O desafio das marcas é passar a mensagem certa de forma criativa e humana

Actualmente, os dados, a Inteligência Artificial (IA) e outras tecnologias têm uma importância fulcral naquilo que é a definição da estratégia de marketing das marcas. A grande diversidade de segmentos e de meios obriga a repensar investimentos e a encontrar formas de tornar esses investimentos o mais eficazes possível. No entanto, há algo que as marcas nunca devem perder de vista: a criatividade. «Fala-se muito em data e em IA, mas as marcas têm de ser humanas, têm de emocionar, ter um propósito, contar histórias. O grande desafio actual é como passamos a mensagem certa de uma forma criativa e humana. Preocupem-se também com a criatividade e em contar uma boa história!», afirmou Catarina Barradas (directora global de Marca da EDP).

A responsável foi uma das oradoras presentes na 22.ª Conferência da Marketeer, numa mesa-redonda que contou ainda com a participação de Pedro Ribeiro (director-geral de Marketing e Comercial da Vila Galé Hotéis) e Sandra Veludo (directora de Marketing Mercados Internacionais do Grupo Nabeiro – Delta Cafés), com moderação de Ricardo Florêncio (CEO do Multipublicações Media Group). “E onde apostar? Onde comunicar? Como comunicar?” foi o tema que deu o pontapé de partida a esta conversa que juntou no palco responsáveis de três empresas que têm algo em comum: uma forte presença internacional.

Respondendo directamente a estas questões, Catarina Barradas lembrou que a EDP é uma empresa multinacional que está presente em 30 mercados, o que coloca grandes desafios do ponto de vista comunicacional. Nos últimos anos, a mensagem da marca tem estado focada na transição energética – ou não tivesse a EDP o objectivo de ser 100% verde até 2030 –, mas essa não é uma mensagem fácil de passar de uma forma global. «Enquanto que em Portugal comunicamos produtos e serviços que ajudam os consumidores na transição energética, no resto do mundo a nossa mensagem é muito complicada, também porque a nossa notoriedade da marca é muito menor e porque temos negócios muito distintos em quatro regiões do mundo. Falamos de transição energética e isso não é nada fácil de explicar às pessoas», referiu a directora global de Marca da EDP.

Por força deste footprint global, a energética portuguesa tem targets muito diferentes. «Há um target mais jovem, muito mais preocupado com o propósito, que está nas redes sociais e temos de adaptar a mensagem para esse target, sem perder a essência daquilo que dizemos, ou seja, que é importante sermos “verdes”. Mas temos parques eólicos noutras regiões do mundo e temos que explicar os benefícios que trazem às comunidades onde estão inseridos. Temos uma abordagem global, mas com muitos insights locais», explanou.

Também a Delta Cafés tem vindo a consolidar a sua presença além-fronteiras, tendo actualmente operações directas em oito mercados e mais de 600 trabalhadores espalhados pelo Mundo. E a prazo, quer atingir o top 10 mundial no mercado do café em cápsulas. Nesse contexto, como se consegue chegar a todos os consumidores? «Fazendo escolhas, analisando os dados e seleccionado o que é ou não prioritário para a organização e para a marca. Não deixamos de ser uma empresa portuguesa, com recursos finitos, mas temos a ambição de conquistar o Mundo e isso é algo que nos deve encher de orgulho. Nesse desígnio, há que fazer escolhas», sublinhou Sandra Veludo.

Este é um primeiro nível de segmentação da Delta Cafés. Depois, há um segundo nível que está directamente relacionado com os canais de negócio, nomeadamente B2C e B2B. A segmentação de cada um é distinta e há que ter em conta outros layers que têm a ver com a cultura do café nos mercados onde a empresa está presente. «Se 92% dos brasileiros consome café, na Europa este número é superior a 60% e em Angola ronda os 35%, então a nossa segmentação é muito mais abrangente e podemos fazer uma comunicação mais mass market», em TV, por exemplo, onde os critérios de segmentação ainda são muito sociodemográficos, frisou a directora de Marketing Mercados Internacionais do Grupo Nabeiro – Delta Cafés. Por outro lado, num mercado como a Polónia, onde apenas 5% dos consumidores bebe café em cápsulas, os desafios são diferentes porque «há todo um novo mundo por conquistar». Por outro lado, no canal B2B, a comunicação é mais one-to-one, para que seja o mais relevante possível para cada um dos clientes.

