«Queremos estar entre os 25 europeus»
A ambição é do Grupo Pestana que, para isso, irá reforçar a sua presença em mais capitais europeias. Em paralelo, continuará a investir na América do Sul.
Texto de M.ª João Vieira Pinto
Fotografia de Paulo Alexandrino
Entre 1972 e os dias de hoje, o Grupo Pestana passou de player local – com base na Madeira – para grupo internacional de relevância e líder no mercado português. Presente já em 13 países com cerca de 100 hotéis, a ambição é, contudo, afirmar-se como uma cadeia internacional, entre as 25 maiores da Europa. Para chegar a esse patamar, José Roquette, administrador do grupo para a Área de Desenvolvimento, confirma que ainda «falta uma maior exposição em mais capitais europeias e na América do Sul. Em cidades que são emblemáticas e que podem dar maior visibilidade ao Grupo Pestana».
Será nesse sentido, portanto, que todos os caminhos irão dar nos próximos anos. Entrar em Espanha – com ou sem parceiro local -, Bélgica e Holanda, e reforçar na América do Sul com unidades no Chile e no Peru são alguns dos trabalhos já delineados. «Na Europa, mantém-se como prioridade a afirmação da marca através de hotéis urbanos nas grandes capitais, resultando numa diversificação da carteira de activos do grupo», confirma José Roquette.
Ao longo deste ano, o Grupo Pestana reforçou o portefólio com cinco unidades, faltando abrir o Pestana South Beach em Miami e o Pestana Casablanca.
São mais de 9000 quartos disponíveis para os seus hóspedes na Europa, em África e na América Latina. Além de 45 hotéis, o Grupo Pestana gere a rede das Pousadas de Portugal, tem 12 empreendimentos de Vacation Club, seis campos de golfe, três empreendimentos imobiliários/turísticos, duas concessões de jogo para casino (Madeira e S. Tomé e Príncipe), participação numa companhia de aviação charter, uma agência de viagens e três operadores turísticos. Ao todo, são 7000 colaboradores, com um EBITDA de cerca de 103 milhões de euros e com mais de 404 milhões de euros em receitas em 2011.
«No total, temos mais de três milhões de pessoas que dormem em hotéis do grupo, por ano. É muita gente a experimentar, a falar de nós, a exigir», sublinha Luís Araújo, administrador responsável pelos hotéis localizados na área da América Hispânica e novos projectos naquele continente.
De acordo com a revista norte-americana “Hotels”, o grupo ocupa a 115.ª posição do top 300 das empresas hoteleiras mundiais.
Marketeer: O Grupo Pestana assume a ambição de ser uma cadeia internacional, entre as 25 maiores da Europa. O que é que lhe falta?
José Roquette: O grupo faz este ano 40 anos. Foi um percurso de formação de uma cadeia, de uma marca, de construção de um projecto. Em termos de estratégia empresarial, nasce como grupo regional, na Madeira, e inicialmente não tinha outras pretensões que não fossem essas.
Pela liderança e capacidade de crescimento, o Grupo Pestana está sempre em reinvenção, em inquietação. E foi isso que acabou por levar um grupo regional madeirense ao patamar internacional.
Da Madeira avançou com resorts no Algarve e só depois é que teve necessidade de estar presente na capital. Até ter chegado ao momento em que percebe que também Portugal é pequeno…
O Grupo Pestana é a única cadeia portuguesa que tem capacidade e liderança para ter ambição internacional. Teve sempre um crescimento muito prudente, muito controlado, que acabou por ter sido o que levou a que chegasse à actual crise com boa saúde financeira.
Ou seja, toda a estratégia do grupo tem sido muito prudente mas, ao mesmo tempo, com enorme ambição. Este ano lançámos cinco projectos novos, estamos presentes em 13 países… E todo este crescimento é didáctico para a realidade empresarial portuguesa, porque se trata de uma empresa familiar que tem sabido manter uma gestão profissional, que tem sabido crescer de forma consistente, privilegiando a estabilidade, e que tem conseguido crescer internacionalmente e já competir em mercados tão globais como Londres, Berlim ou São Paulo…
Marketeer: Então o que é que ainda lhe falta para estar entre as 25 maiores da Europa?
