O insustentável contributo da comunicação precipitada

Por Daniela Agra, directora Porto e directora Estratégia Brasil Atrevia

A definitiva afirmação da inevitabilidade da comunicação digital tem sido apontada, regularmente, como um dos escassos efeitos positivos da actual situação sanitária. A limitação dos canais físicos de promoção e as restrições às deslocações internacionais precipitaram a aposta das organizações nos meios digitais.

“Precipitaram” será, aliás, o verbo indicado para caracterizar a acção digital de algumas organizações neste período. A transição digital, no que concerne à comunicação, obedece, como o próprio nome indica, a um processo evolutivo, estruturado e assente num conjunto de etapas essenciais para o cumprimento dos objectivos estabelecidos.

Hoje, milhares de empresas afirmam ter passado a dispor de presença digital. Mas será que efectivamente a têm? Neste caso, o substantivo não será o mais indicado. Na área digital, estar “presente” é muito mais do que efectivamente existir – com um website, uma página numa rede social ou uma newsletter. A presença digital exige uma estratégia multicanal integrada, homogeneizada com a comunicação offline, e que assegura a confluência dos diferentes canais de comunicação para a prossecução dos objectivos da empresa.

Mais do que a importância da comunicação digital, acredito que a grande lição da actual pandemia, no que diz respeito à esfera do marketing e da comunicação, deverá ser que a planificação, traduzida num Plano Integrado de Marketing e Comunicação, é tão importante para esta área como um orçamento anual para o departamento Financeiro, ou um balancete para a Contabilidade.

É este exercício que permite planear os conteúdos, definir as mensagens-chave, estabelecer os métodos de gestão do ciclo de vida do cliente, desenhar a Brand Voice e medir os resultados.

A criação de páginas de social media tem sido uma das respostas mais comuns das empresas aos constrangimentos actuais. As redes sociais são, obviamente, um canal privilegiado de comunicação, pelo alcance e capacidade de geração de leads. A correcta exploração das mesmas obedece, contudo, a rigorosos parâmetros. No momento da escolha do canal, a empresa interroga-se sobre a rede social onde se encontram os seus clientes? Ou aquela que melhor reflecte o posicionamento offline que adoptou até ao momento? Prepara ou certifica-se que possui conteúdo de qualidade para partilhar com os seus seguidores? Estabelece uma estratégia que permita gerar leads e, posteriormente, conversões? A resposta a estas questões é, invariavelmente, negativa.

Nestes casos, a comparência digital (porque, efectivamente, não poderá ser apelidada de presença) tem um efeito nefasto. Ao invés de contribuir para o aumento dos canais de comunicação e de contacto com clientes e parceiros, o digital vem influir negativamente sobre a reputação da empresa, através de uma percepção de inércia, amadorismo e instabilidade.

O planeamento conjunto dos vários canais de comunicação é a única forma de mapear e assegurar a correcta gestão da customer journey. Esta é uma construção única em cada organização, que assenta nas especificidades do seu negócio, produto e consumidor. É com base na análise da mesma que deverão ser projectados os canais e conteúdos de comunicação apropriados.

Não se pretende, neste artigo, ser exaustivo na descrição desta jornada, mas antes demonstrar a forma como é da competência do marketeer construir um conjunto de ferramentas, interligadas e homogeneizadas, que permitam gerir e acompanhar o consumidor/cliente ao longo de todo o processo de aquisição.

O marketing de conteúdo é a principal estratégia de awareness e attraction da actualidade. É efectivada através de pull marketing, isto é, da criação e partilha de conteúdos textuais, imagéticos ou vídeo que não promovem directamente a marca, mas que atraem o seu público por se focarem nos seus interesses, problemas ou preocupações. As redes sociais e os blogs (que poderá estar integrado no website) são dois dos canais que poderão ser explorados para esta estratégia.

O website é o elemento chave da estratégia digital, cuja importância é transversal às várias etapas da customer journey. Este é o principal canal de aterragem, isto é, o local para onde os potenciais clientes são enviados através das redes sociais, das campanhas de Ads, da newsletter e do blog (nos casos em que o mesmo funciona separadamente), entre outros.

É neste espaço que são gerados os leads, traduzidos em subscrições da newsletter, no preenchimento do formulário de contacto ou na criação de uma conta, por exemplo. Inicia-se, posteriormente, a fase de acompanhamento do potencial cliente, que procura assegurar que o mesmo mantém o interesse despertado na marca e que, potencialmente, o transformará numa compra. A newsletter, as redes sociais, aqui focadas na divulgação de produtos e de serviços, e o sms marketing estão entre os principais meios de lead nurturing.

A jornada do cliente culmina na conversão. Traduz-se no acto de compra, no momento em que o potencial cliente se transforma em efectivo. Poderá acontecer no website, no caso das empresas que possuem um e-commerce próprio, num marketplace, ou offline, numa loja física ou reunião, dependendo da tipologia de actividade.

A comunicação, nas suas diversas esferas, é um fenómeno complexo, multidisciplinar e pensado a longo prazo. Não se coaduna com acções pontuais, desgarradas e inconsistentes. Obedece a princípios de regularidade, organização e integração. A ausência de qualquer um destes vectores da estratégia comunicacional, online e offline, resultará, inevitavelmente, na insustentabilidade da mesma.

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