Sem comentários… nem entreténs digitais

M.ª João Vieira Pinto
Directora de Redacção Marketeer

Desde que me lembro que a minha filha me acompanha em muitos momentos da minha vida. Jantares, passeios, corridas, viagens… Nuns dias melhor, noutros nem tanto, que a cumplicidade por vezes choca de frente e os limites ganham traços mais finos.

Mas quando olho para trás e a vejo, criança, a almoçar ou jantar com adultos, recordo-a a comer de tudo, sempre, mas, e acima de tudo, entretida à mesa. Sem barulho nem gritos. Com livros e pinturas ou bonecos. Mas com cumplicidade. Sem ecrãs. Sem entreténs digitais que o grande entretém era servido no prato.

A minha filha não é de todo perfeita. E, eu, longe também de o ser como mãe. Só que a conversa e a partilha sempre se sentaram connosco.

Penso nisto a propósito da digitalização de relações. Famílias inteiras à mesa de restaurantes com a cabeça para baixo, a boca sem emitir um som, o olhar fixo e o pequeno rectângulo nas mãos. Que as redes e os jogos não se podem desligar, não se permitem adiar e/ou não há tema a conversar. Mudez. Minutos, minutos e horas de mudez. Em que o que se combina com o belo do bife ou do choco frito é o vazio da rede.

Imensa gente sozinha no meio de tantas multidões!

Nesta edição da Marketeer, fomos conhecer quem está por detrás do investimento publicitário nos Media, em Portugal. Um bolo que tem vindo a encolher e que tem, também ele, atirado muitos meios para fora do tabuleiro. Também ele, que, a outra razão é, lá está, a quebra do número de leitores. Pescadinha de rabo na boca, mas não se fazem omeletes sem ovos, assim como não se investe onde não há público. Ah, desculpem, há público que os lê nos tais ecrãs, à borla, talvez à hora de jantar, mas sem comentar. Que há coisas que não se comentam e, esta, é uma delas!

Editorial publicado na revista Marketeer n.º 337 de Agosto de 2024

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