«Não conseguimos medir, portanto, não deve ser importante»

Por Ivo Gomes, co-founder & CEO of Creative Business MOB

Os marketeers descobriram o que os economistas já sabiam há muito tempo: o tipo com uma tabela de Excel ganha sempre a discussão. “Com números não se discutem”, “os dados não mentem”, entre outras frases feitas.

O Marketing Digital trouxe-nos a incrível capacidade de conseguirmos medir toda a actividade dos consumidores e o desempenho das estratégias que delineamos e implementamos. Quando estamos numa reunião, todos nós adoramos “vomitar” um arco-íris de lógica matemática, escondendo as nossas fragilidades por detrás de jargão digital (CPC’s, CPA’s, CTR’s, bounce rate’s, visitantes, pageviews, engagement, alcance, impressões, entre outras). Temem que, sem dados, sendo apenas uma opinião de uma pessoa, a sua voz não seja ouvida.

Como qualquer bom profissional, também eu adoro dados. Adoro poder rastrear e medir. Saber medir e saber analisar são essenciais para que consiga fazer o meu trabalho, mas, parafraseando qualquer herói da Marvel, “com grandes poderes vêm grandes responsabilidades”.

Essa responsabilidade é perceber essencialmente duas coisas: a primeira é que nem tudo o que realmente conta pode ser contabilizado e que nem tudo o que é contabilizado realmente conta. A segunda é que quando uma métrica se torna um alvo deixa de ser uma boa métrica.

Definir KPI’s (indicadores chave de desempenho) tem um papel fulcral. Estas são as métricas mais importantes de medir, monitorar e executar para haver progressão. Estes fornecem-nos uma forma de verificarmos se a estratégia que delineamos inicialmente está efectivamente a produzir resultados. Focam a atenção dos elementos da equipa na subida ou descida desses indicadores, fornecem uma linguagem comum e clara para comunicar o desempenho, são verificáveis e garantem dados precisos.

Contudo, não nos podemos deixar cegar por dados numa folha de Excel, gráficos circulares ou de barras, pois isto leva-nos a cair na falácia de MCNamara. E, não, não estou a falar do detentor do recorde mundial de surfar a maior onda em Nazaré. Refiro-me, sim, ao secretário de Defesa dos Estados Unidos da América (1961-1968).

Robert Mcnamara

A falácia de McNamara origina-se da Guerra do Vietname, na qual foi definido como KPI a contagem de corpos inimigos, sendo esta considerada uma medida precisa e objectiva de sucesso. A guerra foi reduzida a um modelo matemático: aumentando as mortes de inimigos e minimizando as próprias, a vitória estava garantida. Faz sentido, não é?

Na verdade, tratando a guerra como um modelo matemático foram impostos objectivos aos militares com base nesses mesmos KIP’s, resultando num aumento substancial de mortes “inimigas”.

No entanto, neste aumento estariam também incluídas diversas aldeias bombardeadas, assim como habitantes não armados (que, humildemente, presumo que não seria o objectivo). Estas execuções aumentaram a revolta do povo vietnamita, fazendo com que mais facções rebeldes se alistassem no combate aos Estados Unidos da América.

Reza ainda a história que o Brigadeiro-General da Força Aérea dos Estados Unidos da América, Edward Lansdale, dirigiu-se a McNamara dizendo que o seu método científico para acompanhar o progresso da guerra não considerava um aspecto de extrema relevância: “os sentimentos do povo vietnamita rural comum”. McNamara anotou na sua lista a lápis o que lhe foi transmitido. Porém, depressa apagou, dizendo: «Não conseguimos medir, portanto, não deve ser importante».

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