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Da roupa para os artigos de casa: La Redoute quer “vestir a casa dos consumidores” e aposta em produtos próprios e nacionais
Durante muito tempo, a La Redoute destacou-se como uma marca de referência em moda com o estilo francês que tanto a caracteriza, sendo amplamente reconhecida pela sua estética elegante e clássica.
O “estilo francês” característico da marca reflete-se na oferta de roupas e acessórios sofisticados, com um design atemporal e uma abordagem moderna, o que a mantém numa posição de destaque no mercado global. No entanto, a marca francesa tem vindo a destacar-se cada vez mais em artigos para a casa e em decoração, especialmente desde a pandemia.
É isso que relata Paulo Pinto, CEO da La Redoute Portugal, em entrevista à Marketeer. Com o início de 2025, é feito o balanço do último ano e como a marca popular de venda de roupa por catálogo se transformou num player incontornável de e-commerce em moda e decoração.
De acordo com dados da La Redoute, na última Black Friday as vendas no segmento Casa alcançaram os 70%, tendo a moda ficado nos 30%. A viragem aconteceu principalmente durante a pandemia com a estação outono-inverno de 2019 a ser a última vez em que o peso da Moda se sobrepôs ao da Casa com 61%.
A partir de 2020, o peso da Casa foi ganhando cada vez mais importância passando a ser superior ao da Moda e subindo exponencialmente até hoje.
Outros dados relevantes sobre a Black Friday de 2024 são que o valor médio de compra foi de 96 euros, tendo registado uma subida de 4,2% face a 2023, e as categorias de produtos mais procurados foram “camas, colchões, sofás, têxtil-lar (capas de edredão, lençóis, tapetes), cómodas e armários de arrumação”.
Quais são as razões que considera terem levado a uma mudança nas escolhas do consumidor da Moda para os artigos de Casa na La Redoute?
Antes de mais, a La Redoute enfatizou muito mais a casa. Ou seja, antes do período do Covid, nós já tínhamos uma marca premium na empresa, que era a AMPM, e viemos fortalecer com uma marca mais de mass market que é a La Redoute Interieurs.
A partir de 2016, 2017 e em 2018, digamos, o arranque mais formal, verificamos que a apetência do consumidor para esse tipo de produtos começava a ser maior. Ou seja, Portugal em termos de mercado de e-commerce é um país ainda pequeno e com menos maturidade do que outros mercados, mas a partir daquela altura já sentíamos que o consumidor português começava a aceitar esse tipo de produtos e a comprá-los.
Foi a partir daí que começámos a mostrar uma maior oferta. Inequivocamente, o Covid veio mudar tudo, ou seja, 2020 foi o consolidar disto porque as famílias portuguesas, fechadas nas suas casas, tinham de ter uma resposta a essa problemática de como evoluir a casa. As pessoas passaram a ter uma casa, um escritório, uma área de jogos para as crianças, ou seja, de um momento para o outro, tudo mudou e a casa começou a ter um papel totalmente diferente.
Foi o consumidor que criou a sua necessidade e nós, a partir daí, começámos a dar soluções mais adequadas. O próprio mercado têxtil foi evoluindo para um modelo diferente de consumo em toda a Europa, com uma penetração digital das marcas asiáticas fortíssimas. Havia a Amazon, mas as marcas asiáticas vieram, de facto, trazer uma nova variável.
E depois, conceptualmente, em termos de mindset, o consumo do têxtil é feito de uma forma diferente para o consumidor versus aquilo que era no passado. E, por isso, aos poucos, foi-se apostando num produto que continuava a ser nosso, porque os produtos da casa são criados por nós, enquanto que, cada vez mais, os produtos do têxtil já não eram, eram marcas que o distribuíamos.
Naturalmente, conseguimos diferenciar-nos no mundo da casa porque a oferta é muito reduzida no mercado português e no mercado europeu, globalmente. Temos um player muito forte que é o IKEA, mas depois, a partir daí, há apenas pequenos players com certos segmentos.
Portanto, podemos dizer que houve uma estratégia da marca que depois foi consolidada com o movimento orgânico do público, especialmente em 2020?
Com certeza que se começou a ter a certeza disso a partir de 2020. O nosso objetivo era, de facto, seguir uma estratégia de abordagem de lifestyle para o consumidor final. Aquilo que eram as nossas perspectivas de evolução do consumo ao longo dos anos. E, de facto, tudo se acelerou e tudo se tornou óbvio quando o Covid se tornou um marco na percepção e na forma de consumir dos seres humanos.
Dizia-me que os produtos da Casa são diferenciados. Em que é que isso se materializa?
Em termos de produtos para a Casa, eu diria que temos três grandes famílias de produtos. Temos os móveis, como eu estava a dizer, da La Redoute Interieurs. Temos os móveis da coleção da AMPM, que é uma coleção premium, muito segmentada com tendências muito específicas. E depois temos tudo do têxtil-lar em que sempre tivemos uma grande tradição, porque o têxtil-lar da La Redoute é, em grande parte, comprado do Norte de Portugal. Ou seja, nós sabemos que Portugal é um país produtor desse tipo de produtos e um produtor de qualidade. Produtos de qualidade e extremamente apreciados pelo consumidor final. Ou seja, nós tínhamos já aí um conjunto de valências que eram, de facto, fortes.
