores. Ou seja, a indústria não só está a crescer, como também se está a renovar. Há uma nova geração de promotores em Portugal e Espanha, que trazem novas ideias, uma nova energia e formas inovadoras de trabalhar. E esse é um dos nossos principais objectivos: promover um sector mais colaborativo e fortalecido a nível colectivo. Queremos impulsionar essa mudança não apenas através das categorias em competição, mas também com os Excellence Awards, que distinguem a Personalidade e a Entidade do Ano, reconhecendo aqueles que mais contribuem para o desenvolvimento e inovação no sector.
Como vê a evolução da indústria dos festivais de música em Portugal e na Península Ibérica desde a criação dos Iberian Festival Awards?
O que verificamos é que o número de festivais tem crescido, tanto em Portugal como em Espanha, de forma consistente. No entanto, mais do que o crescimento em quantidade, nota-se uma profissionalização cada vez maior da indústria, especialmente no período pós-Covid. Hoje, o foco está muito mais no conforto e na experiência do público, garantindo que os festivais não sejam apenas sobre música, mas sim momentos memoráveis para os espectadores. Se antes bastava ao promotor ter um grande artista no cartaz e vender cerveja para garantir um bom resultado, hoje a realidade é diferente. Há uma maior concorrência entre festivais e muitas outras formas de entretenimento disponíveis, o que obriga a uma constante diferenciação. Assim, os organizadores investem cada vez mais em experiências complementares, como programação paralela, acessibilidade, sustentabilidade e infraestruturas que tornem o evento mais confortável e apelativo. Um festival de sucesso já não se mede apenas pela sua bilheteira, mas pela capacidade de oferecer uma experiência única e inesquecível ao público.
Como é feita a selecção dos nomeados e vencedores em cada categoria?
À excepção dos Excellence Awards, que são nomeados por nós e pelo painel de jurados, todas as outras categorias exigem uma candidatura. Em Espanha, existem pelo menos 800 festivais de música, e em Portugal, mais de 350. Nem nós, nem o painel de jurados, conseguimos assistir a todos, pelo que não podemos arbitrar de forma geral – por isso, a candidatura é essencial. São os próprios festivais que escolhem as categorias às quais se querem candidatar, sejam elas de voto do público ou avaliadas pelo júri e, de certa forma, “vendem” o seu próprio festival dentro da candidatura. Após a validação, as candidaturas são apresentadas ao painel de jurados e ao público, sendo feita uma selecção do top 10 de cada categoria e do top 5 de cada país. Cada categoria tem um vencedor nacional por país, e entre os vencedores nacionais é escolhido o vencedor ibérico, considerando o número de votos do público para as categorias abertas à votação e as notas atribuídas pelo painel de jurados nas categorias avaliadas tecnicamente.
Quais são os maiores desafios na organização de um evento desta magnitude e como os superam?
Todos os anos, trabalhamos com a premissa de surpreender, inovar e fazer mais. Obviamente existem limitações, temos um budget definido e, desde que surgiu a Host City, as cidades que acolhem o evento desempenham um papel fundamental na mobilização da operação. Elas ajudam-nos bastante ao estabelecer parcerias estratégicas em áreas como alojamento, transportes e alimentação, o que agiliza toda a logística. Isto faz uma grande diferença. Imaginemos a complexidade de uma equipa sediada em Lisboa organizar um evento em Granada. É essencial que a cidade anfitriã esteja alinhada e nos consiga apoiar rapidamente. Criar estas sinergias é fundamental para que tudo decorra da melhor forma. Este ano, queremos proporcionar uma experiência ainda mais envolvente. Teremos transmissões em tempo real nas redes sociais, a gravação da Gala, actuações ao vivo e open bar para todos os participantes. O nosso objectivo é que, durante estas horas passadas connosco, cada pessoa sinta que valeu a pena estar ali e que o tempo investido foi bem empregue. E, para nós, esse “bem empregue” não significa apenas ganhar um prémio. O verdadeiro valor do evento está nas amizades criadas, no networking, na partilha de momentos. Este sector tem poucos espaços dedicados ao lazer dos seus profissionais e queremos que este seja um deles.
Quais os momentos mais determinantes desde a criação dos Iberian Festival Awards?
No primeiro ano dos Iberian Festival Awards, um dos principais desafios foi superar barreiras e conquistar a confiança da indústria. Houve sempre alguma desconfiança inicial, especialmente no que diz respeito à validação das candidaturas e ao processo de avaliação. Alguns festivais hesitavam em candidatar-se e tivemos de os convencer a participar, garantindo que todos estavam em pé de igualdade – independentemente da sua dimensão. Para nós, um grande festival tem o mesmo valor que um festival mais pequeno e isso foi um ponto essencial desde o início. Curiosamente, a validação inicial do projecto foi mais forte em Espanha do que em Portugal, o que nos levou a reflectir: por que razão uma iniciativa organizada por uma associação portuguesa teve maior aceitação no mercado espanhol? A resposta está no próprio desenvolvimento do sector. Em Espanha, a indústria dos festivais já estava mais estruturada a nível corporativo, com um maior profissionalismo na gestão e promoção dos eventos. O mercado espanhol já percebia os festivais como um produto comercializável, enquanto que em Portugal esse processo de maturação demorou mais tempo. Tivemos de acompanhar essa evolução e adaptar-nos a esse modelo. Actualmente, sentimos que o sector em Portugal já está mais próximo do espanhol. A qualidade das candidaturas tem vindo a equiparar-se, o que demonstra que a indústria dos festivais em Portugal cresceu e evoluiu nos últimos anos.
