Quando a mente joga doçura ou travessura connosco

Por Rita Castro, Software Developer da Volkswagen Digital Solutions

Todos os anos pela altura do Halloween, que já lá vai, os monstros e os demónios têm um livre passe para andar pelas ruas, bater às nossas portas e brincar à “doçura ou travessura” connosco. No México, as festividades são ainda maiores – este dia marca o início das celebrações do Dia dos Mortos, que, apesar do nome, dura vários dias e é, na verdade, uma ocasião de celebração alegre e não de luto pelos mortos.

Mas o mês de Outubro tem outra data que precisa de ser destacada – o dia 10 de Outubro. É um dia que visa sensibilizar para a forma de lidar com os outros monstros que brincam connosco durante todo o ano. O dia 10 de Outubro é o Dia Mundial da Saúde Mental e não deve ser só falado em Outubro, mas em Novembro, Dezembro e em todos os meses do ano.

“Oh, mas eu não sou maluco, não preciso de continuar a ler isto” – receava que pensasse assim, mas fique atento durante mais algum tempo, pelo menos para as curiosidades. Tenho a certeza de que, no final, vai ficar contente por ter lido o artigo completo.

O Dia Mundial da Saúde Mental foi celebrado pela primeira vez em 1992, numa iniciativa liderada pelo Secretário-Geral Adjunto da Federação Mundial de Saúde Mental, Richard Hunter, mas os seus objectivos iniciais eram um pouco vagos. Passavam por promover a defesa da saúde mental e educar o público. A partir de 1994, cada edição deste dia começou a centrar-se num tema ou iniciativa específica. O lema para este ano era reforçar que “A saúde mental é um direito humano universal”, com o objectivo de quebrar o estigma e a discriminação em torno da saúde mental. As pessoas que fazem psicoterapia não são loucas. Estão, em certa medida, doentes. Vai-se ao médico quando se tem gripe? Bem, se não o fizer, a probabilidade de desenvolver febre é muito elevada e, na pior das hipóteses, pode apanhar uma infeção respiratória com repercussões duradouras. Por isso, é melhor não deixar a gripe por tratar, certo? O mesmo se aplica à saúde mental.

De acordo com o dicionário Oxford, a definição de saúde mental é descrito como “o estado de saúde da mente de alguém”. Talvez não seja muito útil e explicativo.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) fornece uma definição melhor, enquadrando a saúde mental como o “estado de bem-estar em que o indivíduo realiza as suas capacidades, pode lidar com as tensões normais da vida, pode trabalhar de forma produtiva e frutífera e pode contribuir para a sua comunidade”. Para além disso, a OMS inclui a saúde mental como parte de um estilo de vida saudável: “A saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de doença ou enfermidade”. Esta definição é um pouco mais abrangente e coloca as coisas em perspectiva – para ser um ser humano saudável, é necessário ser saudável mentalmente também.

Deixem-me voltar ao calendário por um minuto, pois o mês de Outubro é também o mês em que atrasamos os relógios uma hora em Portugal, e também noutras partes do mundo. Faz-nos (pelo menos a alguns de nós…) acordar com alguma luz do sol, mas, por outro lado, quando saímos do trabalho, já está escuro lá fora! Durante estes meses de Inverno, dá por si a perder o interesse por actividades de que costumava gostar? Sente cansaço e falta de energia? Tem tendência para dormir demais porque está aconchegado e quente, certo? O que o faz ficar em casa mais vezes, quase como se estivesse a hibernar? E tem tendência para ganhar alguns quilos durante estes meses? Lamento dizer-lhe isto, mas pode sofrer de uma ligeira perturbação afectiva sazonal (SAD). Trata-se de uma perturbação da saúde mental que afecta uma boa parte da população do Norte da Europa (12 milhões de pessoas, segundo o NHS) e é classificada como um tipo de perturbação depressiva. A primeira coisa a fazer é reconhecer os sintomas e atuar sobre eles, falando com um profissional.

Comecei a fazer psicoterapia quando a empresa onde estou criou o seu Programa de Wellbeing, durante a pandemia, altura em que todos nós enfrentámos níveis anormais de stress e experienciaram uma mudança no sentido de comunidade. Até hoje, a OMS ainda não explorou os efeitos reais que teve na saúde mental da população mundial.

Teria dado esta passo sozinha? Talvez não. A desculpa “mas custa dinheiro!” era uma desculpa fácil que eu usava a toda a hora (esta é uma desigualdade que precisa de ser ultrapassada, mas é um tema para outro artigo). A saúde mental não deve ser algo que tenha a barreira do preço, deve ser acessível a toda a gente que possa precisar de ajuda profissional.

Pessoalmente, o processo ensinou-me a deixar de brincar às escondidas com os meus próprios monstros e a aprender a não os temer, nem a escondê-los no armário, fingindo que não existem. São precisas vozes proactivas para quebrar o estigma que envolve a saúde mental e o pressuposto de que a psicoterapia “é só para malucos”.

É um direito humano universal básico, para todos nós.

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