Turismo em constante evolução

O Hotel Dom Pedro Palace, em Lisboa, acolheu o primeiro pequeno-almoço debate do ano dedicado ao universo do turismo. Com 2017 a começar urge estabelecer metas e prioridades.

Texto de Sandra M. Pinto

Fotos de Pedro Simões

Hoje o turismo representa muito mais do que aparece nos jornais, explanado nos relatórios ou nas apresentações dos especialistas. Em redor dele existe uma série de actividades que contribuem para o seu regular funcionamento, e, de forma irrefutável, para o seu fortalecimento. Estas actividades são mais do que meros números, são verdadeiros alicerces do sector em Portugal. Esta é uma realidade encarada como verídica pelos principais players, os quais acreditam que apenas um trabalho conjunto e de olhos no futuro pode levar o sector ainda mais longe. Com o objectivo comum de dar a conhecer ainda mais Portugal como um destino de excelência onde, além do sol e praia, existe um conjunto de valências de igual valor. Mas será que o País tem noção da importância crescente do turismo na economia nacional?

Este foi um dos temas em cima da mesa e que serviu de ponto de partida à discussão durante o pequeno-almoço, que teve lugar no Hotel Dom Pedro Palace, em Lisboa, e onde estiveram presentes: Patrícia Castelo, Marketing manager da Viagens Abreu, José Manuel Ferraz, director da Viagens Abreu, António Seiça Gonçalves, administrador do grupo Hotéis Real, Pedro Ribeiro, director de Marketing e Comercial do grupo Dom Pedro Hotels, Roberto Santa Clara, director executivo da Associação de Promoção da Madeira, Luís Araújo, presidente do Turismo de Portugal, Álvaro Covões, director da Everything is New, Isabel Barata, administradora do grupo SATA, Agustin Macedo, Hospitality Sales director da Sonae Turismo, António Loureiro, director-geral da Travelport, Eduardo Cabrita, director-geral da MSC Cruzeiros em Portugal, e Frederico Costa, administrador do grupo Pestana Hotels & Resorts para a área das Pousadas.

Com a finalidade de se alcançar um debate mais aprofundado por parte de todos, foi decidido que nenhuma das intervenções seria atribuída directamente no texto.

2016: que balanço?

Perante um ano em que os números divulgados pelas entidades oficiais foram bastante positivos, os players apresentam um elevado índice de satisfação relativamente a 2016. Os investimentos foram feitos, o retorno começou a chegar e o incremento da oferta teve um feedback positivo na procura. De turistas estrangeiros a visitantes locais, Portugal mexeu durante os 12 meses do ano.

«Os dados estatísticos, aos quais temos acesso, revelam efectivamente números bastante positivos, mas ainda há coisas a melhorar », ouviu-se afirmar, «como, por exemplo, a necessidade de se dar uma maior atenção aos operadores. Outra grande questão está relacionada com a presença do nosso País nos mercados internacionais, e esta está intimamente relacionada com a ocorrência das épocas alta e baixa. É preciso gerar mais vida e animação em algumas regiões do País para conseguirmos dinamizar mais a partição de turistas que nos procuram».

Na verdade, este é um ponto fulcral em que todos em redor da mesa concordam ser necessário uma mudança.

Uma das questões que entronca aqui e que foi trazida para cima da mesa foi a estruturação de produto, «cada vez de maior importância entre regiões e que ainda não está a ser perfeitamente conseguida, sendo essencial que se comece a trabalhar em conjunto e não cada um para o seu lado dentro do seu limite geográfico». Apesar da opinião de o ano ter sido bom, houve quem dissesse que há determinados mercados que precisam de ser melhor trabalhados, «principalmente os mercados espanhol e alemão». Mas foram notadas as especificidades e as exigências diferenciadas que se colocam aos diferentes players, sejam eles empresários privados ou organismos públicos. Veja-se, por exemplo, as épocas altas e baixas, «a diferença entre ambas até pode ter-se esbatido, mas tal não acontece quando se fala dos preços médios praticados por quarto. Aí a diferença existe e é assinalável».

Para encher as unidades na época baixa, ou seja, Outono e Inverno, os preços praticados são sempre mais baixos, são eles que, acima de tudo, definem actualmente as épocas. «Veja-se, por exemplo, o Algarve, em que mesmo com preços muito baixos em Novembro, Janeiro ou Fevereiro não há muita procura, pelo que os índices de ocupação continuam abaixo do expectável.» Um factor que todos esperam venha a influenciar a mudança desta situação é a «capacidade aérea que existe hoje, e que não se verificava há uns anos atrás», ao mesmo tempo que a importância e o valor dos tour operadores devem ser incentivados. «O online não ocupa o espaço todo. O valor dos tours operadores é concreto e isso percebe-se muito quando se discute a situação do Algarve em particular. Será um erro estratégico se voltarmos a pensar como em 2007, que apenas o online é que trará visitantes.»

Foi levantada a questão sobre de que forma podem as pessoas movimentar-se na região. «Sol e praia, mas também gastronomia e golfe, são os pontos de interesse que atraem os turistas à região.» Mas serão os únicos? «Não, toda a região algarvia é dona de uma tremenda riqueza, basta pensarmos, por exemplo, em Silves.

Sob o ponto de vista do património, a oferta na região é vasta, sendo que o problema é como é que os visitantes lá chegam. Os turistas chegam ao aeroporto e permanecem nessa zona, a não ser que se desloquem em excursões organizadas.»

