Miguel Horta e Costa: «Está no nosso ADN entregar um serviço integrado»
Nas palavras de Miguel Horta e Costa, vice-presidente da Havas Worldwide, a entrega de um serviço integrado potencia a eficácia da mensagem. «Nós somos focadíssimos em eficácia», garante o responsável da empresa que até aqui se apresentava com a designação Euro RSCG.
Texto Maria João Lima
Fotografia Pedro Simões
A intenção era conhecida desde Março e foi oficializada em Setembro. O grupo de comunicação Havas passou a apresentar duas marcas principais: a Havas Media (que em Portugal inclui as agências MPG, Arena Media Communications, Havas Digital e Havas Sports & Entertainment) e a Havas Creative, que inclui a Havas Worldwide, a Arnold Worldwide e outras agências criativas do grupo (como é o caso, em Portugal, da Fuel).
Como consequência, a Euro RSCG designa-se agora por Havas Worldwide, passando as suas unidades a chamar-se Havas Worldwide Portugal (publicidade), Havas Design+, Havas Worldwide Digital, Havas Experience e Havas Life. Foi ainda criada a marca umbrella Havas Digital, que é transversal aos negócios da criatividade e da media.
Miguel Horta e Costa, vice-presidente da Havas Worldwide em Portugal, explicou à Marketeer o que motivou estas mudanças e quais os desafios que o mercado enfrenta na profunda crise económica que o País atravessa.
Entre Março (quando foi anunciado que ia haver mudanças) e Setembro (quando foram concretizadas) o que se passou e como foi preparada a equipa?
Isto foi mais um renaming do que outra coisa. A Euro mudou de nome, ponto final. Houve algumas reestruturações internacionais, mas aqui em Portugal isto é uma mudança de nome. Não houve uma alteração de estrutura por causa disso.
A Havas tem dois braços principais: a Havas Media, que tem uma presença em Portugal há muitos anos com a MPG, a Arena e outras agências; e depois tinha a Euro RSCG, que fazia toda a parte de criatividade. Houve uma aproximação do braço de criatividade que se chamava Euro RSCG para o nome comum da empresa. Passou a haver o Grupo Havas, que tem dois braços: Havas Media e Havas Creative. Os dois braços participam numa espécie de entidade central chamada Havas Digital, onde estão as marcas digitais do grupo.
No fundo há uma maior integração entre a Havas Creative e a Havas Media?
Há uma aproximação da Euro RSCG em termos de nome ao resto do grupo. Há um esforço de fazer com que a oferta para os nossos clientes – que é o mais importante – seja mais coerente e seja reconhecido que há um grupo que tem uma oferta bastante completa e integrada.Há uma convicção de que a área digital deve estar no centro da nossa actividade. É uma convicção do grupo inteiro. Nós já implementávamos isto na nossa oferta aos clientes. Nas nossas pequenas agências, que depois constituem esta estrutura internacional, nós já trazíamos isso.
Em Portugal já temos a agência digital – que há uns anos era uma salinha que estava no canto do edifício – no centro das operações, cada vez mais fusionada com a publicidade.
Houve esse movimento também da parte da estrutura internacional. Os dois braços passaram a participar numa entidade chamada Havas Digital, que serve todo o grupo internacional.
A mudança foi desencadeada por os clientes não verem a Havas Media e a Euro RSCG como pertencentes ao mesmo grupo?
Não… Acho que as pessoas do meio sabem que pertencemos todos ao mesmo grupo. Claro que mudar o nome ajuda com certeza. Nós temos alguns clientes para quem é importante haver uma oferta integrada de criatividade e media, mas para muitos não. A maior parte nem sequer são clientes comuns. Fazem os seus concursos e elegem a sua agência de publicidade e de forma independente escolhem a agência de media. Mas num movimento que tem vindo a acontecer com o apertar dos orçamentos, alguns clientes pedem- nos para apresentar uma oferta completa.
Muda alguma coisa na maneira de trabalhar das agências na Havas, ex-Euro?
Não muda por causa do rebranding. Mas tem vindo a mudar. Já tínhamos vindo a fazer alguns movimentos desde há alguns anos. Tem sido gradual e agora com o rebranding aproveitámos para olhar para tudo e fazer uma análise, quase de balanço, para ver se as coisas estão a dar certo ou não.
Os nossos movimentos internos são sempre uma tentativa de antecipação ou acompanhamento de movimentos do mercado.
