Mudar é viver: três desafios para 2024

Por Mário Porfírio, professor de Política Comercial e de Marketing da AESE Business School

Todos os anos, por esta altura, fazem-se balanços e previsões, mais ou menos optimistas. A minha perspectiva é que 2024 será um grande ano para as organizações que abracem três desafios: incentivar a curiosidade, valorizar a experimentação e apostar nas capacidades adaptativas. Vamos a isso?

“A capacidade de dominar e explorar a mudança tornou-se uma das habilidades de gestão mais procuradas. Isto é particularmente verdadeiro no marketing, onde o próprio ritmo da mudança está em aceleração constante”. Com sessenta anos, esta afirmação de John D. Louth, manager no escritório de São Francisco da McKinsey, não podia ser mais actual e as mudanças que sugeriu que iriam impactar o marketing de forma transformadora são ainda hoje parte dessa essência: o domínio do consumidor, o aumento da investigação em marketing e da experimentação, a ascensão do computador, a orientação das forças de vendas para o valor e a definição de estratégias globais de marketing.

Em 2022, Philip Kotler, numa entrevista sobre os 55 anos do lançamento da primeira edição do seu livro “Marketing Management”, considerado por muitos o livro de marketing mais influente no mundo, identificava a centralidade no consumidor como um dos conceitos essenciais, transversal a todas as edições do livro, e que o crescimento de outras dimensões, como por exemplo big data, social media e e-Commerce, não alterou o facto de que um dos propósitos principais de qualquer empresa seja criar valor para os seus clientes. Então, mesmo que as empresas não mudassem, os clientes mudam, originando mudanças no marketing. São as pessoas, os seus comportamentos, crenças e valores que mudam o mundo e, neste caso, as acções de marketing.

Como já lemos anteriormente, “a capacidade de dominar e explorar a mudança tornou-se uma das habilidades de gestão mais procuradas”. Por outras palavras, adaptação à mudança era, nos anos sessenta, uma das competências mais procuradas pelas empresas, como o é ainda hoje – ou, pelo menos, devia ser e não exclusivamente no marketing. O ano de 2023 ficou marcado pela utilização dos modelos alargados de linguagem e pela abertura de horizontes da Inteligência Artificial (IA). São inúmeras as questões legais e éticas das disrupções. No caso da AI, podemos enumerar, por exemplo, a integridade, propriedade e privacidade dos dados ou a sua utilização segura e responsável nas organizações. Mas não são menos exigentes os desafios de mudança que se colocam às organizações para integrar, inovar e diferenciar-se através da utilização IA. Como podemos então dominar e explorar esta nova mudança que temos pela frente?

Em 2024, são três os desafios que teremos em mãos:

Incentivar a curiosidade

É mais frequente do que se diz: os gestores seguem a sua intuição, em vez dos dados de mercado, em especial quando estes são contrários à sua intuição. A confirmação das nossas convicções não é um fim, mas um resultado possível e, se nada muda, provavelmente há algo que não estamos a ver. Algo que não estamos a perguntar. Colocar os clientes no centro das atenções, é ter verdadeira curiosidade sobre o que querem e pensam. É uma capacidade que deve ser cultivada, especialmente depois de muitos anos no mesmo setor ou atividade.

Valorizar a experimentação

Já vimos que as empresas de marketing, agências e indústrias criativas em geral, vivem com facilidade a mudança. Mas a tecnologia está disponível para todas, mesmo para aquelas em que a experimentação e mudança não fazem parte do seu dia a dia.

O professor Stefan H. Thomke, num artigo de 2020 na Harvard Business Review, sugere que as ferramentas e a tecnologia não são os obstáculos ao crescimento da experimentação nas organizações, mas sim a cultura, comportamentos, crenças e valores.

Valorizar a experimentação, passa por reconhecer a sua importância, colocá-la no dia-a-dia, não de forma esporádica, mas de forma estruturada e acessível a todos.

Apostar nas competências e capacidades adaptativas

A evolução do marketing digital, com a explosão e fragmentação dos meios, implica uma incorporação de dados e competências que habitualmente estavam na esfera das empresas e de um ou dois fornecedores (agência criativa e agência de meios). Além disso, são inúmeras as necessidades de desenvolvimento de capacidades e skills específicos de marketing, mas o verdadeiro desafio é aliar ao desenvolvimento técnico específico, uma visão adaptativa das capacidades, que pode ser dividida em três dimensões: a capacidade de “observar”, para desenvolver um sistema de alertas que antecipe as necessidades de mercado que não estão a ser respondidas; a capacidade de “experimentar”, e de aprender continuamente com os resultados das experiências; a capacidade de “ter mundo”, estabelecendo relações com parceiros inovadores que alarguem os nossos horizontes, nos permitam testar e incorporar inovação e incentivar os parceiros atuais a seguir o mesmo rumo.

O reconhecimento das competências existentes na empresa aliado ao conhecimento do negócio são dois activos fundamentais para a gestão de marketing de uma organização. E também dois excelentes pontos de partida para avaliar e identificar lacunas e definir estratégias de melhoria de capacidades adaptativas e skills.

Artigos relacionados