A ausência de transportes que se verifica na região faz lembrar uma ilha, «estamos isolados». E tal verifica-se igualmente no Verão. «É preciso olhar para esta questão com mais atenção e tentar arranjar uma solução válida.» A mobilidade devia estar igualmente na ordem do dia, porque, «sem mobilidade, não há negócio».

Mobilidade versus animação

Uma questão leva a outra e é lançada a dúvida: o que vamos fazer para ter mais e melhores conteúdos para trazer e cativar os visitantes? Apesar de recorrente, a questão não perde pertinência, dada a sua actualidade e importância. «A realidade actual é que quem vai ao Algarve nos meses de Inverno, especificamente a Vilamoura, não tem nada para fazer, não há propostas pois os espaços estão todos fechados»

Se antigamente havia a desculpa de não existirem pontes aéreas para trazer os visitantes, agora esta situação não se coloca. «Haverá falta de vontade dos empresários para dar volta a esta situação?», ficou no ar o desafio.

No que diz respeito aos organismos institucionais, a oferta cultural na região mantém- se activa, tendo sido agora toda agregada sob o programa “365 Algarve”, numa acção que revelou a vasta oferta oferecida na região. «Desde as câmaras municipais até às entidade privadas, a oferta é muita e variada, o que falta é, além da acima referida mobilidade, a divulgação e a comunicação destes diferentes eventos junto do público, local e de turistas.» A concordância chegou quando se percebeu que é necessário existir divulgação ao mesmo tempo que se tem de aumentar a mobilidade, «algo que vai valorizar e muito a experiência da viagem, pois há situações em que o turista para se deslocar tem de gastar uma quantia monetária muito maior do que a usou na compra do seu bilhete de avião».

Afirmação confirmada com a realidade de certas organizações de eventos musicais no Algarve não terem os resultados desejados, pois a venda de bilhetes aos estrangeiros era praticamente nula, pois estes não tinham como se deslocar.

Outro aspecto trazido para a discussão é a falta de um centro de congressos, «no estrangeiro não há uma região, com a relevância para o turismo como aquela que tem o Algarve, que não tenha o seu centro de congressos», todos concordando que esta realidade é essencial para um boa captação de eventos, pois dá cobertura ao importante aspecto de diversificação do foco, pois «o Algarve não é só sol e praia, sendo preciso incentivar o MICE, as city breaks, os eventos corporate e culturais». Ao mesmo tempo é necessário conseguir concentrar, num único documento, todos os eventos que vão acontecer no médio-curto prazo.

Neste momento, o caminho está a ser percorrido com o visitportugal, plataforma onde estão concentrados todos os tipos e géneros de eventos que vão acontecendo um pouco pelo País. Agora é preciso ir alimentando de forma actual e interessante esta plataforma, para que não perca a sua utilidade. No fundo, tudo assenta na questão, ainda sem resposta, de «quais os recursos que devem ser alocados para as épocas baixas e qual o seu retorno».

E o futuro?

As dificuldades e os desafios que se colocam hoje ao turismo nacional são muito diferentes do que eram há 10 anos. «Há uma década estávamos a discutir dentro do turismo, porque o sector apresentava diversas deficiências e muitos problemas.» Hoje, os problemas do turismo não estão concentrados dentro do sector, «muitos estão mesmo fora do sector, mas influenciam o seu funcionamento ». E isto é um grande desafio para todos os players, sobretudo para o Turismo de Portugal.

«A realidade é que hoje é preciso uma maior, se não total, transversalidade», foi defendido, «é preciso alterar e chamar à colaboração sectores como o ambiente ou os transportes». Há um grande trabalho a realizar, mas não é dentro do turismo, é deste com outros sectores importantes para o seu funcionamento. «Para 2017 um dos desafios é a capacidade aérea. Não podemos nunca esquecer que o sucesso do nosso turismo se deve em 50%, ou mais, ao tráfego.»

Outro aspecto reside no facto de Portugal estar a viver anos recorde no que diz respeito ao turismo. «A questão reside na forma como vamos conseguir transformar isto em algo sustentável, ou seja, estes resultados têm acontecido de uma forma cíclica, é preciso agora que se mantenham, mas de que forma “agarramos” esta sustentabilidade?» A pergunta fica no ar, pois de imediato surge mais um desafio ao sector: «De que forma estendemos este sucesso ao resto do País, sendo que na ordem do dia estão os bons resultados de Lisboa, do Porto e do Algarve?»

As cidades pequenas também têm inúmeros motivos de interesse que podem dar origem a um crescimento do fluxo turístico, «é preciso é saber identificá-los e trazê-los ao conhecimento dos potenciais visitantes, mas isto através de uma maior divulgação». Não se pode descurar que, além do turismo de lazer existe outro tipo de turismo, o de negócios, que também é merecedor de atenção.

Outro desafio que se coloca no curto-médio prazo ao secor do turismo é a questão do serviço, «e aqui não se fala sequer das escolas de turismo, pois estas desempenham o seu papel. A questão é mais profunda, pois ainda existe um tremendo complexo em relação a servir no sector hoteleiro, em ter uma carreira que tenha inicio, por exemplo, na cozinha». A procura cresce a dois dígitos, assim como a oferta, mas tal não acontece em termos de crescimento dos recursos humanos alocados ao sector, «e isto vai ser um grave problema, ao qual urge dar atenção para uma solução urgente».

Artigo publicado na edição n.º 247 de Fevereiro de 2017.

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