Online vs offline no comércio: o sector vitivinícola em Portugal

A pandemia Covid-19 obrigou as empresas a conhecerem um visível crescimento na venda online, quer um pouco por todo o mundo, quer também em Portugal, denotando que o online é mais um canal, presente e futuro, do comércio.

Este aumento exponencial da venda online estimulou a reflexão sobre as estratégias omnicanal (mais completas e eficazes, uma vez que interligam os diferentes canais de venda de forma a ter um registo integrado de todas as interacções que o público-alvo tem com a marca) e multicanal (prevê mais do que dois canais de venda geridos de forma independente).

Mais ainda, o crescimento acentuado do canal de venda online B2C gerou reflexões sobre as ‘divergências’ deste com o canal de venda tradicional offline B2B. Segundo um estudo efetuado ao sector vitivinícola, conclui-se que algumas empresas consideram que o online B2C irá retrair os consumidores do offline B2B, fazendo com que se recue na decisão de investir no canal de vendas online B2C. Esta insegurança ocorre muitas vezes pelo facto de grande parte das empresas terem uma estratégia sólida e clara no B2B canal tradicional offline e recearem que este se torne frágil com o possível investimento no B2C online.

No entanto, mesmo que as empresas tentem desviar-se desta tendência do digital no presente, a mudança imperará num futuro próximo. As estratégias online são impossíveis de evitar. O ‘novo’ canal de vendas conhece todos os dias um aumento considerável e um enraizamento no quotidiano do comportamento de consumo. Apesar das reticências, o sector vitivinícola que aposta no e-commerce conhece um reforço no sucesso das vendas.

Por Cláudia Ribau, doutorada em Marketing e Estratégia pela Universidade de Aveiro, docente no ISCA-Universidade de Aveiro; Carolina Santos, doutorada em Marketing e Estratégia pela Universidade da Beira Interior, docente no Instituto Politécnico de Portalegre; Joana Figueiredo, mestre em Marketing pela Universidade de Aveiro

O canal online é o presente e o futuro do comércio. As estatísticas demonstram um crescimento de cerca de 90% da venda online pelas empresas e um aumento de 30% no volume de encomendas por parte dos consumidores (SAPO, 2021). Outro valor a considerar é o aumento de 25% da taxa de recorrência de compra, em que cada português realiza em média 20 compras por ano, maioritariamente consumidores com idades compreendidas entre os 16 e os 45 anos (Eurostat – Statistics Explained, 2021; SAPO, 2021). No sector vitivinícola, a percentagem de consumidores de vinho na venda online também sofreu um aumento de 7% em 2020, sendo que em 2019 apresentava 5%, tornando-se um valor significativo e a considerar pelas empresas integradas neste sector (Martins, 2021).

A pandemia de Covid-19 veio acelerar a venda de bebidas alcoólicas no e-commerce e aumentar o engagement por parte dos consumidores em relação a estes produtos (Hora & Lanari, 2020). De acordo com Colbert et al. (2020), as empresas que vendem bebidas alcoólicas online indicam 93,9% de compras na categoria de vinho, sendo esta a percentagem mais elevada face a outras bebidas, tais como bebidas espirituosas (69,2%), cerveja (63,1%) e bebidas energéticas alcoólicas (13,8%) (Fig. 1).

Fig. 1: Vendas de bebidas alcoólicas online

Nas vendas online, o Douro é a região mais requisitada e em seguida o Alentejo, possuindo em conjunto 70% das vendas totais. No entanto, relativamente às categorias de vinhos, os vinhos de mesa tintos da região do Douro e Alentejo são os mais procurados, representando 90% das vendas online (Carvalho, 2020; Marques, 2020). A categoria de espumantes, vinho do Porto e vinhos rosados demonstraram um decréscimo nas vendas durante a pandemia Covid-19 (Pinto, 2021). Nos anos 2018, 2019 e 2020 registou-se uma subida de 40% nas vendas online de vinhos em Portugal (Martins, 2021). Apesar destes valores e do aumento de 2,3% na compra directa nos websites de adegas e 6% nas plataformas generalistas, os portugueses continuam reticentes na compra de vinho online (Pinto, 2021).

Neste período em que os consumidores se voltam para o canal online, também os 4P’S sofrem uma renovação e uma adaptação para 4E’s como é sugerido por Festa (2016): Expertise (Conhecimento), Evaluation (Avaliação), Education (Educação) e Experience (Experiência). As especificidades e a complexidade deste canal exigem um conhecimento a quem está à procura de produto vinícola. A avaliação poderá ser feita através do seu preço e as empresas vínicas contribuem para a educação dos seus consumidores através da comunicação. A experiência é feita nos mais diversos locais de contacto (Festa, 2016), sendo actualmente impossível descurar o canal online.

Quando o consumidor não tem informação suficiente para saber a qualidade do vinho, opta por descobrir a partir de outros meios, como é o caso das media e redes sociais, levando-o a recolher opiniões de terceiros, seja de amigos ou família, seja de desconhecidos (Pucci et al., 2019). Desta forma, gerir com sucesso uma loja virtual integrada no sector vitivinícola tem mais desafios do que se possam julgar e estar atento a estes pormenores, de criar segurança no consumidor e na escolha acertada, deve ser também uma preocupação da marca, conjugando uma estratégia integrada entre os vários canais de venda e os vários canais de comunicação, proporcionando confiança na escolha, com base num caminho sensorial e de co-criação, que tem como fim último a sustentabilidade do projecto de e-commerce.

Considera-se, portanto, que vender vinho português online representa uma grande hipótese de crescer o negócio. Mais ainda, se esse canal for dirigido a portugueses que vivem no exterior esse crescimento é mais acentuado, visto que o vinho português no estrangeiro é escasso e a procura é abundante (Casimiro, 2019).