José Roquette: Faltam várias coisas. Houve muita coisa que foi feita nos últimos dez anos, não só a nível de projectos como da própria marca. Houve um grande investimento na marca e em tudo o que ela significa. Falta uma exposição maior em mais capitais europeias e na América do Sul. Em cidades que são emblemáticas e que podem dar maior visibilidade ao grupo. A imagem do Grupo Pestana na hotelaria mundial não é proporcional ao seu vigor empresarial. O grupo tem muito mais força em termos empresariais do que tem a imagem da sua marca.
Falta conseguir tornar a marca mais global.
Luís Araújo: Já faltou mais. Mas, claramente, seja pela presença nos vários países, seja pela dimensão que tem, hoje, quando chegamos a um país, é muito mais fácil explicar quem somos e o que fazemos. Temos uma história palpável para contar. Os hotéis existem, são nossos, são geridos por nós, há rácios dos resultados… E tudo isso faz com que hoje tenhamos as portas abertas em qualquer lado para sermos um grupo verdadeiramente internacional e figurar entre os 25 europeus.
Marketeer: Isso significa que haverá um reforço da presença nos mercados europeus?
José Roquette: Hoje, temos duas grandes linhas de desenvolvimento – a América do Sul e as suas grandes capitais e as capitais europeias – que o grupo já definiu há algum tempo e tem vindo a seguir. Temos o caso de Londres e Berlim e temos outros na calha, como Madrid, Barcelona, Bruxelas, Amesterdão. A penetração na Europa vai ser mais lenta do que aquilo que a América Latina hoje permite, até pelo facto da actual crise económica.
Daqui a cinco anos havemos de estar a falar de um grupo que vai estar muito mais forte na América Latina e, com certeza, em mais capitais europeias.
Marketeer: Daqui a cinco anos, quanto mais aberturas terão acontecido?
José Roquette: Diria que estamos, pelo menos, em mais uma ou duas capitais europeias. Na América Latina devemos conseguir andar mais depressa. Até porque se falar hoje do Grupo Pestana na América Latina estará a falar de um grupo que já está muito estabelecido.
Além de que a Europa é um mercado mais difícil, porque mais dominado pelas grandes cadeias mundiais. Será sempre um processo mais lento, mais difícil…
Marketeer: … mas com muito valor para a marca!
José Roquette: Com muito valor. Quando o Pestana Chelsea abre, naquela zona, tem um impacto enorme para a marca.
Marketeer: Estão também a negociar a entrada em Espanha. Já têm alguma previsão?
José Roquette: Em Espanha estamos a estudar dois tipos de projectos completamente diferentes: a oportunidade de unidades isoladas (single assets), hotéis independentes, e a possibilidade de aproveitar este momento para ter algum tipo de parceria com alguma cadeia de pequena e média dimensão existente.
Marketeer: Que tipo de parceria?
José Roquette: Pode ser de capital, ou de capital e gestão. Em termos de marca pode ser co-branding! Estamos completamente abertos porque já percebemos que uma das maneiras de entrar agora em Espanha mais facilmente seria através de uma parceria com alguma cadeia de média dimensão. Espanha tem já três cadeias à escala internacional e tem cerca de dez de pequena e média dimensão que têm bastante a ganhar na sua parceria connosco.
Estamos a trabalhar nos dois sentidos. O que sabemos é que a entrada do grupo em Espanha é uma coisa que vai acontecer.
Luís Araújo: Na América do Sul existe um mercado interno muito forte, pelo que é mais fácil o nosso papel de divulgação da cadeia. No total, temos mais de três milhões de pessoas que dormem em hotéis do grupo, por ano. É muita gente a experimentar, a falar de nós, a exigir.
É muito mais fácil entrar em mercados, aqui, porque temos um sistema comercial que funciona bem no registo de cross-selling e isso dá-nos a possibilidade de crescer da forma a que estamos habituados como, também, do ponto de vista de parcerias comerciais, management!
