Dia das Compras na Net – Infelizmente, só para alguns!

Por Pedro Lourenço, CEO do Portal da Queixa, fundador da Consumers Trust e embaixador da Comissão Europeia para os Direitos do Consumidor

Vivendo num contexto de pandemia, com todas as restrições impostas, nomeadamente no período de confinamento, mesmo o mais conservador dos consumidores foi tentado a fazer a sua primeira compra online.

À primeira vista, isto parece ser um argumento muito optimista e uma excelente oportunidade de balancear as perdas do comércio tradicional e potenciar a manutenção da economia, assente num pressuposto de que o online poderá ser a salvação. Era, de facto, uma realidade bastante mais animadora e de algum modo natural, tendo em conta a evolução da tecnologia nos últimos anos, que tanto tem mudado o comportamento e hábitos de consumo dos portugueses.

Contudo, é justamente dos portugueses que falamos. Sim, este povo que ainda está no fundo da tabela do Eurostat, quando consultamos o último estudo que indica que apenas 39% da população fez uma compra online nos últimos 12 meses.

Olhando para estes números, como poderemos excluir os outros 61% da população, não garantindo que têm os mesmos direitos e oportunidades de poderem aceder às mesmas campanhas e promoções online que os mais capacitados terão em dias temáticos como este? Como podemos entender que devemos canalizar os nossos esforços para potenciar uma economia digital se o cliente-alvo não dispõe de conhecimento suficiente para comprar online com segurança? Estará a montanha a parir um rato, que no final só resultará em más experiências e desconfiança, reduzindo as hipóteses de um crescimento sustentável do setor?

Por outro lado, os mais optimistas dirão que, se não forem criadas as oportunidades, não conseguiremos fazer crescer o comércio electrónico, como estaremos igualmente, cada vez mais, distantes dos lugares cimeiros da Europa. É verdade! Concordo que por via do exemplo a aprendizagem é mais eficaz e trará com certeza a confiança necessária para motivar novos consumidores a fazerem a transição digital. Mas é justamente neste ponto que, mais uma vez, o mercado não está a aproveitar a condição única que detém. E que vantagem é essa, afinal? A capacidade de educar o consumidor a fazer as melhores escolhas, a comprar com confiança, fidelizando-o nos canais nacionais, sem necessidade de correr atrás das ofertas imperdíveis das lojas online no Oriente ou das cadeias mundiais como a Amazon.

Para isso, é necessário que exista um compromisso conjunto entre todos os intervenientes no processo de compra. Como podem as marcas entender que não devem contribuir com uma abordagem inclusiva, ajudando os consumidores a obterem o conhecimento necessário para efectuarem as suas compras em segurança? Como pode o mercado digital dar o mau exemplo ao não garantir que a experiência online tem mais vantagens do que a realizada nos locais físicos?

Para isso, contribuíram as mais de 45 reclamações diárias que o Portal da Queixa regista, totalizando 12.299 só em 2020, relativas às compras online. É a dura realidade!

É necessário potenciar uma cultura de aprendizagem com os erros cometidos, ouvindo as dificuldades dos consumidores e não ignorar os sinais de que a experiência não correu bem, na esperança de que a do próximo cliente seja melhor.

É urgente ajudar os menos instruídos a conhecer os perigos online e a optarem por compras em segurança, com os devidos requisitos legais, e que assegurem o contacto de proximidade quando um problema aparece. É dessa confiança que nasce a reputação, a ética e a eficiência.

Enquanto plataforma privada de consumidores e marcas, entendemos que devemos ter uma contribuição activa na sociedade, por isso, lançaremos para a Black Friday um movimento social de literacia digital.

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