Sentem que a existência dos Iberian Festival Awards tem impacto directo na indústria dos festivais na Península Ibérica? Em que áreas e de que maneira?
Claramente, cada vez mais. É muito importante perceber que, para os festivais, receber um prémio ou uma distinção (seja como finalistas, vencedores nacionais ou até vencedores ibéricos) representa um reconhecimento do seu trabalho. Estar no Top 10 já significa que passaram por um processo de selecção rigoroso e isso, por si só, é um motivo de orgulho e validação do esforço investido. Notamos este impacto no aumento das candidaturas e também pelo crescimento do clipping dos festivais, que promovem activamente as suas nomeações e distinções nas redes sociais. Ser nomeado torna-se um factor estratégico de comunicação, um gancho que os festivais utilizam para reforçar a sua marca e credibilidade, independentemente de vencerem ou não. E é exactamente isso que queremos proporcionar: um espaço de encontro e reconhecimento para promotores e todos os stakeholders que fazem parte desta indústria.
Pode partilhar alguma história ou momento memorável de edições anteriores dos Iberian Festival Awards?
Já vivemos várias histórias ao longo dos anos. Lembro-me, por exemplo, de uma situação curiosa que aconteceu no ano passado, em Granada. A gala decorreu num auditório muito grande, que também recebe exposições, feiras e concertos. No entanto, nesse dia, havia outros eventos a decorrer em salas diferentes, ao mesmo tempo que os Iberian Festival Awards. A certa altura, dois ou três promotores entraram por engano noutra sala e foram assistir a um concerto de música clássica, convencidos de que a edição daquele ano estava “diferente”. Só depois de cinco a dez minutos perceberam que estavam no evento errado. Um deles, inclusive, acabou por perder o momento de receber o seu prémio, pois já tinha dado entrada no evento, mas seguiu pelo caminho errado. Os apresentadores sabiam que ele estava no local, mas sem aparecer no momento certo, o prémio teve de ser entregue a outra pessoa. Mais tarde, quando se deu conta da situação, explicou o engano junto dos seus pares na gala, tornando o episódio ainda mais divertido.
Outro momento marcante, ainda que não memorável pelos melhores motivos, foi o ano de 2020. Estava tudo preparado para a gala e para o início do Talkfest quando, no próprio dia, tudo foi encerrado devido à pandemia. De um momento para o outro, não houve viagens, não houve evento presencial, não houve nada. Foi um desafio imenso, e tivemos de encontrar uma solução. Seis meses depois, realizámos a gala online, utilizando novas plataformas para conseguir entregar os prémios e manter a proximidade com todos os participantes, mesmo à distância.
Por fim, outro marco importante para nós foi a primeira gala realizada fora de Portugal, em Barcelona. Foi um momento simbólico, pois marcou a internacionalização dos Iberian Festival Awards. Trabalhar com parceiros locais, levar parceiros portugueses, adaptar-nos a uma nova realidade… Foi um grande desafio, mas também uma experiência muito especial.
Quais são os planos futuros para os Iberian Festival Awards e como esperam continuar a apoiar e celebrar a indústria dos festivais?
A nossa lógica é sempre de continuidade. Já temos cidades interessadas em receber os Iberian Festival Awards em 2026, em Espanha, e em 2027, em Portugal. Ou seja, antes mesmo da edição actual acontecer, já conseguimos garantir o futuro do evento. Isso é resultado de um trabalho sólido que fomos construindo ao longo dos anos. Nas primeiras edições, por exemplo, o evento aconteceu em Lisboa, mas sem uma “Host City” oficial. Hoje, a realidade é diferente, as cidades competem para receber os prémios e esse interesse reflecte o impacto e a importância que o evento tem vindo a ganhar. Além disso, queremos garantir que a experiência dos participantes seja a melhor possível. Quando alguém decide investir o seu tempo para estar presente, queremos que sinta que valeu a pena. Um exemplo curioso aconteceu em 2019, em Vigo, quando a gala coincidiu exactamente com o cancelamento das viagens directas da TAP para a cidade. Isso obrigou-nos a reajustar toda a logística de viagem para os participantes, mostrando o quão importante é antecipar e garantir o máximo de conforto a todos os envolvidos. Os planos para o futuro dos Iberian Festival Awards vão muito além da gala. O objectivo não é apenas reunir a indústria para uma entrega de prémios, mas sim criar uma experiência completa, garantindo shuttles organizados para facilitar deslocações, hotéis oficiais e jantares exclusivos para os participantes, actividades paralelas, como o torneio de futsal entre Portugal e Espanha que realizamos este ano… Momentos de descontração e networking. Acima de tudo, celebrar a indústria dos festivais. O sector está sempre focado em criar eventos para os outros e queremos que este seja o momento em que os próprios profissionais se possam reunir, divertir e fortalecer laços.
Por fim, o evento não termina com a gala. Existe uma continuidade ao longo do ano, com a promoção dos festivais candidatos e a criação de conteúdos que alimentam as redes sociais, mantendo a comunidade activa e envolvida até à edição seguinte.
Texto de Maria João Lima
*A jornalista escreve segundo o Antigo Acordo Ortográfico