José Roquette: Colômbia é um bom exemplo disso. O Grupo Pestana sempre tinha definido a Colômbia, Chile e Peru como os três países onde entraria na América do Sul. Ao manifestarmos essa vontade, entramos em contacto quase imediato com investidores que olham para o grupo como potencial parceiro. Qual é a grande vantagem que o grupo tem nos países da América do Sul? A presença no Brasil, Argentina e Venezuela que são desde logo essenciais; em segundo, e em oposição às grandes cadeias internacionais, o grupo tem a tradição de ser investidor e gestor, o que é essencial em termos de credibilidade. Porquê? Porque um parceiro nosso na Colômbia sabe que se as coisas correrem mal também sofremos.
Luís Araújo: Mas a nossa cadeia diferencia- se ainda pelo facto de ter um proprietário que é conhecido, que tem um rosto, que é acessível. É tudo mais próximo e mais directo.
Marketeer: Um dos grandes projectos no mercado português, neste momento, é o Eco-Resort em Tróia. As vendas estão a correr segundo as expectativas…
José Roquette: Este projecto demorou dez anos, porque teve que percorrer todos os caminhos e dificuldades próprios do licenciamento em Portugal, e vai demorar mais dez até estar completamente concluído.
No total, são cerca de 100 milhões de euros de investimento.
A primeira fase correu muito bem, está cerca de 80% vendida, talvez em parte devido a uma virtude que o grupo teve e tem: não tentamos ensinar ao mercado o que é que o mercado devia gostar em função do que achamos. Há essa tentação…
Marketeer: É uma crítica a algum grupo?
José Roquette: A vários. É que um grupo com 40 anos nesta área podia cair no erro de entender que sabe tudo. Mas a nossa preocupação foi fazer uma coisa de forma bastante humilde. Primeiro fomos perceber qual era a procura deste tipo de projectos, perceber a realidade do destino Tróia e tentar fazer uma coisa adaptada ao perfil dos clientes e ao momento, em termos de pricing!
Marketeer: Baixaram os preços?
José Roquette: Não baixámos, mas concebemos um produto para que no fim tivesse um preço supercompetitivo – que representa perto de metade daquilo que a concorrência tinha posto no mercado há dois anos. Não é com o objectivo de passar ninguém. O que entendemos foi que devíamos fazer, desde o início, um projecto adaptado ao momento e à procura.
Marketeer: Qual é esse perfil de procura? Quem tem comprado, até hoje?
José Roquette: Até agora tem sido 95% portuguesa, residente em Lisboa, quadros superiores de empresas. Conseguimos oferecer o projecto Tróia a quem está mais perto dele e quem melhor o pode aproveitar. E conseguimos fazê-lo a um preço extremamente competitivo em toda a costa alentejana. Já começámos a entregar as primeiras casas.
Luís Araújo: Também Cascais é um bom exemplo do grupo não tentar replicar situações num lugar que funcionaram noutro. Poderíamos ter caído no erro de explorar aquilo de forma mais limitada, como mais uma pousada igual às outras 40. Mas o que foi feito foi transformar a Cidadela num espaço multifunções. É muito mais que uma pousada.
E hoje, o que sentimos é que a pousada tem mais procura em função desta oferta e desta disponibilidade. Porque dizemos que lá dentro se pode fazer tudo!
Marketeer: As pousadas são, de facto, um bom activo para a marca?
Luís Araújo: São um excelente activo, quanto mais não seja ao nível de promoção e imagem do grupo.
José Roquette: Para nós, foi mais uma experiência de diversificação. Na altura, o Grupo Pestana estava ainda muito concentrado na oferta que tinha na Madeira e no Algarve. Tínhamos tudo para aprender com este tipo de hotelaria, de charme. Já tínhamos começado a fazê-lo com o Pestana Palace, porque quem gere grandes resorts tem alguma dificuldade em perceber como é que se gere a Pousada de Óbidos, que tem nove quartos.
Para o Grupo Pestana, como um todo, foi um enriquecimento enorme, porque fomos aprender mais sobre um determinado tipo de hotelaria do qual sabíamos muito pouco. Enquanto negócio, não é de grande dimensão, representa cerca de 5%. Mas seria uma perda de oportunidade se não se tivesse apostado nesse projecto.
Marketeer: Em 2011, o grupo registou receitas na ordem dos 404 milhões de euros. E este ano, que previsões?
