Salsa: «A sustentabilidade não é negociável do ponto de vista do consumidor»

Até 2023, a Salsa compromete-se a poupar 82 milhões de litros de água e a eliminar por completo a utilização de plástico nas embalagens das suas calças de ganga, evitando um milhão de sacos por ano. O novo compromisso é desvendado no âmbito da nova estratégia de sustentabilidade da Salsa, cujo mote é “Become”.

Segundo a marca portuguesa, a quantidade de água necessária no processo tradicional de produção de uma peça de roupa sempre foi uma preocupação mas, agora, está na altura de apresentar soluções práticas para o problema. You Nguyen, Chief Product Officer na Salsa, sublinha à Marketeer que «neste momento a sustentabilidade não é negociável do ponto de vista do consumidor, mas sim um dado adquirido».

Por isso mesmo, a insígnia precisava de marcar o seu posicionamento de forma mais vincada, dando origem a “Become”. Segundo o responsável, o nome escolhido resume aquilo a que a Salsa se propõe, ou seja, tornar-se melhor, mais sustentável e consciente, tendo noção de que este é um caminho longo e que envolve um processo de tranformação que não acontece de um dia para o outro.

Acompanhe a entrevista a You Nguyen, em que o Chief Product Officer adianta quais serão os próximos passos a dar e qual o impacto que esta nova estratégia poderá ter junto dos clientes.

A Salsa vê-se como uma marca fast fashion? Se não, como procura distanciar-se?

Não nos consideramos uma marca de fast fashion, até pelas características do nosso produto core: os jeans. São peças cuja qualidade – e quando falamos de qualidade, falamos de materiais, fit e acabamentos – tem em conta inúmeras variáveis, entre as quais a durabilidade do produto. É muito interessante para nós quando os clientes – ou até mesmo pessoas do nosso círculo pessoal – comentam que têm um casaco Salsa há 20 anos ou umas calças que passaram de mãe para filha. Isso normalmente não acontece com uma marca de fast fashion.

Os nossos clientes estão habituados a altos padrões de design e de produção, que só podem ser garantidos por uma marca que pensa nas colecções ao detalhe, com todo o tempo que isso implica. Não procuramos responder às tendências, mas antes estar atentos ao que pode fazer sentido para nós e trabalhá-lo de forma consciente, cientes de que o que nos distingue é o fit & feel.

Por último, diria que também a relação valor-qualidade nos distancia dessa denominação. A frequência com que o cliente compra uma peça Salsa é muito diferente daquela com que recorre a uma marca de fast fashion. As nossas peças estão longe do princípio buy today, throw out tomorrow, são um investimento que o cliente faz e que espera que dure no tempo.

A sustentabilidade sempre faz parte da marca ou é uma preocupação mais recente?

Há vários anos que começámos a trabalhar a fundo para podermos oferecer aos nossos clientes alternativas mais sustentáveis. Tudo o que apresentamos hoje é fruto de muitos anos de trabalho e desenvolvimento. Queríamos que as soluções fossem as melhores possíveis, que não restassem dúvidas quanto ao compromisso que estávamos a assumir.

Ao longo do caminho, tentámos sempre melhorar cada pequeno processo, mesmo que, no momento, nos parecesse insignificante. Sabemos que esta indústria é complexa, é um desafio, mas hoje podemos afirmar que estamos no bom caminho e que conseguimos fazer melhor sem comprometer os nossos padrões de qualidade. Neste momento, a sustentabilidade não é negociável do ponto de vista do consumidor, mas sim um dado adquirido.

Quais são as mais recentes medidas implementadas para reduzir a pegada ambiental?

O nosso mais recente e maior compromisso está em reduzir o consumo de água e retirar as embalagens de plástico dos nossos jeans, mas há muito que adoptámos medidas para reduzir a nossa pegada ambiental: o projecto “Become” foi lançado internamente em 2018, juntamente com um conjunto de novas regras. Acreditamos que tudo começa com cada um de nós e por isso as nossas pessoas foram as primeiras a responder ao desafio.

Deixámos de usar plástico nas nossas instalações: cada um dos nossos colaboradores tem um copo de vidro que pode ser usado para beber café sem desperdiçar dois ou três copos de plástico por dia. Caso não traga o copo de vidro, o café continua disponível, mas com o custo acrescido do copo de papel. Também a água é servida em jarros de vidro em todas as nossas salas, permitindo-nos uma poupança de 15 mil garrafas de água por ano. Cada colaborador recebeu também uma garrafa de vidro, que pode encher directamente da torneira, uma vez que a água é potável.

