Relação inegável entre aulas de música e o aumento das capacidades das crianças

A participação de crianças em atividades musicais com utilização de voz ou com um instrumento, desenvolve em simultâneo uma multiplicidade de capacidades que são transmigráveis para outras áreas do conhecimento, do desenvolvimento psicológico, do desenvolvimento emocional e desenvolvimento motor.

Quando a evolução das capacidades sensoriais e cognitivas da criança está em pleno, existirá a potenciação do controlo dos sentidos e dos músculos pequenos através da prática musical. Essa atividade musical regular, também é potenciadora do desenvolvimento da linguagem visto que, ainda que por defeito o ser humano tenha capacidade de descodificação de informação sonora complexa, o facto de uma criança crescer num ambiente com estímulos musicais, reforça essas capacidades inatas, através dos exemplos, da experimentação e do reforço emocional positivo. Essa orientação pode ser feita em casa ou seguido uma metodologia programada em ambiente escolar. Independentemente da opção, hoje em dia não se poderá negar os benefícios notórios das atividades relacionadas com música e a sua aprendizagem.

A relação existente entre as zonas do cérebro humano destinadas ao processamento da linguagem e as zonas do cérebro dedicadas ao processamento musical, é referenciada pelo especialista de psiquiatria em Yale, Dr. Kyle Pruett que afirma “Experiência musical reforça a capacidade da competência verbal.” Esta indicação é corroborada no estudo de 2004 intitulado Music Lessons Enhance IQ da Universidade de Toronto. Este estudo, conduzido pelo investigador Schellenberg, teve como objetivo examinar a possibilidade de que, ter aulas de música pode, ou não, trazer benefícios colaterais mensuráveis para áreas não musicais, do domínio cognitivo. A equipa liderada por Schellenberg monitorizou um grupo de estudo com crianças de 6 anos de idade durante um ano. Após medições ao iniciais ao QI de cada criança, dividiu-se as crianças em 3 subgrupos. A um dos subgrupos de crianças foram dadas aulas de instrumento e voz, a outro subgrupo foram dadas aulas de atividades artísticas não musicais, e ao terceiro subgrupo não foram dadas aulas de música, nem aulas artísticas não musicais. Apenas num ano, comparativamente com o subgrupo 3, as crianças do subgrupo 1 (que tinha recebido aulas de música) registaram um incremento de 3 pontos percentuais de QI. No entanto o subgrupo 2 registou um aumento de QI bastante menos significativo que o subgrupo 1. O estudo indicou que existe uma relação concreta e dimensível entre o desenvolvimento de atividades musicais e o aumento das capacidades cognitivas de uma criança.

A pratica musical envolve longos períodos de atenção focalizada. É potenciadora do desenvolvimento cognitivo e de outras capacidades importantes para o desenvolvimento do ser humano. Como exemplos poderemos observar que a rotina de prática necessária ao desenvolvimento técnico-artístico no instrumento, promove a disciplina e a conceptualização da relação da dialética entre o processo e os resultados; que a leitura de notação musical auxilia a desenvolver a capacidade linguística de codificação e descodificação; que a capacidade de memorização é potenciada ao criarem-se mecanismos de memorização de passagens musicais extensas; que o pensamento estrutural é sublimado pela aprendizagem de conceitos musicais tais como duração de notas, subdivisões, intervalos e harmonia. Adicionando a estes fatores, acrescentam-se as vantagens de coordenação motora advinda da progressiva dedicação ao desenvolvimento técnico e a não menos importante apetência para aplicação de emoções distintas na performance musical, com benefícios evidentes para o QE.

Outro estudo de 2002 de Anvari, Trainor, Woodside e Levy, publicado no Journal of Experimental Child Psychology indicou ao mundo académico, que existe uma relação entre as capacidades musicais, o processamento fonológico e capacidades de leitura em crianças de idades do pré-escolar. Não será de estranhar que o discurso e a música usem ambos a mesma zona do córtex e ambos usam a combinação de pequenos elementos chamados de fonemas, que permitem a construção de frases com significado, como evidenciado pelo estudo Perception and cognition of music de Patel e Peretz de 1997.

