Será que 2025 se vai transformar no ano em que os dados se tornam “insuficientes” para entender o consumidor?

Por Márcio Miranda, e-Commerce manager do Grupo Nabeiro

Prometo que não venho falar de tendências de e-Commerce nem de inteligência artificial. Pretendo antes partilhar algumas perspetivas sobre dados e jornada de cliente, convidando-o a acompanhar-me nesta reflexão.

No cenário atual de e-Commerce, as marcas enfrentam alguns desafios devido à rápida evolução tecnológica e à crescente “complexidade” do comportamento do consumidor.

A explosão de canais e ferramentas, principalmente as de AI que prometem “milagres”, a saturação de conteúdos e o aumento da preocupação com a privacidade do utilizador, criaram, no meu entender, um ecossistema em que as abordagens tradicionais de marketing digital podem não ser suficientes para as novas exigências de um consumidor que, para ajudar à “festa”, parece estar cada vez mais exausto de tantos estímulos para captar a sua atenção.

Assim, a necessidade de uma visão integrada da jornada do cliente torna-se essencial, especialmente num contexto em que os dados estão cada vez mais fragmentados, com as plataformas a “limitar” o acesso aos mesmos.

Numa era em que todos querem captar dados e “trackear” cada movimento do cliente, importa ter um sentido crítico sobre algumas questões como: Será que realmente conseguimos medir tudo? Será que precisamos de medir tudo? Será que mais ferramentas equivalem a melhores resultados?

Em certos contextos, dá a sensação de que estamos a “sobrecarregar” o cliente em vez de o ajudar a resolver o seu problema. A jornada de compra já não é tão linear e passou a ser um labirinto, com consumidores a navegar entre redes sociais, e-mails, websites, publicidade digital, pesquisa orgânica, entre outros, onde muitas vezes se torna difícil para os próprios saber onde clicar e que ação fazer.

É aqui que começa o desafio para os gestores de e-Commerce: Será que em vez de ajudar o cliente estamos a fazer o oposto?

Deixe-me dar alguns exemplos:

• Explosão de canais e ferramentas: Aparecem constantemente novas redes sociais e ferramentas de IA, muitas das quais acabam por desaparecer. Esta abundância cria um “síndrome do objeto brilhante”, onde se tenta acompanhar todas as novidades sem uma estratégia definida;

Desgaste dos modelos tradicionais de funil: O “clássico” funil de vendas está a perder eficácia, com as taxas de conversão a diminuir e um CAC (Custo de Aquisição de Cliente) a aumentar, ano após ano;

Forte disputa pela atenção: A pandemia intensificou a presença digital das marcas, criando um cenário onde o número de anúncios supera a capacidade de exibição e, por consequência, aumenta a competição pela atenção dos consumidores;

Gestão de Campanhas Automáticas (Google e Meta): O uso de IA em campanhas, como o Google PMax, centraliza o controlo dentro da plataforma, deixando os gestores de tráfego com mais desafios em avaliar com precisão a relação entre orçamento e resultados. Por sua vez, do lado da Meta, com o Advantage+, criam-se “caminhos” dúbios ao nível de análise de dados;

Fragmentação dos dados e dificuldades na jornada do cliente: As plataformas apresentam dados isolados sem uma visão holística, dificultando a criação de uma visão integrada da jornada do cliente.

Parece o “fim do mundo”, mas não é. A verdade é que cada vez mais importa ter uma visão unificada, com forte pensamento de negócio com estratégia de aplicabilidade prática sem esquecer o principal: criar uma narrativa com o cliente.

Algumas recomendações:

• Centralizar e uniformizar dados: Apostar em tecnologias que agreguem dados de diferentes fontes e canais para criar uma visão única do cliente, onde um bom CDP e tracking de dados SERVER SIDE são dois aliados poderosos;

• Automatizar processos, personalizar a comunicação e adaptar estratégias de acompanhamento: Utilizar IA para personalizar, mas sem perder o controlo. Criar estratégias específicas para monitorizar dados mesmo em plataformas fechadas, onde a automação e o e-mail marketing são ativos ao serviço do e-Commerce bastante desaproveitadas.

• Explorar novos formatos e canais: Em vez de seguir todas as novas ferramentas e redes, foque-se nos canais onde a marca tem maior impacto e adapte o conteúdo ao contexto específico de cada um;

• Apostar em medições alternativas e análise preditiva: Com a diminuição dos dados “rastreáveis”, explore modelos de atribuição e previsão para compreender melhor o comportamento dos seus clientes;

• Criar experiências de conteúdo para retenção: Minimizar a dependência de publicidade intrusiva e concentrar-se em experiências de conteúdo orgânico que será cada vez mais relevante.

Embora a fragmentação de dados e a crescente proteção da privacidade criem desafios na análise e no acompanhamento do comportamento do consumidor, esta pode ser uma altura em que menos será mais e em vez de perseguir todos os dados, é fundamental focar-se nos KPI que verdadeiramente importam. Espero que exista muita clareza sobre este tópico no seu negócio de e-Commerce.

E isto leva-me a duas algumas questões que merecerem uma reflexão:

• Num mundo onde não se pode medir tudo, será que a qualidade da experiência se vai transformar na métrica mais valiosa de todas?

• Numa altura em que se valoriza tanto a experiência do cliente, não estará “o excesso” de proteção de dados paradoxalmente, a dificultar o acesso a informação crucial sobre ele?

Boas reflexões e até 2025!

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