Existem exemplos de empresas integradas no sector vitivinícola português que perante situações de fragilidade financeira, fruto do impacto da pandemia Covid-19, apostaram em 2019 na criação de loja virtual. Começaram com 50 referências de vinhos e em 2020 passaram a 150-200 referências, exemplo da Garrafeira de Telheiras (Marques, 2020). A garrafeira online da OnWine registou um aumento de 540% de facturação em quatro semanas, correspondendo ao período de 16 de Março a 10 de Abril de 2020, comparado com o período de 1 de Janeiro a 15 de Março (Carvalho, 2020). Ainda na OnWine, as encomendas realizadas rondam os 55 euros, correspondendo a cerca de nove garrafas com o valor de 6,20 euros cada, remetendo para a ideia de que cada consumidor compra pelo menos uma garrafa de Vinho do Porto, Espumante e Bebidas Espirituosas (Catarino, 2020). A Adegga MarketPlace agrega 100 lojas virtuais de diversos produtores e afirma que o valor das vendas ronda os milhares de euros (Marques, 2020).

Tendo em conta o sucesso do e-commerce, as empresas integradas no sector vitivinícola não poderão negar-se ao canal de vendas B2C online e definir estratégias proactivas de implementação de lojas virtuais. As reticências que hoje as empresas têm face à inclusão do canal de vendas online e dos eventuais conflitos que possam gerar com o canal tradicional B2B offline, visto que é mais um canal de acesso do consumidor à marca, faz recuar uns anos aquando do boom do canal grandes superfícies, altura em que se discutia se este canal não viria aniquilar o pequeno comércio a retalho. Hoje, todos subsistem. O que provocou foi uma reinvenção do canal tradicional de vendas, que estava obsoleto, com recurso a estratégias e técnicas mais apuradas de vendas adaptadas ao canal, de forma a melhor atrair os consumidores.

A inserção do online nunca ocupará o lugar do offline, muito pelo contrário, estes dois canais complementam-se. As empresas deverão encontrar um equilíbrio entre ambos, para que em conjunto alcancem resultados positivos e sustentáveis para a marca.

 

Referências:

Carvalho, M. (2020, April 28). Douro e Alentejo são as regiões preferidas dos clientes da OnWine – Marketing de Vinhos. https://marketingvinhos.com/2020/04/28/douro-e-alentejo-sao-as-regioes-preferidas-dos-clientes-da-onwine/

Casimiro, N. (2019, January 17). Vender vinho online. https://investidor.pt/vender-vinho-online/

Catarino, A. (2020, April 27). Confinamento leva a aumento exponencial da compra de vinho online. https://www.tsf.pt/lifestyle/confinamento-leva-a-aumento-exponencial-da-compra-de-vinho-online-12123858.html

Colbert, S., Thornton, L., & Richmond, R. (2020). Content analysis of websites selling alcohol online in Australia. Drug and Alcohol Review, 39(2), 162–169. https://doi.org/10.1111/dar.13025

Eurostat – Statistics Explained. (2021, June). Estatísticas de comércio eletrônico para indivíduos – estatísticas explicadas. https://ec.europa.eu/eurostat/statistics-explained/index.php?title=E-commerce_statistics_for_individuals#E-shopping_from_other_EU_countries

Festa, Giuseppe & Cuomo, Maria Teresa & Metallo, Gerardino & Festa, Antonio, 2016. “The (r)evolution of wine marketing mix: From the 4Ps to the 4Es,” Journal of Business Research, Elsevier, 69(5), 1550-1555

Hora, R., & Lanari, R. (2020, June 19). Construindo marcas de vinho de sucesso, com Larry Lockshin — WineXT. https://www.wine-xt.com/pt-br/blog/2020/6/18/criando-marcas-de-vinho-de-sucesso-com-larry-lockshin

IVV. (2018). IVV // Notícias. https://www.ivv.gov.pt/np4/6388.html

Marques, A. C. (2020, April 26). A pandemia contagiou as vendas, mas não parou a indústria. No vinho também se contra-ataca – Observador. https://observador.pt/especiais/a-pandemia-contagiou-as-vendas-mas-nao-parou-a-industria-no-vinho-tambem-se-contra-ataca/

Martins, I. (2021, January 9). 2020: O Ano do Eno-Commerce – Marketing de Vinhos. https://marketingvinhos.com/2021/01/09/2020-o-ano-do-eno-commerce/

Pinto, I. (2021, April 26). Portugueses resistem à compra de vinho na internet. https://www.dinheirovivo.pt/economia/portugueses-resistem-a-compra-de-vinho-na-internet-13614590.html

Pucci, T., Casprini, E., Nosi, C., & Zanni, L. (2019). Does social media usage affect online purchasing intention for wine? The moderating role of subjective and objective knowledge. British Food Journal, 121(2), 275–288. https://doi.org/10.1108/BFJ-06-2018-0400

SAPO. (2021, June 9). Portugal: Lojas online aumentaram 90% e vendas mais de 50% durante a pandemia  – Negócios – SAPO Tek. https://tek.sapo.pt/noticias/negocios/artigos/portugal-lojas-online-aumentaram-90-e-vendas-mais-de-50-durante-a-pandemia

Wang, O., & Somogyi, S. (2018). Consumer adoption of online food shopping in China. British Food Journal, 120(12), 2868–2884. https://doi.org/10.1108/BFJ-03-2018-0139

Yabin, W., & Li, J. (2020). Segmentation of China’s online wine market based on the wine-related lifestyle. British Food Journal, 122(8), 2385–2401. https://doi.org/10.1108/BFJ-04-2019-0295

Artigos relacionados