Foi com base nas múltiplas descobertas feitas nas últimas décadas por pedagogos e cientistas, com foco nas mais atuais descobertas relacionadas com pedagogia e desenvolvimento infantil, que o Professor Doutor Asmus Hintz, catedrático na Universidade Estadual de Música e Teatro de Hamburgo, desenvolveu uma metodologia de ensino de música precoce, para crianças em idade pré-escolar e escolar. Ao seu conhecimento de 30 anos de pedagogia, aliou a experiência como responsável pela cultura educacional e gestão de serviços educacionais de uma das gigantes multinacionais da indústria musical, obtendo a conceptualização de uma metodologia inovadora e focalizada, apropriada para as diferentes fases de desenvolvimento da criança. Esse novo sistema integrado de educação musical tem o nome de ConMusica e passou do projeto à realidade com a ajuda de especialistas em educação infantil, especialistas em pedagogia, compositores e músicos profissionais. Desde a sua criação há poucos anos, passou a ser profusamente utilizado em escolas na Alemanha e em Espanha, estando já a ser praticado em várias escolas estatais em ambos os países, inclusivamente até a Universidade de Cádis já reconheceu o mérito do sistema e desenvolve os cursos para docentes desse sistema educacional.

Pretende-se dar às crianças a oportunidade de adquirir habilidades de prática musical, mais cedo que o habitual e de uma maneira adequada à sua perceção e desenvolvimento, com os estímulos visuais e auditivos adequados. Nas aulas, as crianças são capazes de reconhecer formas musicais (durações, dinâmica, alturas, padrões rítmicos, articulação, etc), cantando e tocando em instrumentos. O currículo especial e os conceitos correspondentes são colocados em prática nas turmas onde os pais (ou outro acompanhante) e os filhos são orientados em determinadas tarefas didático pedagógicas, referenciadas nos planos de sessão descritas no manual do professor. As crianças são inspiradas a descobrir coisas novas, a sentir sons e alegria e a enriquecer sua comunicação com atividades musicais. A interação e identificação da criança é promovida pela ligação a dois personagens de banda desenhada, baseados em animais ligeiramente antropomorfizados para estabelecer a ligação com o imaginário da criança, que irá aprender através de histórias e estímulos à imaginação: Esses personagens são o Max e a Mia. Mas não só as crianças que tomam parte na estimulante aula: Os pais das crianças são convidados a estarem inseridos no processo, apoiados pelos livros de música “Max e Mia” e pelos CDs que os acompanham, orientados por professores credenciados. Os pais têm a oportunidade de cantar com seus filhos, não só na aula, mas em casa também, reforçando a ligação afetiva com tarefas comuns.

De acordo com entrevistas realizadas a famílias alemãs e espanholas, os CDs são colocados a tocar com muita frequência em casa e até no carro. As crianças usam muito o livro, perguntado sistematicamente aos seus pais se podem ir tocar e cantar com eles. Os pais realmente cantam e tocam com seus filhos. Todos os pais entrevistados deram um retorno muito positivo, evidenciando que estão felizes por verem os seus filhos a poderem expressar-se musicalmente. Eles relatam que as crianças falam muito sobre isso em casa e aguardam impacientemente a próxima aula.
No decorrer de dois anos, a criança adquire conhecimentos básicos sobre a cultura musical do seu ambiente, habilidades musicais elementares como leitura de notas musicais, audição diferenciada, reconhece harmonias e estruturas rítmicas, poderá já ter encontrado seu instrumento ideal e estará bem preparado para as lições instrumentais que se seguem. O programa integra divertidamente a performance de música no dia a dia da criança e da sua família. O objetivo é despertar e promover a alegria das crianças, lidar com música e fazer sua própria música. Uma vez por semana, as crianças vão à escola de música acompanhadas por um membro adulto da família, cantam e tocam música em vários instrumentos, com especial ênfase em práticas de piano. Os livros ilustrados com textos e músicas relacionados ao mundo da vida quotidiana e imaginário da criança, apoiam o processo de aprendizagem e desenvolvimento.

Pedro Duarte
Diretor da Escola de Música EMMA, Investigador de Doutoramento, Mestre em Música – Bath Spa University