O novo marketing e o fim do “don’t take it personally”

Por Marco Gouveia, consultor e formador de Marketing Digital, head of Digital Marketing no Pestana Hotel Group e Google Regional trainer

Corremos. Instalou-se, confortavelmente, a cultura do “ao segundo”. Embora a maior acessibilidade da informação, trazida pelo digital, nos tenha tornado mais exigentes e atentos, esta tornou-nos igualmente impacientes. Procuramos a rapidez, evitando, a todo o custo, a perda de tempo consciente. Por esse motivo, nos últimos anos, o marketing sofreu uma mudança profunda nas suas práticas, evoluindo na direcção daquele que é, cada vez mais, um dos aspectos mais importantes para o cliente: o sentimento de identificação em relação às marcas que com ele comunicam.

É-nos fácil entender que, para os clientes – grupo de que todos nós somos membros -, sentir que parte da sua identidade (real ou idealizada) está a ser devidamente representada pelas marcas é absolutamente fulcral. Há cerca de dez anos, a presença das marcas no digital era muito reduzida e o foco destas era o apelo às massas: eram tidos em conta os grandes segmentos de público. No entanto, se isso fez sentido nessa altura, hoje, o digital reina e muitas dessas estratégias tornaram-se obsoletas. Com ele, chegaram novas ferramentas de optimização, tanto da produção, para as empresas, como do processo de escolha, para o consumidor. Tal levanta, não obstante, inquietações para as mesmas: a personalização na comunicação e apoio prestado aos clientes é, de acordo com o recente estudo global da PWC (2018), uma exigência crescente, por parte dos clientes.

Com o digital, tornámo-nos, com efeito, seres caracterizados por uma impaciência quase crónica. Tal verifica-se, nomeadamente, na nossa relação com as campanhas publicitárias: somos cada vez mais intolerantes às irrelevâncias e inadequação das mesmas aos nossos interesses e necessidades. Hoje, procuramos marcas que demonstrem conhecer-nos – ou, pelo menos, uma intenção disso mesmo – e cujo propósito esteja alinhado com os nossos hábitos e ideais; é neste campo, precisamente, que o digital se impõe com soberania e, por outro lado, nos facilita imenso o trabalho. Essa é, de resto, a lógica por detrás do meu próprio trabalho. Apercebo-me, cada vez mais, do valor de uma comunicação próxima dos clientes, de os vermos e tratarmos como pessoas e não como parcelas de um somatório, nas vendas, cliques ou follows nas redes sociais. É por isso que passo uma média de duas horas diárias a responder às suas mensagens e comentários, procurando, também, rodear-me de equipas que partilhem desta forma de estar e objectivo principal: fazer o que estiver ao nosso alcance para melhorar a vida das pessoas.

No que concerne, por outro lado, a questões mais técnicas do marketing – em particular, do marketing digital -, a personalização pode existir em inúmeras situações. Personalizar parte dos processos de e-mail marketing ou adequar uma landing page aos hábitos e características do utilizador são, hoje, também, exemplos de estratégias a que um número crescente de marcas recorre, por permitirem uma maior eficácia na obtenção de conversões – sejam elas subscrições, compras, downloads ou outras. Mas não nos iludamos: a questão da personalização deve ser preocupação de todas as marcas, incluindo as de maior dimensão! A McDonald’s, por exemplo, demonstrou, recentemente, esta atenção ao investir em novos outdoors digitais para melhoria da experiência de drive-thru dos seus clientes, nos Estados Unidos. A tecnologia – aí pensada e testada, em 2018, com um objectivo claro de internacionalização – distingue-se por apresentar menus personalizáveis consoante a hora, as condições meteorológicas, a afluência aos restaurantes mais próximos e as tendências de consumo, no local em específico. A marca, por sua vez, distingue-se das restantes, a meu ver, muito devido a esta capacidade brilhante de se adaptar à mudança.

Dito isto, é evidente que existe uma linha ténue entre a automação de tarefas e a sua personalização com que as empresas se têm, actualmente, de debater. Segundo o estudo realizado pela Dynamic Yield (empresa tecnológica de plataformas de personalização) em 2018, embora a maioria das empresas, a nível global, reconheça a relevância desta personalização, apenas 17 por cento a incluem na sua estratégia. Enquanto marca, o desafio reside, precisamente, em aproximarmo-nos ao máximo dessa medida perfeita, entre a automação e a personalização. Importa mesmo lembrar que os clientes se querem sentir, mais do que nunca, protagonistas de uma causa maior, de uma cultura que admirem e que, acima de tudo, reflicta os seus valores, gostos, modos de pensar e aspirações. A expressão “Don’t take it personally” é, portanto, o oposto do que o marketing deverá preconizar, actualmente – na verdade, tudo, hoje, se quer pessoal.

Principais fontes de notícias e estatísticas:

https://www.marketingweek.com/mcdonalds-ooh-strategy-mass-personalisation/

https://www.restaurantdive.com/news/mcdonalds-buys-dynamic-yield-for-300m-to-improve-drive-thru-experience/551316/

https://www.pwc.com/us/en/services/consulting/library/consumer-intelligence-series/future-of-customer-experience.html

https://www.dynamicyield.com/files/research/personalization-maturity-assessment.pdf

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