Competições à medida dos desejos dos consumidores

Por Daniel Sá, Diretor executivo do IPAM, autor do livro Marketing Desportivo – Mais do que um jogo (PACTOR)

Campeonatos nacionais que decorrem ao longo de dez meses ou transmissões de jogos com duas horas e poucos momentos de emoção terão o seu futuro ameaçado perante as novas gerações. Ao longo dos últimos anos assistimos já à introdução de várias inovações no desporto mundial. O voleibol alterou o sistema de pontuação dos jogos, a NBA redefiniu calendários, o ténis alterou várias regras, bem como o golfe, a Fórmula 1 e a Moto GP introduziram corridas intermédias para procurar gerar mais adrenalina, competitividade e emoção.

Tudo tem de ser mais espetacular e dinâmico para esta geração, seja ao vivo seja via transmissão televisiva ou streaming. É previsível que seja necessário mudar regras, dinâmicas, calendários, durações ou formatos de competição de vários desportos. Neste cenário estima-se até que algumas modalidades possam deixar de ter adeptos ao vivo e funcionar apenas por transmissão, eliminando esse tipo de adeptos, mas ao mesmo tempo libertando-se de toda a operação complexa e cara da promoção do desporto ao vivo.

Muitas das modalidades ditas tradicionais têm apresentado, nos últimos anos, os primeiros sinais de declínio nas taxas de participação e envolvimento, audiências e número de adeptos. Trata-se de uma questão estrutural, dado que surge das alterações de comportamento dos adeptos, o que tem levado muitos dirigentes desportivos a levar as mãos à cabeça. Para contrariar este fenómeno, muitas federações desportivas estão a testar diversos novos formatos, em busca de satisfazer os novos desejos dos adeptos.

Sem público, desaparecem os patrocinadores e, em boa verdade, desaparece também a base real para a existência de um desporto. Os adeptos, sejam eles mais ativos ou passivos, são os principais impulsionadores do sucesso de uma modalidade para além de a suportarem financeiramente. Nessa perspetiva, é importante recordar que o adepto atual está a mudar e de forma muito significativa.

Muitos desportos tradicionais estão sob uma enorme pressão devido a esta mudança de gerações pois os formatos atuais já não são atrativos para eles. Os babyboomers e as gerações seguintes já não constituem a maioria da população, mas muitas federações desportivas são ainda lideradas por representantes das gerações mais antigas. Espera-se, por isso, uma renovação muito rápida dos corpos dirigentes das principais federações mundiais e nacionais que ajudarão a transformar a face do desporto.

Não há, assim, como contornar ou negligenciar o impacto que as Gerações Z e Alpha terão no futuro dos desportos e das competições. Os adeptos destas gerações revelam uma capacidade de atenção muito menor, assistem a menos jogos e estão formatados para fazer várias coisas ao mesmo tempo até quando se estão a entreter e divertir.

Se um espetáculo desportivo não for suficientemente interessante, eles mudarão de imediato a sua atenção para algo mais atrativo, deixando os níveis de lealdade pelas ruas da amargura. Este comportamento é válido quer para assistir a espetáculos desportivos ao vivo ou em casa. Além disso, sabemos também que estas gerações adoram tecnologia e já nasceram com esta integrada nas suas vidas.

Esperam-se, assim, profundas alterações e introdução de várias novidades nas competições, cada vez mais pensadas para satisfazer os novos desejos dos novos consumidores. Imagine o campeonato ibérico de futebol. Imagine dois campeões de uma determinada modalidade numa época só. Imagine o torneio de Verão e de Inverno. Imagine o Campeonato do Natal. Imagine jogos a partir da meia-noite para gerações mais novas. Imagine que o formato de playoff é substituído por um novo modelo. As possibilidades são infinitas e a criatividade dos gestores vai disponibilizar ao mercado soluções nunca antes vistas.

Por outro lado, a tecnologia vai empoderar o adepto que terá alguma margem para customizar o desporto à medida dos seus desejos. Podemos facilmente imaginar no futuro as gerações mais novas a exigir e a consumir competições de robots contra pessoas, atletas híbridos, ou seja, pessoas com peças de robots ou até assistir a uma espécie de jogos olímpicos dos robots.

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