O “novo normal” ainda vem aí!
Por Sílvia Gomes, senior partner na Retail Consult
Com a pandemia, fomos forçados a mudar drasticamente as nossas vidas face a uma ameaça desconhecida e inesperada e, com isto, provámos a capacidade inesgotável de adaptação do ser humano. A mudança foi acontecendo, sempre numa perspectiva temporária e com a convicção de que, nos meses seguintes, tudo voltaria à “normalidade”. E assim, ao longo do último ano, fomos mudando hábitos, comportamentos, práticas, crenças e valores.
Adaptámos as nossas casas, local onde agora têm que coexistir trabalho, família e lazer. Adaptámos modelos de trabalho, o que, graças à maturidade tecnológica actual, permitiu mesmo remotamente manter produtividade e, em alguns casos, até entregar melhores resultados. Basicamente, adaptámos a nossa maneira de estar e provámos que é possível fazer diferente sem perder os objectivos de sucesso pessoal e profissional.
No entanto, este ainda não é o “novo normal”. Esse chegará numa era pós-covid em que não teremos todas as limitações impostas agora, mas em que certamente permanecerão as novas mentalidades. É certo que no caminho que fizemos no último ano há mudanças que não têm retorno e as empresas têm que repensar as suas organizações face às mudanças sociais e comportamentais. Esta paragem obrigatória provocou alterações significativas no comportamento de consumo e até na percepção de bem-estar. O mercado está diferente.
Surgiu um novo consumidor online, que descobriu a conveniência de comprar pela internet e que engloba também pessoas das faixas etárias mais elevadas. O comércio electrónico deixou de ser usado apenas para tecnologia ou moda, passando agora a ser indispensável para todas as categorias. E mesmo depois da reabertura de todas as lojas, o consumidor não vai deixar de comprar online, vai combinar canais de compra e, no online, já não vai aceitar um serviço mediano porque não tem alternativa. Das cinzas da pandemia renascerá um consumidor ainda mais consciente, mais selectivo e mais exigente do que nunca.
Por isso, no “novo normal”, o posicionamento do canal físico vs o digital tem que ser repensado para responder às exigências deste consumidor. Isto envolve uma redefinição dos processos, das pessoas e dos sistemas, criando uma nova organização, capaz de responder aos desafios desta nova realidade.
Já não é concebível que a gama online seja mais reduzida do que a das lojas físicas. Aliás, a expectativa será precisamente a contrária e numa era pós-covid será espectável assistir a uma digitalização das lojas físicas. Isto significa uma mudança na experiência da loja física alavancada pelos avanços tecnológicos, como com a expansão da gama virtualmente, permitindo a redução do espaço físico de exposição de produto, e o reforço da interacção com os clientes através de assistentes virtuais.
Toda a estratégia omnicanal tem de ser revista de forma a garantir uma experiência de marca consistente. Os retalhistas têm de preparar as suas organizações para ter uma resposta igualmente eficiente e complementar, quer no canal físico, quer no digital. Tal como já não é aceitável uma visão separatista entre a loja A e a loja B de uma determinada cadeia de retalho, o cliente também não espera experiências distintas entre o online e o físico. A conquista de confiança e a fidelização do cliente vai mesmo passar pela experiência entregue globalmente, ditada pela estratégia omnicanal.
O serviço de entrega e devolução é crítico e tem que ser continuadamente melhorado. E até a própria cadeia de abastecimento tem que ser revista para endereçar o aumento de volume de entregas particulares, mudando a relação entre produtores e retalhistas. A relação com o consumidor, essa, continuará a ser o foco, mas exigirá um reforço e uma optimização na gestão da comunicação, tornando-a mais frequente e mais personalizada.
O “novo normal” será uma era de novas tendências. Surgirão novos modelos de negócio, novos modelos de trabalho, uma explosão de novas tecnologias e o desenvolvimento de novas competências e até novas profissões. E tudo isto vai exigir novas mentalidades, quer nos níveis de gestão quer nos níveis operacionais para a criação de novas culturas organizacionais.