Modelos mentais, a base da racionalidade
Por Teresa Geraldo, UX Researcher na Bliss Applications
Vivemos num mundo que nos sobrecarrega com informação, estímulos e desafios. Tomamos decisões desde o segundo em que acordamos até ao momento em que nos deitamos.
Para lidar com esta complexidade, procuramos padrões, inconsciente e conscientemente, que nos ajudam a compreender e navegar pelo que nos rodeia. Pequenas bússolas internas que nos guiam através das experiências e da informação que absorvemos. A estas bússolas chamamos “Modelos Mentais”.
Estes modelos influenciam a forma como vemos e percebemos o mundo e desempenham um papel preponderante no nosso processo cognitivo e tomada de decisões. No entanto, estas representações internas da realidade são influenciadas por uma série de variáveis (emoções, motivação, capacidade limitada de processar informação, etc). Consequência? Desenvolvemos vieses cognitivos que influenciam as nossas atitudes e comportamentos e impedem que vejamos o mundo de forma objectiva.
“Não vemos as coisas como elas são, vemos as coisas como nós somos.” – Anais Nin
Como podemos elevar a qualidade do nosso raciocínio?
Enquanto researchers, para garantir uma recolha e análise de dados real e objectiva, precisamos de identificar e mitigar os nossos próprios vieses cognitivos. Alguns exemplos de vieses que, muitas vezes, afectam a qualidade das nossas decisões:
Efeito de Enquadramento
Quando a forma como a informação é apresentada influencia como esta é percebida e avaliada. O enquadramento positivo ou negativo pode alterar significativamente a resposta dos receptores da mensagem.
Ao perguntar ao participante numa entrevista “De que forma é que as novas funcionalidades melhoraram a sua experiência?” estamos a ditar a direcção da resposta. O participante focar-se-á no que melhorou, mesmo se existirem outros factores que tenham contribuído negativamente para a sua experiência e percepção de valor.
Viés de Falso Consenso
Tendência de acreditar que as nossas opiniões e comportamentos são comuns e compartilhados pela maioria das pessoas. Partir deste pressuposto poderá resultar na superestimação do grau de concordância dos outros com as nossas próprias visões, contribuindo para suposições erróneas sobre o público-alvo.
Enquanto researchers, quando nos consideramos utilizadores do produto para o qual estamos a trabalhar, há uma tendência para assumir que as nossas dificuldades ou satisfações ao interagir com o mesmo são universais. Desta forma, descartamos opiniões distintas das nossas por considerarmos que são outliers.
Viés de Confirmação
Tendência de procurar, interpretar e lembrar informações que confirmem as nossas crenças pré-existentes, ignorando evidências contrárias. Isso poderá levar a uma interpretação distorcida dos dados, comprometendo a objectividade.
No processo de research, existe a tendência de procurar informação que valide as nossas crenças. Este viés é muito comum quando estamos a apresentar dados. Damos, por vezes, mais ênfase aos dados que validam aquilo em que acreditamos.
Estes são apenas alguns exemplos que impactam a qualidade das nossas decisões. Existem muitos mais e, não só na esfera profissional como na pessoal, é fundamental estarmos conscientes que eles existem e reconhecermos quando é que ocorrem para garantir que não interferem na interpretação objectiva dos dados.
“Muitas das decisões importantes na vida são tomadas baseadas em informações incompletas e julgamentos imperfeitos.” – Amos Tversky
Se os modelos mentais resultam da nossa necessidade de compreender o mundo de forma mais eficiente, como podemos aprimorá-los para torná-los mais eficazes?
Para além deste reconhecimento dos nossos próprios vieses, podemos também aprender sobre novos modelos que melhoram a nossa capacidade de ver as situações sob diferentes perspectivas.
“A qualidade do nosso pensamento depende dos modelos que estão na nossa cabeça.” – Shane Parrish
Alguns exemplos de modelos que nos vão ajudar a pensar melhor.
Pensamento de Segunda Ordem
Consiste em considerar as consequências das consequências das nossas decisões. Desta forma vamos ser capazes de antecipar o impacto a longo prazo e evitar efeitos negativos não intencionais.
Implementar um programa de recompensas pode inicialmente aumentar as interacções com o produto, mas a consideração de segunda ordem revela que isso pode levar a comportamentos indesejados, como utilizadores que manipulam o sistema para ganhar recompensas sem realmente interagir com o produto de maneira significativa.
Inversão
Consiste em pensar de forma invertida. Quando temos um determinado objectivo, em vez de pensarmos no que podemos fazer para o alcançar, pensamos no que nos pode impedir de alcançá-lo. É uma ferramenta poderosa porque destaca os pontos que devem ser evitados ou os erros que podem estar a ser cometidos e que, numa abordagem positiva (“O que preciso fazer para atingir o meu objectivo?”), podem ser negligenciados.
Ao tentar melhorar o processo de sign-up de uma aplicação, a inversão sugere pensar no desafio de forma a perceber e eliminar barreiras que podem frustrar os utilizadores – “O que posso fazer para tornar este processo o mais frustrante possível?”. Criando, assim, um processo fluido e intuitivo, que cumpre os objectivos.
Estes são apenas alguns exemplos que, quando bem aplicados, melhoram significativamente o nosso entendimento do mundo e contribuem para uma tomada de decisões mais informada e objectiva.
No nosso processo é importante que caminhemos nesta direcção – despirmo-nos de vieses e empatizar com o mundo que nos rodeia. Sabermos aplicar a teoria. O caminho para a excelência é uma aprendizagem constante.