TIP Talk: A arte como terapia e o papel das empresas
Qual o papel das marcas, empresas e negócios na manutenção da sanidade da população? E de que forma podem juntar arte e saúde mental numa estratégia de promoção da cultura e produtividade do País? Estas foram duas questões centrais na TIP Talk que juntou Sandro Resende, fundador do Manicómio, e Álvaro Covões, fundador da Everything is New.
Numa conversa organizada pela revista Marketeer, os dois responsáveis discutiram o papel da arte enquanto terapia e a forma como as empresas se podem envolver. Álvaro Covões está certo de que a arte é uma terapia, que ir a uma exposição ou concerto nos ajuda a ficar mais sãos. Sandro Resende, por outro lado, acredita que é preciso esclarecer bem aquilo de que se fala: se olharmos para o exemplo indicado pelo seu companheiro de debate, sim, pode ser muito útil; se saltarmos para uma perspectiva profissional, de pessoas com doenças mentais que são artistas e que querem expor o seu trabalho e enfrentam “nãos” consecutivos devido ao preconceito, então, será melhor não colocar todas as fichas na arte.
Nesse sentido, a forma que o Manicómio encontrou de apoiar artistas com doenças mentais é dando-lhes um espaço para desenvolverem os seus projectos e estabelecendo parcerias com marcas. Assim, o doente mental é visto como artista que acrescenta valor à marca e não apenas como alguém que precisa de ajuda.
«No Manicómio, qualquer pessoa pode entrar. Perde-se o estigma da doença mental. Valorizamos a pessoa e o seu valor enquanto artista», sublinha Sandro Resende, acrescentando que o espectro da doença mental é enorme: um em cada cinco portugueses tem problemas deste tipo. Pode passar, simplesmente, por não conseguir dormir sem a ajuda de um comprimido.
Vinho em parceria com a Malhadinha, projectos em colaboração com a Fidelidade, uma caixa de chocolates Arcádia e o desenho de uma cerveja para a Sagres estão entre os frutos desta estratégia do Manicómio. «Interessa-nos muito o lado criativo. Para nós, não faz qualquer sentido uma marca dar 20 mil euros para ajudar os doentes mentais. Nós agarramos as marcas, queremos acrescentar-lhes valor. (…) A doença mental é apenas uma doença. Não é uma deficiência», afirma Sandro Resende.
Álvaro Covões vai mais longe e desafia as empresas a levarem a arte para dentro de si próprias. Mais do que apoiarem os artistas (com doenças mentais ou não), porque não comprar peças desenvolvidas por esses autores e exibi-las nas paredes dos escritórios, por exemplo? Até porque, desta forma, também estão a fomentar o interesse pela arte dos profissionais responsáveis.
«É evidente que é importante que as empresas apoiem estes projectos. Mas devem pôr arte nas próprias empresas. Para termos colaboradores e parceiros sãos, devemos ajudá-los», sublinha o fundador da Everything is New, e a arte pode ser o caminho para esse fim. Segundo Álvaro Covões, Portugal é dos países com hábitos culturais mais baixos da Europa e, se não revertermos esta tendência, iremos produzir cada vez menos – tende a existir uma relação entre a cultura e a produtividade de um país.
«Acho que somos todos loucos. Definimos um padrão do que é normal na sociedade, mas o padrão está sempre a sofrer desvios. O que é isto de ser louco?», pergunta ainda Álvaro Covões.
Texto de Filipa Almeida
Foto de Paulo Alexandrino