Responsabilidade Social das Empresas: um sonho a despertar
Por Maria João Ceitil, head of Talent & Innovation da CEGOC
O Barómetro de 2023 do Grupo Cegos sobre a Responsabilidade Social das Empresas (RSE) emerge como uma peça fundamental que ilumina o estado actual deste tema vital. Das inúmeras reflexões que os dados deste estudo suscitam, realçamos três conclusões essenciais.
- Verifica-se uma mobilização geral para o tema, embora a consciencialização da sua importância ainda não se materialize de forma consistente em acções implementadas nas organizações.
Os dados apresentados indicam um panorama desafiante no que toca às práticas de Responsabilidade Social Empresarial (RSE) nas organizações. Por um lado, observa-se uma mudança de mentalidade e uma maior sensibilização por parte dos colaboradores e gestores para a sua importância. Este cenário é evidenciado pelo facto de mais de 80% dos colaboradores e gestores considerar este um desafio significativo para as organizações. Também uma percentagem substancial de colaboradores manifesta o seu compromisso e confiança nestas práticas como um factor determinante na sua percepção do futuro da empresa.
No entanto, por outro lado, existem lacunas notáveis na efectiva implementação destas práticas nas empresas. A falta de conhecimento sobre a existência de uma função específica em 73% das empresas e a percepção de que a maioria não compreende totalmente as suas responsabilidades sociais (55%), apontam para desafios na integração da RSE nas estratégias e operações diárias das organizações.
O envolvimento relativamente baixo dos colaboradores em projectos relacionados com este conceito (37%) sugere que, apesar do crescente interesse e sensibilização, há margem para melhorar a participação activa dos funcionários nessas iniciativas.
Torna-se crucial que as organizações abordem estas lacunas, para assim garantir uma implementação eficaz da RSE. Isto pode envolver a criação de funções específicas, uma comunicação interna mais eficaz sobre as suas iniciativas e o desenvolvimento de estratégias que envolvam mais activamente os colaboradores nos esforços de responsabilidade social. Tais acções não só beneficiarão a reputação da empresa, mas também contribuirão para o desenvolvimento sustentável e responsável no ambiente de negócios.
- A percepção sobre as práticas de RSE em colaboradores ou em responsáveis é profundamente divergente.
Esta disparidade manifesta-se de forma substancial quando, numa escala de 0 a 10, os colaboradores atribuem uma média de 6,1 ao empenho da empresa na Responsabilidade Social Empresarial, enquanto os gestores atribuem uma média de 8,1 a esse empenho. Situação semelhante ocorre quando as chefias classificam com 8 a informação dos colaboradores sobre a política de RSE da empresa, o que contrasta com a percepção dos profissionais, que indicam um índice de informação de apenas 5,7 sobre as medidas específicas a este nível.
A discrepância torna-se particularmente notória no conhecimento acerca da existência de programas de formação em RSE na empresa ou organização: 82% dos gestores afirma estar ciente desses programas, enquanto apenas 38% dos colaboradores partilha essa mesma consciência.
Estes dados evidenciam uma notável desigualdade na percepção entre gestores e colaboradores em diversos aspectos relacionados com este tema, desde o envolvimento da empresa até ao conhecimento específico sobre programas de formação. A compreensão destas discrepâncias é crucial para aprimorar a comunicação interna e garantir a participação informada e alinhada de todos os membros da organização nas mais variadas iniciativas.
- As práticas de RSE são essencialmente encaradas numa perspetiva instrumental, como forma de melhorar a qualidade de vida no trabalho.
Sobretudo por parte dos colaboradores, a Responsabilidade Social Empresarial é encarada como um meio para aprimorar as suas próprias condições de desempenho no trabalho. Esta percepção reflecte-se em praticamente todos os “rankings” temáticos provenientes das escolhas feitas durante o inquérito.
Destacam-se quatro exemplos concretos onde a “qualidade de vida no local de trabalho” e a sua melhoria surgem como denominador comum que se relaciona com esta política. Em primeiro lugar, na associação directa à própria premissa (sendo o terceiro fator mais citado, com 36%). Em seguida, no ranking dos benefícios apontados para um compromisso (ocupando o primeiro lugar para os gestores e o segundo para os colaboradores). Também nos temas de acção prioritária mais indicados pelos colaboradores, no caso de a empresa assumir um compromisso mais robusto a este nível. E, por fim, no topo (83%) do tipo de formação preferida pelos colaboradores para fomentar um maior envolvimento.
Este barómetro fornece algumas indicações positivas sobre o panorama da Responsabilidade Social Empresarial, mas também aponta pistas concretas onde é crucial intervir. Um destes aspectos é a formação, como evidenciado pelo dado do inquérito deixado propositadamente para o final: nos últimos três anos, apenas 48% dos colaboradores concluíram algum programa de formação sobre aspectos específicos da RSE.