Marketing de (e para) adultos (Parte II)

Por João Cardoso, Brand strategist no erb’s creative studio

Lembra-se do último artigo sobre sexo? Caso não tenha lido, pode consultar aqui.

No último artigo, falámos da relação entre o desejo sexual (entre duas pessoas) e, a que têm, com o mundo material. Hoje, explico-lhe como é que podemos relacionar o percurso de prazer que experienciamos nas relações com outras pessoas, com os produtos, serviços ou marcas.

Note que, esta, é a 2.ª vez que vou falar disto em público. Portanto, peço-lhe antecipadamente, alguma flexibilidade na matéria.

Recentemente, numa formação sobre Sex Drives em advertising, o formador falou sobre a forma como as marcas utilizavam conteúdos de cariz sexual, ainda que subentendido, para alavancar as suas vendas. O meu gosto pela área comportamental (e alguma idiotice), levaram-me a desenvolver outra relação.

A dada altura, foram apresentados dois gráficos que representam o período de prazer do ser humano (talvez dos animais também… se bem me lembro, a Dama e o Vagabundo, tinham um certo charme), desde a excitação inicial, ao orgasmo e pós-orgasmo.

Bem, observe a figura em baixo (parecia o princípio de uma pergunta do exame nacional de matemática? Também achei).


O gráfico adaptado de William Masters e Virginia Johnson, representa o Ciclo de Resposta Sexual de pessoas do sexo biológico feminino. Não vamos fazer essa distinção, vamos assumir alguma transversalidade generalizada a todos os indivíduos considerados humanos. O que nos importa, para o tema é a visualização do gráfico adaptada à pessoa independentemente do sexo biológico ou identitário.

Comecemos pela linha azul (A):

Linha Azul 🔵

Da perspectiva do sexo, a linha azul representa um percurso regular até ao orgasmo e o tracejado a probabilidade de ter orgasmos múltiplos.

Da perspectiva do consumo, pode representar a ansiedade que vamos criando (a excitação) em torno de determinado produto (ao invés de uma pessoa) e o pico representa a compra. O momento mais alto e intenso de excitação.

O período de resolução dá-se quando já estamos a utilizar o produto ou serviço. Nesse momento, apesar de estarmos satisfeitos, o pico já passou.

Aqui podemos incluir quase todos os produtos ou serviços que consumimos (à excepção, se calhar, de serviços de manutenção obrigatória, como frigoríficos).

Resumindo, atribuímos o pico de excitação ao momento em que fazemos uma compra e as eventuais réplicas aos momentos em que começamos a ver resultados ou descobrir novas features (para usar termos em americano).

É no período de resolução, quando a pessoa já está mais feliz e conformada com o produto ou serviço, que temos de voltar a trabalhar o período de excitação, através de novos serviços ou novos produtos. Podem não ser produtos que visem a substituição do primeiro, podem ser complementares. A ideia é mantermos a pessoa em loop nesta linha, o máximo tempo possível.

No fundo, criamos uma relação de longo prazo. A pessoa conhece a marca – compra determinado produto ou serviço – está satisfeita – a marca inova – a pessoa volta a comprar.

Faz sentido?! Espero que sim.

Passemos à linha amarela (B):

Linha amarela 🟡

Da perspectiva do sexo, sendo que o período de excitação é mais rápido, pode representar momentos de tensão curtos, como, por exemplo, “one night stands” .

Da perspectiva do consumo, esta linha pode ser comparada a compras por impulso. Ficamos excitados muito depressa, atingimos o pico em muito pouco tempo, mas o período de resolução também é mais rápido. O que pode levar a que nos questionemos, mais rapidamente, se fizemos a escolha certa.

Podemos incluir aqui cartões de crédito, chocolates e pastilhas à saída dos supermercados, bebidas alcoólicas ou qualquer outra venda que esteja programada para interagir num momento de tensão rápida.

Normalmente, falamos de compras que exigem uma ponderação menor por terem um risco reduzido (não obstante, podemos falar de compras grandes, se o vigarista for bom).

Por fim, a linha vermelha (C):

Linha vermelha 🔴

Da perspectiva do sexo, representa a inabilidade de atingir o orgasmo. Há um momento muito longo de excitação, mas não chega a haver… o malandro. O que resulta também, num período de resolução mais demorado.

Da perspectiva do consumo, pode estar relacionado com pessoas indecisas, compras complexas ou a incapacidade financeira para adquirir determinado produto.

Imaginemos, o seguinte cenário:

Eu quero muito um Ferrari, mas não tenho dinheiro para o comprar (por falar nisso, estou a aceitar doações). Desde o momento em que descobri a marca, e em que a considerei válida, estou “constantemente” num período de excitação. Mas não cheguei a efetuar uma compra. Por isso, não atingi o pico (orgasmo).

Eventualmente o meu período de resolução, dar-se-á ao longo da vida, se começar a perceber que não vai ser possível alcançá-lo, ou se já não valorizar tanto o bem quando o conseguir obter, uma vez que o período de estímulo foi tão longo que perdeu intensidade.

Aqui podemos incluir produtos ou serviços que exigem uma ponderação maior por parte do comprador.

Não obstante, a qualquer momento este potencial comprador da linha vermelha, pode passar a ser consumidor da linha azul. Mas, normalmente, isto não acontece sem passar pela amarela.

Neste caso, há um cruzamento de emoções. Há o dia em que toma a decisão, e podemos considerar esse comportamento na linha amarela e, depois, à medida que vai racionalizando a decisão, entrará no percurso da linha azul.

Aqui cabe-nos a nós (empresa / marca) manter a pessoa feliz, para que não a percamos para a vermelha de novo. Não é só mau para nós, que perdemos um cliente, é mau para todo o mercado que, eventualmente, ficará com menos um consumidor (ainda que apenas durante um determinado período).

Lembra-se de ouvir dizer que a comunicação é a chave para relações bem-sucedidas?! Não é só entre pessoas. Portanto, no fundo, identificando o tipo de produto ou serviço e o consumidor, conseguimos adaptar a nossa comunicação, e as etapas do processo de venda, e perceber quem é que tem de passar por todas e quem é que pode saltar etapas para a tomada de decisão.

Se tenciona recorrer a sex drives para alavancar a sua marca ou as suas vendas, é importante que compreenda isto. Caso contrário, pode acabar com piadas fracas ou pouco sensuais. Uma abordagem vulgar (para não usar outra palavra), pode facilmente transportar a sua marca para abismo da repulsa. Visibilidade consegue, novos clientes… já tenho algumas dúvidas.

E é isto, ou estou completamente enganado.

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