Sim! O entretenimento também pode servir as marcas

Por Cristina Girão, directora de Clientes na LLYC Portugal

O entretenimento, que agora parece “tendência”, é, na verdade, algo que acompanha o ser humano desde o século XVIII. Na sua origem, abrangendo formas mais tradicionais como narração de histórias, teatro e jogos, foi evoluindo ao longo dos tempos para formatos mais modernos apoiando-se no digital ou em tecnologias avançadas. Essa evolução reflecte tão somente a busca contínua do ser humano por diversão, evasão e conexão emocional por intermédio de actividades/conteúdos que lhe ofereçam prazer e satisfação.

De acordo com o estudo Meaningful Brands da Havas Media Group, “o entretenimento tem vindo a assumir maior peso enquanto motivação para o consumo de meios entre os portugueses, tendo os serviços de streaming de vídeo subido para 3.ª posição do ranking dos meios mais utilizados para este fim, ultrapassando o YouTube. Ainda assim, esta categoria continua a ser liderada pelas redes sociais (48% dos inquiridos) e canais de TV abertos (48%).” Ainda, e de acordo com o estudo The State of Marketing Report da Hubspot, o audiovisual (vídeo) é o formato com maior taxa de engagement junto dos consumidores.

É neste contexto que vemos muitas marcas a se afirmarem no mundo do entretenimento, reinventando as suas estratégias de marketing e adoptando novas abordagens e até tecnologias. O branded entertainment tem vindo a estar no top of mind de muitos gestores de marketing e é particularmente neste domínio que a mim, enquanto profissional da comunicação me interessa debruçar, esperando, através deste artigo analisar algumas das diferentes formas que as marcas estão a abraçar para melhor comunicarem com as suas audiências.

Vamos então, por partes, perceber o que é que o entretenimento pode oferecer às marcas e analisar alguns exemplos de marcas que já aplicam:

  1. Engagement com a comunidade, ao ser uma maneira eficaz de atrair a atenção das pessoas, mantendo-as envolvidas por mais tempo. Temos o caso da Worten que para se posicionar no território do gaming “foi à fonte”, aliando-se ao já reputado evento Lisboa Games Week para promover a grande final da sua iniciativa Worten Game Ring LPLOL e, desta forma, conectar com uma comunidade que realmente é fã daqueles conteúdos.
  2. Potencial de alcance, uma vez ultrapassada a fase do engagement, há uma enorme oportunidade de partilha dos conteúdos nas redes sociais e/ou de se envolver com a marca a outro nível. Recordemos o sucesso de Harry Potter, que depois dos livros e dos filmes, manteve audiência para desenvolver um jogo – Hogwarts Legacy – onde a experiência torna-se ainda mais intensa já que se trata de um jogo RPG que permite ao jogador encarnar uma personagem.
  3. Serem memoráveis, já que as pessoas tendem a recordar mais experiências emocionais e divertidas do que informações estáticas ou tradicionais. Quem não se lembra do mítico caso da Emirates que em pleno Estádio da Luz recorda a sua missão de “viajar em segurança” fazendo uma alusão ao jogo em questão?
  4. Associar a valores da marca conectando-os com os valores das suas comunidades. O exemplo da Dr. Bayard que, no pós-covid, se dedicou a reverter o isolamento da população mais velha e, consequentemente, mais isolada, através de uma campanha (“Avós do Peito, Avós para Sempre”) que desafiava os netos a reagir e a reatar a relação; ou da Emma com a criação da Emma PowerNap Station com o objectivo de mostrar a importância de combater a fadiga, principalmente em contexto de condução.

Também nesta questão dos valores pode estar uma nova tendência do entretenimento que é o edutainement (a junção das palavras education (educação) e entertainment (entretenimento) e refere-se à produção de conteúdos educacionais com a utilização de ferramentas de entretenimento como jogos, filmes, brincadeiras, entre outros. Vários museus em Portugal, como o Pavilhão do Conhecimento e o Museu da Electricidade em Lisboa, oferecem exposições interactivas que exploram conceitos científicos e tecnológicos de maneira envolvente. Ou editoras, como a Pato Lógica, conhecida por criar livros e jogos educativos que estimulam a curiosidade e o pensamento crítico das crianças.

  1. Humanização, aproveitando o entretenimento para humanizar uma marca, tornando-a mais acessível para os consumidores. Conteúdos divertidos e interações emocionais podem dar à marca uma personalidade mais autêntica. Temos o caso da Barbie que, da boneca física e algumas produções animadas para crianças, apresentou o seu filme já para um target mais adulto (na verdade, o seu primeiro) aproveitando ainda para passar mensagens tão atuais sobre o empoderamento feminino, tendo a sua estratégia de comunicação sido considerada a melhor do ano e permitido ainda dar palco a outras marcas como a Birkenstock ou a SMEG. O seu sucesso já permitiu o anúncio Barbie World.
  2. Diferenciar-se da concorrência, já que estratégias de entretenimento inovadoras e únicas podem ajudar uma marca a destacar-se da concorrência, tornando-se uma vantagem competitiva. Os conteúdos publicitários do Lidl, que são mini-episódios de entretenimento por si, ao utilizar técnicas humorísticas para ajudar o consumidor a perceber quais os produtos ou as promoções em destaque. Coincidência ou não, mas o Lidl foi a insígnia de retalho mais premiada na Escolha do Consumidor em 2023.
  3. Fidelização da comunidade também é mais forte, se pensarmos que as marcas que conseguem entreter e conectar consistentemente com a sua audiência têm maior probabilidade de criar laços mais fortes e duradouros com os clientes. Fui recentemente impactada com esta notícia que desde logo me fascinou pelo cruzamento de mundos – ficção e realidade – nos quais a Netflix se estava a mover. Netflix Bites, o primeiro restaurante pop-up da empresa em Los Angeles, onde alguns dos chefs dos melhores programas de culinária da plataforma poderão agora ser apreciados pelos seus fãs.

A verdade é que o produto por si só já não “convence” a audiência, que pede por conteúdos diferenciadores num mundo “infoxicado”. As marcas precisam de se colocar no contexto narrativo, de maneira orgânica, sem interrupções. Dessa forma, conseguem atingir uma profunda conexão com seu público-alvo, criando laços emocionais marca-consumidor.

A tendência do entretenimento como solução de comunicação para as marcas está em pleno apogeu, e as marcas estão a desempenhar um papel fundamental na transformação da indústria do entretenimento. Seja através da criação de experiências únicas, da criação de conteúdo emocionante ou do patrocínio de eventos. Essas estratégias permitem conectar com as suas audiências de uma maneira mais significativa e construir relações duradouras. À medida que a indústria do entretenimento continua a evoluir, as marcas desempenharão um papel crucial na definição e no impulso das tendências. A capacidade de se adaptarem, inovarem e oferecerem experiências memoráveis será fundamental para se manterem relevantes neste mundo apaixonante do entretenimento em constante mudança.

Uma coisa é certa: nem tudo cria engagement, mas tudo comunica. Só precisamos de perceber como chegar às pessoas da maneira certa, pois assim garantiremos a sua atenção.

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