“Freelancer do Dia CCP by Marketeer”: João Paulo Pereira
É difícil sobressair por entre dezenas de curriculos. A partir de certa altura, os nomes confundem-se e aquele que poderia ser o par perfeito para um projecto na calha acaba por fugir. Partindo do directório lançado pelo Clube Criativos Portugal (CCP), a Marketeer propõe conhecer melhor alguns dos talentos freelancers nas áreas da criatividade e comunicação.
João Paulo Pereira aka intothebackstudio (brand designer) é o mais recente protagonista da rubrica “Freelancer do Dia CCP by Marketeer”, que apresentará, duas vezes por semana, exemplos de quem decidiu aventurar-se por conta própria.
Qual foi a melhor coisa que já fizeste?
O adjectivo “melhor”, para mim, é muito subjetivo. A melhor ideia é a que arrecadou mais prémios? Para mim não e nem sempre a mais premiada acaba por ser a que nos deu mais pica de trabalhar, ou nos deixou mais satisfeitos ver e fazer acontecer.
Nesse sentido, diria que foi o projecto “Fox — The Walking Dead Blood Store” na Torke CC. Sinto que foi a ideia certa na altura certa. Para a equipa, para a agência e para o cliente (apesar de não ter sido no país certo), foi uma ideia muito bem acolhida e uma daquelas em que sentes que a criatividade esteve ao serviço da sociedade e com resultados imediatos.
Pessoalmente, foi um dos projectos que mais prazer me deu fazer, foi muito hands on para mim e para toda a equipa, fizemos tudo de uma ponta à outra, ideia, campanha, design de todo o merchandising, incluindo montar e gerir uma loja aberta ao público, com peças e produtos desenvolvidos (e aprovados internacionalmente) por nós de raiz. Depois de todo esse trabalho, ver a afluência das pessoas à loja, fãs e não fãs da série, e ver os números de doação de sangue a aumentar exponencialmente foi um momento único no meu percurso até hoje.
Qual é o projecto que queres fazer a seguir?
As minhas “paixões platónicas” profissionais são Cultura/Teatro, Música, Roupa e Comida, por isso diria que é trabalhar a marca e programação de um teatro, colaborar com uma banda ou músico, trabalhar a marca e comunicação de uma marca de roupa ou trabalhar de perto com um chef de cozinha. Esse tipo de projectos são daqueles que me agarram de imediato. Se estivermos a falar de marcas que gostaria de trabalhar a seguir, diria Carhartt, Patagonia, Hurley, Nixon ou Under Armour. São as que me vêm logo à cabeça.
Porque é que te devem contratar?
Estou mais à vontade em falar de projectos do que da minha pessoa, por isso deixo que sejam outros a falar de mim, neste caso uma das pessoas que mais respeito a nível profissional e com quem aprendi mais nos últimos anos.
Rodrigo Rodrigues: partner/Strategic Ideator da Torke CC
«Dos mais de 200 designers com quem já trabalhei, o João é de longe um dos melhores. A sua contínua capacidade de se superar, criativamente e estrategicamente, através de muito trabalho, compromisso e inspiração, nunca deixa de me surpreender. Tudo o que ele sente que pode faltar em talento é amplamente superado pela determinação e vontade de aprender, de se esforçar para chegar mais longe e de se superar. Foi sempre fácil e um grande prazer trabalhar com ele, independentemente do seu papel. Seja como designer de marca (a sua essência), como capitão de equipa, pensador estratégico ou gestor de projecto. Qualquer que seja o desafio, surge sempre resolvido e entregue de uma maneira que excede quaisquer expectativas. A capacidade do João – especialmente em projectos de branding – pensar da estratégia à execução, abrangendo design e naming (para exemplificar), revela uma qualidade única nesta área.
A nível pessoal, o João tornou-se meu amigo, apesar das nossas personalidades serem diferentes. É uma pessoa reservada, introspectiva e o seu modo de ser comedido significa que é uma óptima pessoa para ter em qualquer equipa em que os egos possam ser um desafio. Dito isto, ele é um tipo fantástico, excelente profissional e um one-man-show no melhor sentido da expressão, quando se trata de responder a qualquer projecto que lhe seja atribuído.»
O que achas sobre a situação actual que vivemos?
Neste momento, estou ainda em vias de “desconfinar”, a nível profissional ainda sem data à vista para voltar “ao escritório” mas a equipa da House of Hopes and Dreams, onde trabalho actualmente, está a preparar tudo o que é necessário para voltarmos em segurança. A nível pessoal, temos os nossos dois filhos em telescola e nós em teletrabalho, a trabalhar com picos de ritmo igual ou superior ao que tínhamos antes da quarentena.
Considerando o nosso contexto, estamos ainda um pouco apreensivos. Na verdade, creio que o mais difícil tem sido convivermos todos juntos 24 horas por dia e conciliar as diferentes necessidades e compromissos individuais. Considerando que tanto eu como a minha “dupla” já trabalhávamos como freelancers, a partir de casa, ou mesmo em remoto com o “escritório” às costas, nessa matéria não houve uma mudança radical.
