MIL: «Podemos ser um acelerador de profissionalização para artistas»

Nos dias 1 e 2 de Junho, Lisboa vai receber um novo tipo de festival de música, que combina concertos e conferências, tendo em vista um debate alargado sobre o presente e futuro da indústria. Durante a tarde, discute-se “Os direitos dos artistas na era digital” e o “Mercado Lusófono 2030” (entre outros); à noite, ouve-se B Fachada, Capitão Fausto ou Da Chick, num total de mais de 50 showcases.

As duas vertentes do MIL – de festival e convenção – estão divididas, tal como o dia, em dois programas com localizações e preços diferentes. O programa pro destina-se a profissionais do mundo da música. O programa artístico ao público em geral.

Fernando Ladeiro-Marques, co-produtor do MIL, explica à Marketeer que «Portugal era um dos poucos países europeus a não organizar um evento como este», que abordasse os dois lados da música. O responsável fala ainda sobre a ligação desta primeira edição a França e à lusofonia, o potencial impacto económico do evento e os desafios da internacionalização da música portuguesa.

Qual é a importância de juntar vários países em torno da música?

São várias as razões para juntar os países em torno da música e para compartilharem problemas e soluções ligados à indústria. Os nossos problemas ou os nossos objectivos (direitos de autor, exportação, distribuição, revolução tecnológica…) são idênticos nos países estrangeiros. É importante discutir a nível internacional, e não exclusivamente entre nós. Estes encontros também são um modo dos profissionais se conhecerem melhor e de desenvolverem colaborações culturais e comerciais.

Porquê a parceria com Paris nesta primeira edição do MIL?

Eu organizo em Paris, desde 2010, o MaMA, que se tornou num dos mais importantes “Festival- Convenção” internacionais. A ideia é tirar proveito da experiência e do sucesso do MaMA para criar esta parceria com Paris e imaginar o modelo do MIL, hoje e amanhã.

A minha experiência e a minha relação pessoal com Portugal deram-me a vontade para criar este tipo de evento aqui. Estou convencido de que é o lugar e o momento certo para o isto.

Faltava em Lisboa (e em Portugal) um festival deste género? Com uma componente aberta ao público e outra mais profissional?

Hoje, este tipo de evento existe na maioria dos países europeus, mas também na América do Norte, Ásia e noutros continentes. Isto demonstra a importância, para todo o sector musical, de realizar um evento desta natureza em Portugal, que era um dos poucos países europeus a não organizar um evento como este.

Mas também é importante permitir que o público participe na dimensão “festival” do MIL, onde pode ver os artistas que conhece e que aprecia, mas também descobrir novos nomes. Não podemos esquecer que, quando nós vendemos música, a primeira coisa que nós vendemos é emoção! Uma emoção colectiva que, muito frequentemente, passa pela descoberta.

Quais são os objectivos do evento?

O primeiro objectivo do MIL é permitir que os profissionais portugueses, lusófonos e internacionais, se encontrem e desenvolvam colaborações. É obviamente um evento cultural porque estamos a falar de música, mas também é um lugar para troca de informação e business. O MIL pode ser para os artistas um acelerador de profissionalização, de promoção e desenvolvimento.

E que impacto pode o MIL ter em termos económicos?

O facto de juntar vários actores do sector musical favorece naturalmente o negócio e a exportação, que pode ser pensada de vários modos: um deles consiste em enviar artistas a um evento no estrangeiro, para que sejam vistos por profissionais. Mas o sucesso é imprevisível se não houver já contactos e um começo de colaboração no país onde eles vão.

O outro modo de pensar a exportação é “importar” profissionais estrangeiros, compradores potenciais que vêm descobrir os artistas em casa deles, no contexto deles e em frente ao público deles. Do meu ponto de vista, esta segunda opção é muito mais efectiva e é o objectivo principal do MIL.

Quais são os principais desafios à internacionalização da música portuguesa?

Em primeiro lugar, é importante fazer as coisas na ordem certa. A internacionalização é o último andar da casa, é o seu telhado. Para garantir o sucesso, é necessário construir e solidificar todos os andares da casa. É preciso um mercado adulto com actores profissionais.

Desde há alguns anos que o sector musical português se desenvolveu muito, o mercado é dinâmico e, o mais importante, muitos artistas portugueses têm um real potencial internacional. O que falta, hoje, é uma visibilidade fora do País para os artistas e uma vontade política de apoiar o sector musical e considerar isto como uma grande oportunidade, não só cultural, mas também comercial e social.

Que papel pode o Marketing ter neste processo?

Nós vivemos na sociedade da imagem e da comunicação. O melhor produto só pode ter êxito com um “empacotamento” e uma mensagem bem pensados. Ter excelentes artistas é importante, mas saber fazer é vital. Com a multidão de meios de comunicação, é necessário emergir para ser conhecido e um Marketing bem feito, original e dinâmico, pode ser a chave do sucesso.

Como vê a relação entre músicos e restantes intervenientes do sector? Falta alinhamento?

Durante muitos anos, a indústria teve o monopólio, os artistas eram espectadores da sua carreira e tinham que passar pelo filtro das editoras para produzirem a sua música e pelos media tradicionais para a promoverem. Hoje, com as novas tecnologias e a revolução digital, o artista pode ser o seu próprio produtor e usar as editoras como companhias de serviços. Isto transtornou o sector da música e o artista está novamente no centro.

Texto de Filipa Almeida

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