A nível logístico, temos resultados fantásticos das medidas que foram implementadas ao longo do tempo. A nossa nova embalagem de loja online, feita com cartão microcanelado em vez de kraft, permitiu-nos poupar 165 toneladas de cartão e o embalamento das nossas encomendas online, sem qualquer tipo de plástico, permite-nos enviar menos 35 toneladas deste material para o meio ambiente.

Também somos cuidadosos no que toca às emissões de CO2. Asseguramo-nos que os nossos parceiros têm as melhores políticas para chegar aos nossos clientes, mas com atenção ao impacto que isso tem no planeta. A forma como montamos a nossa operação – incluindo o novo ship from store, acelerado pela pandemia de Covid-19 – permite-nos dizer que vamos reduzir a emissão de CO2 por transporte aéreo em mais de 100 toneladas e quase 30 em emissões de consumo de combustível.

A nível de consumo energético, o uso de painéis solares permite-nos não só uma poupança na ordem dos 40 mil euros como ainda a possibilidade de vendermos a energia de que não precisamos.

Quanto aos materiais usados na produção, procuramos sempre alternativas com o menor impacto ambiental possível no seu ciclo de vida. Temos alguns desenvolvimentos muito interessantes e a tendência é que a tecnologia se continue a superar.

Como é que a Salsa propõe reduzir o consumo de água e plástico?

Além de todas as medidas que mencionei acima, e que já estão em vigor desde 2018/2019, temos dois grandes objectivos a que nos propomos até 2023: a redução da quantidade de água necessária para lavar os nossos jeans, que serão todos waterless – até 2023 vamos poupar mais de 82 milhões de litros de água – e a eliminação por completo do plástico na embalagem dos nossos jeans, que corresponderá a um milhão de sacos por ano.

Como surgiu o lema “Become?

Este é um projecto desenvolvido ao longo de anos por um grupo de trabalho de diferentes áreas, com diferentes visões do negócio. Quando começámos a trabalhar no nome da nossa estratégia de sustentabilidade queríamos que transmitisse aquilo a que nos propomos: tornarmo-nos melhores, tornarmo-nos mais sustentáveis, tornarmo-nos mais conscientes. O “Become” surgiu porque acreditamos que traduz tudo aquilo em que nos queremos tornar, além de todas as mensagens que queremos passar. “Become” é uma jornada que não acaba, há um sentido de continuidade implícito: não é algo que termina com uma estação, mas sim que melhora e se supera.

Esta é também uma forma de captar novos clientes? Tendo em conta a exigência cada vez maior relativamente à sustentabilidade.

Diria que esta é uma forma de dar resposta a actuais e a potenciais clientes. Há muito que os nossos clientes manifestam essa preocupação e nos questionam acerca da pegada ambiental do produto que querem comprar. O programa que lançamos hoje é uma resposta em massa ao invés de uma resposta personalizada, como fizemos até agora.

Mais do que captar novos clientes é ter a consciência de que, se eles chegarem até nós, fizemos um trabalho credível e honesto, com impacto no meio ambiente e na comunidade.

Que outras medidas pretendem implementar no futuro? Novos materiais, por exemplo?

Temos muitos projectos em cima da mesa e muita vontade de os implementar. Temos um pipeline de medidas a três e a cinco anos: anunciamos agora os objectivos de 2023 enquanto já planeamos os de 2025, para que, num futuro próximo, os possamos também apresentar e começar a implementar.

A logística, por exemplo, está em constante superação – a pandemia acelerou muito o processo –, sempre em busca das soluções com a menor pegada ecológica quer a nível de transporte, quer de soluções usadas para tal.

Quanto aos materiais, todos os dias surgem novas soluções, que têm de ser analisadas e ponderadas, por isso o nosso trabalho nunca está feito, o desafio é constante. Além disso, temos a nossa própria lavandaria, um projecto que nunca está acabado e em que trabalhamos todos os dias, de forma a torná-la mais sustentável.

Este caminho da sustentabilidade pode envolver também outras marcas, através de parcerias?

Claro que sim, a nossa porta está sempre aberta a marcas que partilhem dos nossos valores e com as quais possamos trazer valor ao cliente final.

Importa só ressalvar que este caminho já envolve outro lado da cadeia – os fornecedores –, que se superam para nos darem alternativas e fazerem parte do movimento sustentável. São parte essencial de todo o processo e acabam por ser um elemento chave, porque trabalham com várias marcas e, inevitavelmente, influenciam as escolhas que fazem.

Vamos, com certeza, trabalhar com fornecedores, e até marcas concorrentes, porque juntos seremos definitivamente mais fortes neste processo de mudança.

Texto de Filipa Almeida

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