O mercado hoteleiro tem, neste aspecto, uma particularidade: as marcas podem comercializar os seus produtos (hotéis) no mundo inteiro, mas para que os clientes possam desfrutar desses produtos, têm que se deslocar até eles. Especificamente no caso da Vila Galé, têm de viajar para Portugal, Brasil, Cuba ou Espanha. «Não podemos entregar o nosso produto em casa do consumidor, o que logo à partida é uma diferença», referiu Pedro Ribeiro. Além disso, é um mercado que, do ponto de vista da distribuição, continua a ter um grande peso dos intermediários, que representam «70 a 80% das vendas, dependendo das empresas». Apesar disso, a Vila Galé tem vindo a aumentar o peso da distribuição própria (vendas directas), devido ao aumento do portefólio de unidades hoteleiras e ao crescimento da notoriedade nos diversos mercados.

Em termos de públicos-alvo, os clientes internacionais representam cerca de 80% do negócio da Vila Galé versus 20% de clientes portugueses. Nesse sentido, há um layer de segmentação que faz com que a empresa comunique, muitas das vezes em conjunto com parceiros de distribuição, nos mercados onde tem uma presença mais activa, particularmente no Brasil, onde detém a maior rede de resorts do país. E aí o marketing digital assume especial relevância, até porque permite seleccionar outros critérios de segmentação, mais ligados à geolocalização, por exemplo, que permite promover um hotel num mercado específico, fazer o tracking da venda e saber os resultados em tempo real.

Mas há também uma segunda camada de segmentação que tem a ver com o próprio portefólio da Vila Galé, que tem hotéis pensados para diferentes targets. Se o grupo nasceu no Algarve, com um produto muito direccionado para as famílias, nos últimos anos tem vindo a alargar o portefólio com novos produtos que permitem uma segmentação mais refinada. É o caso de unidades hoteleiras como Vila Galé Nep Kids, inaugurado no ano passado, onde só entram as crianças; o Vila Galé Monte do Vilar, mais vocacionado para adultos; ou o Vila Galé Alentejo Vineyards, ligado ao enoturismo e aos vinhos da marca Santa Vitória. «Temos todos estes produtos segmentados e temos de os comunicar de forma diferente para os vários públicos», frisou o director-geral de Marketing e Comercial do grupo.

E o investimento em marca?

Tendo em conta todos estes novos desafios, onde fica o investimento em campanhas de marca? No caso da EDP, este é um investimento que não está esquecido, até porque a energética tem vindo a lançar campanhas globais de posicionamento, reforçando a tal mensagem ligada à ecologia e à transição energética. Para garantir que a mensagem é relevante em todos os mercados onde está presente, a empresa trabalha com agências de meios em cada um desses mercados para adaptar o spot (quando necessário) mas também aquilo que são os canais de comunicação. «No fundo, temos de pensar que mercados queremos impactar, se a mensagem tem relevância local e isso obrigado a escolher, segmento a segmento, o que queremos fazer. Em Portugal é mais facil, porque as campanhas são direccionadas para o cliente final e o mercado é pequeno. Mas não há uma campanha “one fits all”», salientou Catarina Barradas.

Outras vezes, o target da empresa são governos ou reguladores nos mais variados mercados, onde a EDP assume como missão «influenciar a transição energética». E aí o plano é bem distinto, passando sobretudo pela presença do CEO da empresa em fóruns globais que são relevantes nesta matéria, de que são exemplos recentes a Conferência das Partes (COP), a cimeira do clima organizada pela Organização das Nações Unidas (ONU), a Climate Week que decorrerá em Nova Iorque em Setembro ou a conferência “We Choose Earth Tour”, promovida pela própria EDP e que terá a sua segunda edição a 20 de Junho em Munique, na Alemanha.

No caso da Delta, Sandra Veludo lembra que «é a marca com mais notoriedade no mercado mas quase não fez campanhas de marca nos últimos cinco anos». Toda a visibilidade que a marca consegue ter nos pontos de venda tem contribuído para essa notoriedade, até porque o mais importante é a experiência do consumidor. «Quando bebemos um café, a experiência que temos, a forma como foi tirado, é o que levamos para casa», explana a directora de Marketing Mercados Internacionais do Grupo Nabeiro – Delta Cafés. O desafio, acrescenta, é garantir que a experiência é consistente no canal Horeca e em casa. «Trabalhar muito tudo o que sejam conteúdos relevantes, entender muito bem quem são os nossos clientes e desenvolver uma comunicação o mais relevante possível, tocando os vários touchpoints», conclui.

Texto de Daniel Almeida