“Words are a barrier to communication”

Judite Mota escreveu John Hegarty no autógrafo da minha cópia do seu livro “Hegarty on Adver­tising. Turning Intelligence Into Magic”.

Então, um dos melhores criativos do mundo, fundador da mais reputada agência inglesa, responsável por muitas das melho­res campanhas de que há memória, o ho­mem que tanto fez pela publicidade e pela comunicação, afirma provocatoriamente que as palavras são uma barreira? É por eu ser redactora e ele ser director de arte? É por, como se diz, já ninguém saber ler e muito menos escrever? Não, nada disso. É porque para contar uma boa história não são neces­sariamente precisas palavras. E se a melhor comunicação é feita de histórias, nem sem­pre estas são feitas de palavras. São, isso sim, feitas de emoções, de sensações, de enredos complexos ou simples, de ideias. E sim, é fá­cil perceber que uma ideia nem sempre tem de ser expressa em palavras e que ela pode ser exponencialmente mais interessante se lhe for dada margem para se desenvolver e nos envolver para além das palavras. Faz sentido o ponto e faz sentido que Sir Hegar­ty tenha escolhido esse tema para provocar uma copywriter tradicionalmente habituada a expressar-se com palavras.

Mas então, vejo na minha mesa, ali mes­mo ao lado do vistoso livro do John Hegarty, com a sua capa laranja fluorescente, o pe­quenino e quase tímido livro preto e branco do Dave Trott “Creative Mishief”. Dave Trott é outra lenda da publicidade inglesa, tal­vez (tal como o seu livro) menos vistoso do que o Hegarty, mas não menos impressio­nante. E não menos inspirador. Dave Trott é um dos melhores contadores de histórias que conheço e no seu pequeno livro, como nos seus blogues, apenas há palavras para expressar ideias. Ideias poderosas, claras, relevantes, pertinentes, expressas de forma envolvente. Ele conduz-nos ao seu ponto de vista sem nunca ser paternalista, professoral ou dogmático. Quando o lemos, pensamos “é mesmo isto!”. Ele tem o talento de pôr em palavras aquilo que sentimos, aquilo que pensamos ou que nunca tínhamos pensado e ainda de nos entreter pelo caminho. E isto é comunicação. Com palavras. Sem barreiras.

Leio os dois livros intercaladamente e de uma forma ou de outra fico a saber muito sobre o passado e o presente da publicida­de, sobre a vida, sobre as pessoas, sobre o trabalho, sobre o mundo. Fico a saber mais. E quem sabe mais comunica melhor e mais acertadamente. Com ou sem palavras.

“Não se esqueçam: uma marca é um aglomerado de histórias ligadas por uma visão”
J. Hegarty in “Turning Intelligence Into Magic”

“As pessoas não pensam como pen­samos que elas deviam pensar”
Dave Trott in “Creative Mischief”

P.S. Ironicamente, a editora desta revista pede-me que escreva mais um parágrafo, porque o texto está muito curto para a pa­ginação prevista… Pois, as palavras podem ser uma barreira à comunicação tanto quan­do são de mais, como quando são de menos. Mas vá lá, já que é preciso encher espaço que se faça de uma forma útil. Por sorte aca­bou de chegar no correio a biografia do Neil French, que se chama “Sorry for the Lobs­ters”. A primeira frase diz:

“Being a writer is like having diar­rhoea; you’d like to stop but you just can’t.”

Bolas, devia ter-lhe pedido para escrever este artigo.

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