O maior desafio para nós é mesmo a gestão de horários, ritmo, disponibilidade e exigência do nosso trabalho ao mesmo tempo que temos de acompanhar e estar presentes nas actividades dos nossos filhos. Não há preparação possível para esta nova situação e temos todos de nos ajustar a este novo cenário – eles eventualmente até que se adaptaram, ao inicio pelo menos, melhor do que nós. Mas, ao fim de 10 semanas, já demonstravam alguns sintomas de saturação e cansaço, pelo formato de aulas, pela ausência de convívio com os amigos e familiares ou pela ausência de liberdade para passear e viajar à vontade.
A nível profissional, tentamos olhar para tudo isto como uma oportunidade, obviamente há uma questão imediata de saúde muito séria e não é de descurar, mas seja com ou sem vírus, com ou sem confinamento, a vida pessoal e profissional tem de continuar e aí olhar para isto como oportunidade e dedicar energia a encontrar soluções e novos modelos de trabalho e colaboração é uma postura que faz mais sentido para nós. Nem sempre é fácil, é um processo.
Até porque pode ser uma oportunidade, talvez única para esta geração, para reavaliar vários aspectos tanto das
nossas vidas pessoais como profissionais, a maneira como encaramos esses dois aspectos da nossa vida. Há coisas muito positivas que se pode retirar deste “pequeno ensaio” colectivo, a maneira como o encaramos pode bem ditar como vamos estar daqui a uns anos, e nesse aspecto creio que é sempre melhor olhar para em frente e perceber como retirar o melhor partido da situação. Ainda que possam estar a ser forçados a mudar, e isso não tem que ser necessariamente negativo.
Desde quando és freelancer e porquê essa decisão?
Apesar de ser algo que queria experimentar há algum tempo, sou freelancer apenas há um ano. Foi algo que tive de me forçar a fazer, como desafio pessoal e profissional. Já conto cerca de 15 anos a trabalhar em agências, sempre a full time, sempre a um ritmo exigente. Às tantas, entendi que era a altura certa para ver se me adaptava bem.
Apesar da minha área de conforto ser mais a criatividade e o aspecto visual da comunicação/design, sempre gostei de tocar e aprender o mínimo sobre todos aspectos do “negócio da criatividade/design” e, de certa forma, ser freelancer permite-me ter uma visão diferente sobre a nossa actividade.
Como freelancer consigo trabalhar com outro tipo de equipas, clientes ou até agências de uma forma mais livre. Livre para aceitar apenas determinado tipo de projectos, livre para optar pelo cliente A ou B ou mesmo agência X ou Y, ou até conseguir desenvolver projectos em áreas que até à data, estando em agência, provavelmente nunca teria oportunidade de trabalhar.
Passado um ano, estou neste momento num modelo híbrido em que colaboro regularmente (a full time) como elemento de uma equipa criativa que responde aos desafios dos clientes/projectos, ao mesmo tempo que desenvolvo (como freelance) alguns projectos para clientes directos.
Quais as vantagens e desvantagens de ser freelancer?
Certamente várias, confesso que ainda não parei para listar os prós e contras e decerto que haverá freelancers com argumentos bem mais concretos e experiências bem diferentes da minha.
Na minha parca experiência como freelancer, diria que a principal vantagem (quero acreditar a que mais nos atrai) é mesmo a liberdade. Com isto não estou a dizer que de repente um freelancer tem a “faca e o queijo na mão” e que controla o “jogo”, duvido até que isto aconteça a uma esmagadora maioria, mas a primeira e mais recorrente sensação que tive é de liberdade. Ganhamos alguma liberdade nas decisões que se tomam relativamente a tipo de projectos/clientes, horários e condições de trabalho. Mas é bom frisar: acontece quando existe uma determinada conjugação de factores. Não esquecendo que no fim das contas todos temos despesas para pagar e isso, num primeiro nível, é o mais importante.
Essa conjugação de factores, para mim, é o equilíbrio entre ter projectos interessantes e a consistência com que essas oportunidade nos chegam, conseguindo ultrapassar essa “barreira”. Então aí, sim, creio que se entra no melhor lado de ser freelancer. A principal desvantagem para mim, resumindo a uma palavra: burocracia. Depois de um ano e pouco a recibos verdes, ainda estou a tentar descortinar o balanço real. Não é que seja um bicho de sete cabeças, mas a discrepância e multiplicidade de informação oficial disponível, mesmo para contabilistas, não é algo linear e existem muitas nuances e meandros de como trabalhar eficazmente com recibos verdes.
Diria que é preciso muita pesquisa sobre o tema, falar com vários contabilistas e perceber o melhor enquadramento para cada um, porque cada caso é um caso. Isso ou ter aquele contacto privilegiado com um óptimo contabilista que perceba de recibos verdes porque vai poupar alguns dissabores e dinheiro mesmo. Há quem lide bem com pressão da burocracia e com o lado mais de gestão e contabilidade da actividade e decerto também há quem não tenha esse perfil e creio que aí a coisa pode mesmo descambar um pouco e acabar por sentir que “paga para trabalhar”. Mesmo com projectos sempre a entrar depois, quando se vai efectivamente fazer as contas é possível que se venha a ter uma tomada de consciência mais concreta do que é ser freelancer.
Nesse sentido, fazer bem as contas, perceber o melhor enquadramento, avaliar bem as oportunidades e/ou o cliente que temos à nossa frente, montar bons orçamentos e ser bem assertivo, tudo isto, por mais que seja difícil quando se está a começar, ao fim de algum tempo vai surtir bons resultados para todas as partes envolvidas.
Para conhecer melhor João Paulo Pereira: