Quando a Incerteza é a única tendência
Por Duarte Zoio, Chief Communications Officer Vanguard Properties
A obsessão humana por prever o futuro é fascinante, especialmente nesta altura do ano. Partilhamos listas e tendências que prometem decifrar o que está por vir, fingindo que são mais do que palpites informados. Mas, como demonstrou o psicólogo Philip Tetlock, somos terríveis em prever o futuro. Ainda para mais, com a inteligência artificial (IA) a transformar as dinâmicas do jogo, a única coisa garantida é a incerteza.
Marketing e Comunicação também estão no centro desta revolução. Durante muito tempo, acreditámos – eu, pelo menos – que emoções e intuição eram territórios exclusivamente humanos, algo inalcançável para as máquinas. Mas estamos a ser surpreendidos… ninguém sabe para onde vamos, ainda para mais quando as fronteiras da ética ainda não foram definidas.
Embora não “sintam”, as máquinas têm cada vez mais uma habilidade desconcertante para replicar o efeito de sentir. Conseguem criar campanhas emocionantes, prever comportamentos com precisão ou até improvisar respostas que antes julgávamos únicas da nossa espécie. Este fenómeno é tanto inspirador quanto inquietante e levanta uma questão importante: Será que estamos a perder o monopólio sobre o erro criativo? Historicamente, celebrámos o erro como uma faísca de génio, o acaso que transforma um desastre numa obra-prima. As máquinas, no entanto, não erram dessa forma. Elas ajustam-se, evoluem e corrigem, mas carecem daquela “loucura controlada” que tantas vezes conduz à inovação. É como a diferença entre um músico tecnicamente impecável e outro que, com uma nota inesperada, cria um momento mágico e inesquecível.
A ironia é evidente: Quanto mais as máquinas se aproximam da perfeição, mais valorizamos aquilo que é imperfeito. Num mundo cada vez mais otimizado, o erro tornou-se raro – e, por isso, precioso.
Pense num quadro com uma pincelada fora do lugar ou numa peça de cerâmica onde as marcas das mãos do artesão são visíveis. Ou, por exemplo, nos sapatos feitos à mão pelas grandes marcas de luxo. Estes sapatos, muitas vezes, não atingem a perfeição milimétrica das linhas de produção automatizadas, mas é precisamente nas suas pequenas imperfeições que encontramos autenticidade e carácter. São essas nuances que as máquinas (ainda) não conseguem replicar.
Mas a linha entre o humano e a máquina está a tornar-se perigosamente ténue. Quando a IA for capaz de replicar não apenas a nossa intuição e imprevisibilidade, mas também – e este é o maior desafio – a nossa vulnerabilidade, seremos capazes de distinguir o real da simulação? Talvez não. Nesse mundo, o habitual “Conseguem-me ouvir?” das reuniões no Teams ou Zoom poderá dar lugar a uma nova pergunta: “És humano?”.
No entanto, talvez a distinção entre humano e máquina não seja o ponto crucial. O que importa, no meio de tanta eficiência e lógica, é que consigamos preservar aquilo que nos mantém vivos: A capacidade de errar, de sentir e de nos conectarmos uns com os outros. É no abraço de um amigo, na espontaneidade de uma conversa ou na emoção coletiva de um concerto que encontramos o que nos torna únicos. Possivelmente (e sem certeza alguma), no futuro do Marketing e da Comunicação, o foco não será apenas no que dizemos ou fazemos, mas nas vivências que criamos e nos laços que promovemos. Mais do que campanhas, produtos ou marcas, serão as experiências humanas e autênticas que construirão relações duradouras e memoráveis.
O futuro não será uma batalha entre máquinas e humanos, mas uma escolha. Queremos um mundo onde as emoções sejam simuladas à perfeição? Ou um onde as imperfeições continuem a ser o que nos define? Por enquanto, o que ainda nos distingue é simples: Somos seres que erram com propósito. E talvez seja no erro que continuemos a encontrar o que nos faz verdadeiramente vivos. Afinal, o erro e imperfeição pode ser o nosso maior luxo.