No caso da marca La Redoute Interieurs, à nossa frente tínhamos um mercado, ou melhor, tínhamos um concorrente, que é o IKEA, com linhas muito específicas, um estilo nórdico. E nós viemos trazer o nosso estilo diferente.
Trata-se de um estilo europeu, mais latino, que vem corresponder a um conjunto de estilos, mais prático, e que tem conceitos diferentes daquilo que eram os outros posicionamentos que nós vimos no mercado, e criado por nós.
Por exemplo, temos uma linha criada por nós que são aqueles móveis muito práticos em apartamentos que não podem ser muito grandes, porque nas grandes cidades as casas são mais pequenas. Ou seja, aí todo o conjunto de produtos que nós temos tem de responder às necessidades, como uma mesa de sala que também serve para o escritório e também serve para as crianças poderem fazer lá os seus deveres. Portanto, começou-se a tentar valorizar o produto dando-lhes diferentes objetivos, diferentes finalidades. Ou seja, acompanhando muito aquilo que é a vivência, mais do que impor um estilo, estávamos a acompanhar as tendências.
Sendo a Black Friday um momento de venda tão importante para a marca a nível anual, de que forma se preparam para esta altura do ano? Qual é o plano de marketing traçado para atrair mais clientes nesta altura?
Mais do que falar da Black Friday, é preciso falar daquilo que criou a Black Friday. A Black Friday criou um momento antes do Natal onde a abertura para o consumo é maior por parte dos consumidores. Ou seja, nós não podemos esquecer que temos o período das férias e depois em setembro a forma de consumir é diferente por causa do Back to School, etc. E depois temos, de facto, a preparação do Natal e o mês de novembro que tem que ganhar aqui uma importância capital. E o mês de novembro, porquê? Porque o consumidor está com uma perspectiva de consumo, uma maior abordagem ao consumo. Aquilo que marcas como a nossa fazem é concentrarmos muitos investimentos em termos de search, em termos de social, de rádio, para, de facto, recordar, relembrar a toda a gente que estamos presentes.
Porque, na realidade, aquilo que está muitas vezes nas nossas mentes é de irmos onde se vê. Nós estamos no digital, nós estamos naquilo que é a jornada do consumidor quando ele anda pelo mundo da internet e aí os nossos investimentos são muito focados em search, em meta e num conjunto de variáveis para seremos vistos. Portanto, no fundo a estratégia é esta.
Nós precisamos de recordar às pessoas que fizemos esse caminho e que hoje em dia somos uma empresa de e-commerce, já há muitos anos que somos uma empresa de e-commerce, e que o nosso driver principal é o nome da casa. Nós vestimos a casa dos consumidores e queremos dar-lhes o próprio estilo, como durante muitos anos quisemos dar através do fashion.
No que diz respeito ao e-commerce, e numa altura em que a IA se tornou central nas tendências para 2025, procuram algum tipo de evolução nesse campo com recurso a esta ferramenta?
Não. A Inteligência Artificial tem de ser enquadrada, e já o disse diversas vezes, como uma ferramenta que ajuda os nossos marketeers no seu dia-a-dia a, de facto, serem mais competitivos e serem mais rápidos na tomada de decisões. Em relação ao consumidor final, é evidente que estamos a evoluir, por exemplo, na área do apoio ao cliente, até na área das PDPs, ou seja, da apresentação de produto e de tudo o que é o conteúdo do produto, ou seja, está a ser feito um conjunto de evoluções de melhoria. Porque aqui a Inteligência Artificial o que permite é melhorar e aumentar a nossa eficácia e a nossa produtividade perante a nossa forma de trabalhar, ou seja, vem, de facto, ajudar-nos nisso. Mas não posso dizer, ao dia de hoje, que está a revolucionar o nosso quotidiano. É sobretudo uma ferramenta de trabalho.
Quais são os fatores que considera terem contribuído para o valor médio de compra ter aumentado face a 2023?
O consumidor está a aumentar o cabaz, porque também, no nosso caso, está a fazer evoluir onde gasta o dinheiro. Ou seja, o consumidor compra cada vez mais móvel, em detrimento do fashion.
E no móvel compra cada vez mais caros, e porquê? Porque tem confiança. O NPS [Net Promoter Score] da empresa no ano passado voltou a crescer e está em um nível muito elevado e muito satisfatório. Todos os parceiros que nós temos, na distribuição, de entrega, nos meios de pagamento que pomos à disposição do consumidor, vem tudo facilitar e reduzir o risco e os incómodos, e isso tudo permite ao consumidor comprar mais caro, porque sabe que tem confiança e a questão é essa.
