Guia para uma Black Friday às claras e mais sustentável

Por Sara Rocha – Associada de PI/TMC da CMS Portugal

A Black Friday é, para o sector do retalho, uma das mais importantes campanhas promocionais do ano. Contudo, ao atrair milhões de consumidores para ofertas aparentemente irrecusáveis, também levanta questões sobre a transparência, o cumprimento das normas aplicáveis e a sustentabilidade.

Em Portugal, a ASAE tem reforçado a fiscalização durante este período promocional, estando especialmente atenta a potenciais práticas enganosas, o que resultou em dezenas de processos de contraordenação nos últimos anos. Estes processos incluem infracções relacionadas com o incumprimento das regras relativas à forma de exibição dos preços e condições das promoções, um claro reflexo da crescente atenção das autoridades e da necessidade de conformidade com a legislação aplicável.

Complexo? Sem dúvida. É por isso essencial que as empresas actuem de forma transparente, cumprindo as normas de publicidade e de direitos do consumidor, em particular no que diz respeito às regras de afixação de preços. As empresas devem procurar utilizar a Black Friday não apenas para fazer flash sales e escoar stock, mas também para oferecer uma experiência positiva ao consumidor e assim ganhando a sua fidelização.

Para tal, deixamos algumas dicas:

1.      Transparência na afixação dos preços

A transparência nos preços é uma exigência central da legislação, que requer que o preço mais baixo praticado nos 30 dias anteriores seja exibido ao lado do preço promocional. Esta regra visa eliminar a prática de “descontos fictícios” e proporcionar ao consumidor uma visão real do desconto oferecido. O cumprimento desta norma evita sanções e reforça a confiança dos clientes, que têm ferramentas para avaliar a autenticidade das promoções.

Para as empresas, é recomendável implementar uma política de documentação de preços e procurar aconselhamento jurídico a este respeito, de forma a assegurar a conformidade na forma de afixação dos preços. Desta forma, os consumidores são informados de forma clara e a marca é protegida contra processos de contraordenação, que no fim se revelam dispendiosos.

2.      Clareza nas condições aplicáveis às promoções

Além da exibição correcta dos preços, é crucial garantir que todas as condições das promoções sejam comunicadas, de forma clara, ao consumidor. Condições como limitações de stock, ofertas restritas a canais específicos (online ou físico) ou a duração das promoções. A omissão deste tipo de informações pode ser interpretada como publicidade enganosa, podendo levar a coimas significativas e prejudicar a confiança do cliente na marca.

3.      Respeito pelos direitos pós-venda

As regras de troca e devolução mantêm-se inalteradas durante a Black Friday. Apesar de muitos consumidores acreditarem que as condições são mais restritas em campanhas promocionais, é obrigação das empresas assegurar que os clientes compreendem que seus direitos permanecem intactos, inclusive em ofertas de curta duração.

Esta abordagem transparente pode minimizar reclamações e construir uma imagem de maior confiança.

4.      Evitar manipulação nas estratégias publicitárias

Tácticas que geram urgência, como contagens regressivas ou alertas de “últimas unidades”, podem ser eficazes, mas devem ser utilizadas com integridade e ponderação. A informação sobre disponibilidade limitada ou a redução de preço deve corresponder à realidade; práticas enganosas podem rapidamente desgastar a imagem da marca e afastar consumidores. Expressões como “imperdível” devem ser reservadas para descontos autênticos e a transparência deve ser prioridade.

5.      Promover práticas sustentáveis: rumo à “Green Friday”

A Black Friday é tradicionalmente associada a um aumento exponencial nas vendas e no consumo. No entanto, à medida que a consciência ambiental cresce, tanto consumidores como empresas questionam, cada vez mais, os impactos ambientais desta prática. A pressão para comprar mais e a cultura do “descartável” geram um consumo excessivo de produtos que, muitas vezes, têm uma vida útil bastante curta ou que são comprados sem que exista uma real necessidade.

Muitas empresas estão a adoptar práticas mais sustentáveis, promovendo a “Green Friday”, que incentiva compras conscientes ou a reutilização de produtos. Outra tendência crescente é a de empresas se afirmarem como “anti black Friday”, alertando para o consumo consciente e afirmando-se como sendo contrárias aos saldos ou à baixa de preços neste período em concreto, que incentiva um consumo excessivo e sem que exista uma efectiva necessidade.

Por outro lado, também assistimos a empresas que criam promoções voltadas para produtos sustentáveis ou feitos de materiais recicláveis. Importa ter em atenção para, neste caso em concreto, não se cair numa prática de greenwashing (ou seja, uma forma de desinformação frequentemente utilizada para aliciar um aspirante a consumidor ecológico e transmitir-lhe uma falsa impressão de que determinado produto ou prática é mais sustentável ou respeitador do ambiente do que os das marcas concorrentes, sem que tal corresponda à verdade), podendo esta ocorrer quando uma empresa tenta realçar os aspectos sustentáveis de um produto para ofuscar o envolvimento da empresa em práticas prejudiciais para o ambiente, como acontece com a Black Friday, por si só.

Empresas que adoptam políticas de sustentabilidade na Black Friday demonstram um compromisso com o futuro e com os interesses dos consumidores, que estão cada vez mais atentos à pegada ecológica das suas compras.

Em conclusão, a Black Friday pode ser uma excelente oportunidade para consumidores que procuram descontos autênticos e para empresas que pretendem fidelizar clientes. No entanto, para que a campanha seja vantajosa para ambas as partes, as empresas devem operar com total transparência, respeitando as normas de afixação de preços, condições das promoções e actuando de forma sustentável.

Consumidores que compram de forma consciente valorizam empresas que demonstram responsabilidade social e ambiental, e, para as empresas, a conformidade com a legislação e com práticas sustentáveis não só evita sanções, mas também fortalece a reputação da marca. Num mercado cada vez mais competitivo e atento, marcas que promovem clareza, honestidade e sustentabilidade destacam-se, conquistando uma base de clientes leais e evitando o “desgoverno” que práticas enganosas e insustentáveis podem acarretar.

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