O Paradoxo da Antonomásia: Prestígio ou Risco de Invisibilidade?

Por Gustavo Mendes, Director do programa Brand Management da Porto Business School e fundador da Ichika Brand Consulting

A antonomásia é uma figura de estilo através da qual se designa alguém ou alguma coisa pelo nome comum ou o da espécie a que pertence (ou vice-versa) – um nome próprio pode ser substituído por um nome comum (‘Dama de Ferro’ em vez de Margaret Thatcher) ou o inverso (‘O nosso pequeno Camões escreveu um poema’ em vez do nome do próprio filho).

No território das marcas e do branding, a antonomásia acontece quando uma marca de um produto ou serviço se torna a designação comum para toda a categoria desse produto ou serviço – a marca passa a ser a referência para o consumidor que a usa para identificar a categoria.

São inúmeros os exemplos: a marca Gilette designa toda a categoria de lâminas de barbear, a (marca) Chiclete é a referência para a categoria de pastilhas elásticas, a (marca) Post-it para nos referirmos a todos os blocos de notas adesivas, independentemente do fabricante, a (marca) Tupperware que passa a identificar toda a categoria de recipientes de armazenamento de alimentos, a (marca) Jacuzzi que se torna o termo genérico que identifica e designa todas as banheiras de hidromassagem, ou mesmo a (marca) Velcro, um caso clássico de antonomásia, usada para descrever qualquer tipo de fecho “adesivo”, sendo que “Velcro” é uma marca registrada de um produto particular.

A Vantagem da Notoriedade

Este estatuto (de antonomásia) é sinónimo de “força”, de “notoriedade” e de “presença” da marca junto do consumidor e torna-se, por isso, numa vantagem competitiva: a marca, ao ser a referência da categoria, ganha a preferência e a confiança “instantânea” do consumidor, que tende a associá-la a atributos de qualidade e segurança. A marca conquista um espaço no imaginário colectivo, transformando-se ela própria numa referência cultural. Tudo isto cria uma distância óbvia e significativa entre a marca-categoria e as restantes concorrentes, que no máximo ficam a lutar pelo ‘segundo lugar’.

O Risco da Diluição

Contudo, alcançar este nível de destaque pode trazer consigo um risco considerável – o da indiferenciação ou generalização da marca. Quando uma marca passa a ser utilizada como termo genérico para descrever qualquer produto ou serviço da mesma categoria, perde a sua exclusividade e identidade própria. Nesse processo, os atributos e associações da marca diluem-se, o consumidor já não a reconhece como uma entidade singular, mas sim como sinónimo de todos os produtos daquela categoria (sejam eles de qualidade ou não). Sem uma estratégia cuidada, o mesmo reconhecimento que impulsionou o sucesso da marca pode conduzi-la a um cenário de banalização e perda de relevância, como no caso recente da falência da Tupperware, que se tornará para sempre um exemplo deste risco.

Estamos, por isso, perante duas faces da mesma moeda – a notoriedade que confere força e prestígio à marca, diferenciando-a no mercado, pode trazer consigo o reverso, o risco da diluição, em que essa mesma notoriedade leva à perda de exclusividade, transformando a marca num nome genérico para a categoria. Este equilíbrio delicado coloca a marca entre o reconhecimento desejado e o perigo de banalização, onde a identidade única pode dissolver-se na própria categoria, perdendo o valor e distintividade aos olhos dos consumidores.

Neste cenário, as marcas têm – obrigatoriamente – de investir em estratégias que reforcem a sua identidade única e realcem a exclusividade da sua proposta de valor, comunicando e inovando continuamente, adaptando-se às alterações do contexto e às  necessidades do consumidor para evitar a diluição do seu valor.

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