O cabaz aumenta porque o grau de confiança na marca aumenta. Depois, também é uma coisa curiosa. O que temos vindo verificar é que os novos clientes que nós conquistamos, é interessante ver que, ao longo dos anos, o cabaz de entrada aumenta. Isso é positivo porque o fazem através de artigos mais caros, o que é muito bom, porque o lifetime value, normalmente, é mais interessante quando o cabaz de entrada é mais elevado. Ou seja, vemos aqui dois tipos de comportamento: o comportamento do cliente La Redoute, que, ao ter confiança, compra cada vez mais artigos elevados, complexos, em termos do risco da compra; e o recém-consumidor conquistado que se arrisca a produtos mais caros, porque já começamos a ter também uma notoriedade e uma credibilidade que leva a isso.
Portanto, que acreditam na qualidade também?
Seguramente. Aliás, isso é primordial. Atenção, a La Redoute está há muitos anos em Portugal e nunca esteve numa lógica de marketing de one shot. A La Redoute está numa lógica de lealdade e de conquista de consumidor para o tempo. E um ato de compra só é interessante quando aparece o segundo ato de compra, porque queremos é, de facto, que o consumidor esteja satisfeito com a sua experiência de compra, e sobretudo que os artigos estejam em casa e que mostrem às pessoas que recebem.
E em termos de marketing, como é que a marca pretende continuar a distinguir-se no mercado? É muito pela via da casa?
Sim, essencialmente é pela via da casa. Nós temos uma necessidade de aumentar o nosso brand consideration. Nós temos vindo a trabalhar cada vez mais com influenciadores e com técnicas de marketing para nos credibilizar e para nos referenciar, porque o marketing de referenciamento para nós muito importante.
Também estamos a investir muito num canal que não era tão usual no passado, mas que, neste momento, já começa a ter uma expressão simpática, que é o canal do Business to Business (B2B), porque temos muitos projetos em hotéis, muitos projetos com decoradores. É uma forma de mostrar o nosso artigo dentro de ambientes diferentes, consolidando a nossa qualidade, porque a pessoa ao visualizá-lo, ao experimentá-lo, vê aquilo que é o nosso posicionamento e o nosso padrão.
E isso é algo que também nos tem ajudado e no qual nós vamos trabalhar muito no próximo ano. O foco é, de facto, assentar-nos a marca Redoute como uma marca incontornável quando alguém pensa em comprar alguma coisa a nível da casa, seja o têxtil-lar ou seja o móvel, independente do seu posicionamento, posicionamento mais mass market ou posicionamento mais premium, porque temos muita coisa nessa área.
E curiosamente no B2B, somos o país da Europa onde o premium é mais comprado. É uma curiosidade que mostra também as apostas que todo o turismo está a fazer em Portugal em termos de padrão.
A estratégia de marketing para o futuro passa muito pela casa. Relativamente à moda, acaba por ter um papel secundário porque já está cimentado?
Não, a nível da moda temos de tentar responder a produtos específicos que são importantes para o consumidor. Vou dar um caso muito concreto. Muitos consumidores vêm à La Redoute procurar moda através do calçado. Temos muito bom calçado e isso vai continuar. Nós vamos continuar sempre a tentar oferecer coisas diferenciadoras. No têxtil em geral vai-se apostar em determinadas famílias de produto com determinado tipo de tecidos ou de materiais para nos diferenciar daquilo que hoje em dia é um mass market muito forte de muitas empresas de primeiro preço. Estamos nisso para criar também e para manter um estilo porque isso é importante.
Que balanço é que fazem de 2024?
Em 2024, o que foi muito positivo foi a forma como o consumidor respondeu à nossa coleção da casa. Houve coleções que tiveram resultados extraordinários. Foi um ano fantástico em tudo o que é sofás. Tivemos um ano com resultados muito bons, e quando se fala de sofás, temos um leque muito grande. No têxtil-lar também começamos a ter cada vez mais uma oferta que corresponde àquilo que o consumidor português necessita e isso foi, digamos, um dos pontos fortes.
E quais são os pontos que procuram melhorar e objetivos para 2025?
Queremos o consolidar da marca no mundo da casa. É o nosso grande, grande trabalho. Queremos estar presentes em muitos aspectos. Começar a cada vez mais, enfatizar cada vez mais produtos específicos que tenhamos, inovadores junto do mercado. Isso é o nosso foco, é o foco da casa.
E à volta da casa também vamos ter uma grande, grande aposta do canal do B2B, porque há muitos projetos que estão para arrancar em Portugal e penso que temos muitos argumentos para isso. Até a nossa equipa vai ser reforçada. Estamos a reforçar a equipa do B2B com pessoas que estão a entrar agora e que vão dar-nos um maior poder de aparecimento nesse mercado. E isso é bom.
Por último, o foco sempre muito importante é continuar o nosso grau de exigência em relação à qualidade de cliente. Ou seja, temos um objetivo do NPS, Net Promotor Score, elevado em relação a este ano, sempre em crescimento. O cliente tem que continuar a ser o nosso foco e temos que estar preocupados e tentar servir-lhes sempre da melhor forma.