«Separar as embalagens de vez em quando não é suficiente»

Costuma deitar lixo para o chão ou misturar diferentes tipos de embalagens, em vez de separar vidro, papel e plástico, dizendo que é só desta vez? A nova campanha da Sociedade Ponto Verde (SPV) é dedicada a quem respondeu afirmativamente a esta pergunta. Segundo Ana Isabel Trigo Morais, CEO da SPV, o objectivo é incentivar comportamentos mais amigos do ambiente e demonstrar que, em alguns casos, uma vez já são vezes a mais.

A produção da campanha é assinada pela Krypton, a autoria é da agência O Escritório e Augusto Fraga assume o papel de realizador. Ao todo, estiveram envolvidas mais de 150 pessoas no desenvolvimento do filme que sustenta o trabalho publicitário, presente a partir de hoje em televisão, rádio, imprensa, cinema e plataformas digitais.

Em entrevista à Marketeer, Ana Isabel Trigo Morais, João Vilela (sócio e director-geral da Krypton) e Sérgio Gomes (director Criativo d’O Escritório), explicam quais foram os desafios enfrentados na concepção da nova campanha da SPV, qual o público-alvo e de que forma projectos como este têm contribuído para uma mudança de comportamentos em Portugal:

O que motivou o lançamento desta campanha? Qual é o objectivo?

Ana Isabel Trigo Morais (AITM): No contexto actual, em que 7 em cada 10 lares portugueses já fazem separação das embalagens, é crucial continuar a incentivar este comportamento para que, cada vez mais, a tendência seja que todas as pessoas sejam separadoras totais e não apenas parciais (separadores de apenas algumas embalagens e não de todas). Por isso, a nossa ambição é reforçar a mensagem de que o comportamento ideal, e o único com verdadeiro impacto no ambiente, é a separação de todas as embalagens, em todos os contextos, encarando a reciclagem como um acto de cidadania.

O objectivo desta campanha é precisamente demonstrar, através de exemplos de comportamentos socialmente incorrectos, que uma vez são sempre “vezes a mais”. Ou seja, separar de vez em quando não é suficiente.

A quem se dirige?

AITM: A campanha dirige-se a todos os públicos, tratando-se de uma prática para a qual queremos convocar todos os cidadãos. Aos que separam sempre as suas embalagens, cujo comportamento deve ser reconhecido, passando pelos separadores parciais, para reforçar a importância de separar mais e em qualquer circunstância, até aos que ainda não separam e aos quais urge chamar a atenção para que compreendam que esse comportamento tem mesmo de mudar.

Qual é o retorno esperado?

AITM: As metas de reciclagem são cada vez mais exigentes e nesse sentido a nossa urgência assenta na necessidade de incrementar a participação de todos os portugueses neste processo que é uma missão de todos. O que esperamos é precisamente isso, que todas as pessoas entendam que é preciso assumir a missão de reciclar sempre, todas as embalagens, todos os dias e em todos os lugares.

Existem ecopontos disponíveis, existem sistemas de recolha porta a porta, importa haver uma massiva e consciente adesão à reciclagem das embalagens.

Qual é o plano de divulgação da campanha? Em que meios e até quando?

AITM: Esta é uma campanha que estará presente em todo o País em diversos suportes de comunicação dando resposta ao compromisso da SPV de mobilizar toda a sociedade para a necessidade da reciclagem. De Outubro e Dezembro, a campanha surge em televisão, rádio, imprensa, cinema, no digital e em suportes publicitários.

Notam uma evolução no comportamento dos portugueses?

AITM: Os portugueses têm vindo a demonstrar uma crescente preocupação com as questões da sustentabilidade, da economia circular e do impacto positivo da reciclagem tanto em termos ambientais como socioeconómicos. Prova disso são os bons resultados da reciclagem de embalagens da recolha selectiva que, no início de 2019, apresentaram um crescimento de 11%, face a igual período do ano anterior. Isto traduz-se em cerca de 175 mil toneladas de resíduos encaminhados para reciclagem e que equivale ao peso de 450 aviões comerciais.

Qual foi o briefing dado pela SPV?

João Vilela (JV): O objectivo era identificar situações e acções do dia-a-dia que, apesarem de não serem correctas, desculpamos com os famosos argumentos: “é só desta vez”, “é só hoje”, etc. E depois mostrar que o acto de não reciclarmos, sempre com esta mesma desculpa, tem de ser completamente banido e de uma vez por todas. Reciclar é simples, temos todos os meios ao nosso dispor e daí não poder haver desculpas para não o fazer.

Sérgio Gomes (SG): O briefing era simples: sensibilizar os portugueses para a importância de separar sempre as embalagens e colocá-las nos ecopontos, sem excepções. As metas europeias são cada vez mais exigentes e as alterações climáticas reforçam a necessidade de calcularmos o impacto de cada gesto.

Quais são os principais desafios de uma campanha como esta?

JV: Os conteúdos do filme exigiam uma grande equipa e locais diferentes de filmagem, a fim de transmitimos exactamente o que se pretendia. Foram mais de 150 pessoas envolvidas neste filme. Cerca de 60 para produção, 15 pessoas de casting principal e 80 figurantes. As filmagens foram feitas em 8 locais diferentes durante 3 dias.

SG: No que à reciclagem diz respeito, existem três tipos de pessoas: as que separam as embalagens em toda e qualquer circunstância, as que separam às vezes e as que nunca separam. Tivemos que olhar para os números e perceber como é que poderíamos fazer chegar a mensagem a pessoas que pensam de forma muito diferente. Esse terá sido o principal desafio estratégico. O tempo dirá se o superámos.

A responsabilidade é maior quando se tratam assuntos como este? 

SG: A responsabilidade é a mesma em todos os briefings que trabalhamos. As marcas procuram-nos para resolver problemas com ideias surpreendentes e bem sustentadas e é isso que procuramos fazer. Mas também é inquestionável que este é um tema que nos diz muito. Pela relevância e pelo sentido de urgência. Era fundamental acertar na mensagem e criar algum desconforto. Só assim poderemos mudar comportamentos.

Acreditam que a campanha poderá resultar em mudanças efectivas de comportamento? 

SG: Acreditamos muito, caso contrário a ideia não teria saído do papel. A verdade é que os nossos comportamentos evoluíram muito ao longo das últimas décadas. Há 30 anos era comum ver-se pessoas a cuspir para o chão, deixar os dejectos dos cães nos passeios, etc. Hoje há uma maior preocupação em respeitar o que é de todos. E já se olha de lado para aqueles que não o fazem. É precisamente essa pressão social que queremos trazer para o universo da reciclagem. Afinal, separar embalagens também é um acto de cidadania. Hoje mais do que nunca.

Foram desenvolvidos conteúdos diferentes para televisão e web? Que preocupações são necessárias neste sentido?

JV: Não. No entanto, foram feitas três versões do filme cada uma com um final diferente, remetendo para as três vertentes de reciclagem da Sociedade Ponto Verde – o plástico, o papel e o vidro.

Texto de Filipa Almeida

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