Rui Roboredo Madeira: Acreditar, investir e criar no Douro e na Beira Interior

A história de Rui Roboredo Madeira confunde- se com os seus vinhos. Considerado pela revista “Wine Spectator” como “um dos enólogos que está a marcar o ritmo para a crescente qualidade dos vinhos portugueses”, é o nome que está na origem do clássico duriense Castello d’Alba, os mais arrojados Beyra ou os icónicos Quinta da Pedra Escrita.

Tudo começou em 1999. «Depois de ter contactado com muitas culturas de viver e fazer os vinhos, em vários pontos do globo, regressei ao Douro, convicto do potencial para fazermos os melhores vinhos do mundo », refere Rui Madeira.

Um enólogo: duas regiões

Hoje divide a sua acção entre o Douro Superior e a Beira Interior, duas regiões na bacia hidrográfica do Douro, que, embora contíguas, têm características muito próprias e distintas.

«Começando pelos solos, enquanto o Douro é dominado pelo xisto, na Beira temos a transição para o granito da montanha. É nesta zona de transição que encontramos muitos filões de quartzo», sublinha o enólogo. «Depois temos a orografia, a viticultura no Douro faz-se nas encostas, enquanto na Beira é de planalto. Passando para o clima, o Douro é mais quente e a Beira é mais fresca por influência da altitude», conclui, dizendo que, «em cada uma destas regiões, procuramos que exprimam o seu carácter intrínseco e distintivo».

Em cada um dos projectos em que se envolve, Rui Roboredo Madeira procura acrescentar algo ao mundo do vinho. Foi um dos pioneiros, no final dos anos 90, na aposta nos vinhos DOC Douro exclusivamente de vinhas do Douro Superior, ou a introdução dos Vinhos de Altitude na Beira Interior, cerca de 10 anos depois. Tudo conceitos inovadores que marcaram a sua época e o ritmo a que cada uma dessas zonas do País passou a ser vista no mapa dos vinhos.

Um dos melhores exemplos deste trajecto são os vinhos da “sua” Quinta da Pedra Escrita. Propriedade da família que Rui Madeira tem vindo a reabilitar desde 2007, em que procurou a frescura, a mineralidade e a pureza aromática das zonas altas do Douro, a 550 m de altitude, em solos de granito, com o objectivo de fazer grandes vinhos de guarda, como outrora.

O ano de 2019 tinha sido em pleno para Rui Roboredo Madeira, cumprindo um ciclo ininterrupto de crescimento iniciado na primeira metade da década passada. Comemorava as duas décadas da sua empresa de vinhos, rodeado dos principais parceiros, clientes, colaboradores e amigos, longe de imaginar que uma pandemia iria paralisar todo o mundo.

Pandemia que mudou o mundo… do vinho

«Ninguém estava preparado, nem no mundo do vinho, nem em qualquer outro sector. Principalmente em Portugal, em que há 10 anos estávamos numa crise terrível e da qual estávamos a recuperar exemplarmente, principalmente graças à excelência do nosso turismo, que sempre foi um dos melhores cartões de visita dos vinhos portugueses e uma das melhores formas de os mostrar ao mundo», acrescenta Rui Madeira, concluindo que «daqui a muitos anos ainda estaremos a falar do pré e pós-Covid-19 na produção e consumo do vinho».

Mas isto não demoveu o enólogo, já habituado a ser inventivo para ultrapassar dificuldades. «Os tempos que vivemos são plenos de desafios que nos colocam todos à prova. É nestes momentos que temos de olhar novamente para a essência das nossas origens, particularmente no mundo dos vinhos. É aí que está verdadeiramente a inspiração para nos reinventarmos, surgindo assim as soluções mais criativas.»

«Crises como esta são oportunidades extraordinárias para repensarmos tudo o que fazemos e como o fazemos. Como vivemos a cada dia esta nossa paixão pelo vinho e como a partilhamos com os consumidores, cada vez mais exigentes e sensíveis às questões da sustentabilidade e equilíbrio com a natureza », reflecte o enólogo.

Por tudo isto, procurou redefinir o foco da empresa e dos seus vinhos. Na procura de respostas a estas questões, reforçou a oferta de vinhos biológicos, sendo hoje um dos principais operadores na Beira Interior, a região que mais certifica vinhos biológicos em território português.

Além disso, esta preocupação estendeu-se à procura de uma viticultura mais sustentável, usando apenas uvas provenientes de vinhas não irrigadas (viticultura de sequeiro), passando pelo uso de técnicas de vinificação que interfiram o menos possível com as características naturais das uvas que dão origem aos vinhos, como, por exemplo, a utilização de leveduras indígenas e fermentação em cubas de cimento.

Entre os novos vinhos destacam-se o Beyra Grande Reserva Tinto de 2018, que os especialistas já consagraram várias vezes como um dos ícones da Beira Interior, região que há apenas uma década estava quase esquecida e que esta marca trouxe para a ribalta. Num registo mais acessível, foi lançado o Beyra Síria, um vinho branco monovarietal da casta mais plantada na região que, em 2020, atingiu a distintividade e expressão que Rui Madeira sempre procurou.

Mas a verdadeira estrela das novidades é o Castello d’Alba Superior, em versão branco e tinto, vinhos que se destacam pela pureza aromática e “sense of place”, com o mínimo de intervenção, e que melhor expressam o genuíno carácter do Douro Superior.

Este artigo faz parte do Caderno Especial “Vinhos e Azeites”, publicado na edição de Julho (n.º 300) da Marketeer.

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