Marketing responsável
Por Fernando Oliveira
Director de Marketing da Mundicenter
O novo regulamento de protecção de dados visa defender a privacidade do cidadão. Apesar da sua implementação, continuamos frequentemente a ser “invadidos” por emails de propaganda e anúncios variados. Apesar desta “invasão de privacidade”, podemos, na maior parte dos casos, facilmente sair da lista de endereços. Mas por que razão continuamos a ser importunados desta forma? Em alguns casos, certamente, as empresas não estão a cumprir com o RGPD, mas acredito que, na maior parte das situações, somos nós que sem o saber estamos a dar a autorização.
Quantos de vós lêem os “Termos e Condições de Utilização” da maior parte dos sites e apps que visitam e utilizam, antes de pôr a cruz no “aceito”? Confesso que também faço parte dos 99% dos que não lêem… Sem o saber estamos muitas vezes a dar autorização para a cedência e utilização dos nossos dados por terceiros.
Em alguns casos, para a utilização da app temos de autorizar a nossa geolocalização, que continua activa e a funcionar sem nos apercebermos dessa situação. Ao termos autorizado a cedência dos nossos dados, inadvertidamente ou não, a nossa geolocalização também é cedida/vendida a empresas de análise e tratamento de dados.
De facto, existem hoje empresas que adquirem esses dados, analisam, tratam-nos e depois vendem-nos. Por exemplo, hoje é possível conhecer os hábitos de vida e consumo dos visitantes de um Centro Comercial, com o recurso a esta informação. É possível saber onde vivem, onde trabalham, quais as zonas, as ruas, os centros ou as lojas que frequentam. Quais os seus hábitos durante a semana ou ao fim-de-semana, onde passam férias… Tudo porque, sem o saber, demos autorização para sermos “localizados”. Hoje somos apenas um “aparelho de telemóvel”, não mais do que isso, se não tivermos fornecido outros dados quando autorizámos a nossa localização. Mas amanhã, com as novas tecnologias digitais (o 5G está já aí) e o uso da Inteligência Artificial, até onde poderá chegar o tratamento e manipulação dos nossos dados?
A questão não está na informação em si mas, sim, na forma responsável ou não de como é obtida, tratada e usada.
A possibilidade de obtenção, análise, de tratamento e uso deste tipo de informação é de facto uma ferramenta de Marketing poderosíssima, que não só permite o conhecimento profundo do consumidor, como permite interagir em realtime de uma forma extremamente eficaz. As empresas podem seguramente criar uma relação fortíssima com os seus clientes/consumidores, proporcionando informação relevante e experiências diferenciadoras, ajudando na gestão do seu tempo e prioridades, e contribuindo sem qualquer dúvida para a criação de valor, não só para a empresa e os seus clientes, mas também para todos os seus stakeholders. O limite será a imaginação, mas não só…
Para que tudo isto seja uma realidade, sustentável a longo prazo, é absolutamente imperativo, que as empresas se rejam, de forma clara e inequívoca, por princípios de “Responsible Business”, ou seja, que sejam empresas com “Propósito”, com foco no longo prazo, que só será garantido se estiver sempre na primeira linha da gestão, da sustentabilidade ambiental, da responsabilidade social, da “governance” das empresas e do respeito pelos seus stakeholders.
Artigo publicado na Revista Marketeer n.º 273 de Abril de 2019