José Roquette: O Verão vai começar agora e é decisivo. Acredito que não vai ser pior que o ano passado. Portugal vende-se muito no mercado europeu, que tem muito a tradição de vir para Sul. Com os problemas no Norte de África, Portugal e Espanha têm beneficiado…
Marketeer: … mas já beneficiaram o ano passado!
José Roquette: E vai voltar a acontecer este ano. Ainda é cedo para previsões, mas os resultados não devem ser muito diferentes do ano passado.
No universo dos três milhões de pessoas que dormem nos nossos hotéis, os portugueses não valem mais que 15%. A principal fatia são ingleses e alemães.
Marketeer: Têm desenvolvido algum tipo de esforços para levar portugueses para as vossas unidades noutros mercados?
Luís Araújo: Diria que as nossas unidades são preferenciais para os portugueses que vão lá para fora. Na Argentina, por exemplo, os portugueses que vão lá ficam no nosso hotel.
José Roquette: O turista vai para onde houver voos directos, baratos, e, naturalmente, onde houver um hotel que o atraia. Miami é um desses casos. Mas no Brasil o nosso primeiro cliente é brasileiro, em Inglaterra é inglês e na Alemanha é alemão…
Marketeer: Há espaço para o actual número de grupos e marcas hoteleiras em Portugal?
José Roquette: Penso que sim, mas vai haver uma selecção natural que terá que ver com o bom senso (ou falta dele) em termos de estratégias empresariais. O que está em causa é se a solidez daquela estratégia é real ou foi apenas mais uma miragem construída nos anos antes da crise. Isto é um negócio a longo prazo…
Há 40 anos que Dionísio Pestana e a sua equipa só fazem isto. Algumas dessas marcas que podem acabar são marcas que começaram num momento muito ingrato, que aproveitaram a onda do crédito fácil e que hoje não têm a solidez que deviam ter.
Marketeer: Acredita que a prazo haverá uma consolidação do mercado?
José Roquette: Sim. O que está a acontecer é que estes fundos de reestruturação que estão a ser dinamizados pelo Governo podem levar a que essas empresas venham a ser absorvidas por outras.
Marketeer: E o Grupo Pestana, pode dizer-se que está atento a esse processo?
José Roquette: Claro, mas com um apetite muito reduzido. Porque o Grupo Pestana já tem o peso em Portugal que é mais que suficiente. Existe alguma região do País onde não tenhamos uma posição do mercado já relevante? Não. Para Lisboa temos mais dois, a Madeira e o Algarve têm um boa cobertura, no resto do País temos as pousadas…
Luís Araújo: Em Lisboa vamos ter dois projectos diferentes mas muito complementares. São duas unidades muito próximas, com a mesma dimensão. Um será uma pousada, o outro um quatro estrelas, mas serão muito complementares em termos de produto. Um será mais tradicional, o outro mais moderno e aberto à cidade.
Marketeer: Ainda há espaço para mais oferta hoteleira em Lisboa?
José Roquette: Portugal cresceu muito como destino de sol e praia. Habituámo-nos a dar um conteúdo simples, pouco diferenciado e que só se podia afirmar pelo preço. O destino Lisboa nasce doutra maneira, mas nasce muito agarrado a este posicionamento do País. A oferta tem mudado muito, mas a verdade é que ainda é um destino acessível e que ainda não permite fazer produtos extraordinários, porque a procura é mais de três e quatro estrelas.
Mas é um facto que não há espaço para mais 10 hotéis em Lisboa.
Marketeer: A actual política do Governo procura fomentar a procura em detrimento da oferta. Como é que vê esta posição?
José Roquette: Conhecemos bem a equipa. A pessoa que está à frente do Turismo de Portugal conhece bem o mercado e sabe o que é vender. Se há alguém que sabe o que é vender Portugal, o Frederico Costa é essa pessoa. Conhece o perfil da procura.
E é preciso não esquecer que a principal procura por Portugal são as classes médias e médias-altas nórdicas, brasileiras…
Luís Araújo: Só há dois caminhos: ou equilibrar a oferta ou equilibrar a procura. Do lado da oferta estamos cá, nós, empresários para a garantir. Por isso, faz todo o sentido apostar na procura.