O mercado do lado do cliente movimenta-se e tem uma dinâmica e o que nós fazemos é estar focados, em todos os momentos, em oferecer o melhor serviço aos nossos clientes e ter a estrutura adequada para conseguir satisfazer as suas necessidades. Por exemplo, esta aproximação da agência de publicidade à agência digital é fruto disso.
No fundo é causada por uma vontade da maior parte dos clientes em ter essas áreas integradas. Temos vindo a aproximar as agências gradualmente ao longo dos últimos anos. Hoje temos já uma direcção comum. Temos as equipas criativas cada vez mais juntas e parte das equipas de contacto também já a funcionar desta forma. É uma tendência que não volta atrás.
A decisão de mudança foi internacional. O RSCG deixou de fazer sentido?
Dos nomes correspondentes ao RSCG [Bernard Roux, Jacques Séguéla, Alain Cayzac e Jean-Michel Goudard], Jacques Séguéla, que é um histórico criativo de França, é o único que se mantém. Portanto, o RSCG já não dizia nada a ninguém. Em Portugal a Euro RSCG era uma marca superconhecida. Somos líderes há 12 anos, toda a gente nos conhece dentro e fora do meio.
Em Portugal perde-se essa marca muito conhecida. Mas ganha-se outras coisas, como coerência!
Como está a ser comunicada?
O mercado de clientes em Portugal é muito pequeno. Se estivéssemos nos EUA tínhamos de fazer muito mais coisas para divulgar uma mudança destas. Aqui o mercado é pequeno. Todos os clientes souberam que isto aconteceu.
Falámos pessoalmente com todos os clientes [entre os quais estão Peugeot, Citroën, Banco Santander, Super Bock, Vitalis, Sociedade Ponto Verde, Reckitt Benckiser, Optimus, Turismo de Portugal] e com mais algumas entidades.
Fizemos uma campanha de publicidade e falámos com alguns meios. Mas a maior parte do nosso mercado soube da mudança e percebeu-a.
Quais as agências que têm?
Mantêm-se as mesmas. Mudaram de nomes. A Euro RSCG Publicidade passou a chamar-se Havas Worldwide Portugal, a Design passou a Havas Design+, a 4D passou a Havas Worldwide Digital e a Life passou a Havas Life. Foram essas as mudanças que houve nas agências. As pessoas mantêm-se. Não houve alterações.
Qual o peso de cada agência em termos de volume de negócio em Portugal?
A Publicidade continua a ser a maior, com um pouco menos de 50%. A seguir a Design, depois a Digital. Todas funcionam como unidades independentes. Todas têm CEO próprio e têm – apesar de isto se estar a esbater – equipas criativas e de contacto especializado próprias. Em certa medida vamos manter, apesar de haver aqui uma certa fusão. Cada uma destas agências tem vida própria, tem a sua carteira de clientes, o seu CEO. Todas vivem independentes umas das outras.
O que acontece paralelamente é que, quando é caso disso, e achamos que traz valor acrescentado para os nossos clientes, elas estão muito habituadas a trabalhar em coordenação porque nasceram já a trabalhar assim. Se há factor que nos diferencia mesmo é a nossa capacidade de pôr toda a gente a trabalhar em coordenação. E quando digo toda a gente digo Publicidade, Design, Digital, Eventos, Activação… Tudo. Isto parece uma coisa óbvia mas não é nada.
Porque o que acontece é que as propostas criativas quando nascem em sítios diferentes e depois são forçadas a serem coordenadas umas com as outras, o resultado não é o mesmo do que quando as coisas são criadas de forma central e depois declinadas para cada uma das áreas. Há uma coordenação muito mais forte.
Essa é então a vossa mais-valia?
É uma das mais-valias. Estamos muito habituados a fazer isso. Está no nosso ADN entregar um serviço completamente integrado, muito coordenado e ter as armas todas a disparar no mesmo sentido, a passar a mesma mensagem. A experiência diz-nos que isto potencia a eficácia da mensagem. Nós somos focadíssimos em eficácia. Estamos sempre a olhar para o investimento que o nosso cliente faz versus os resultados que obtém. Isto é uma obsessão da Havas.
Como reagiram os clientes à mudança de nome da ex-Euro RSCG?
Lindamente. A antiga Euro, agora Havas, construiu aqui uma reputação muito forte. Conseguimos construir uma empresa que, no fundo, é um sinal de excelência na nossa indústria. E podemos mudar de nome, fazer as mudanças que quisermos, que as pessoas reconhecem isso.
Hoje, quantas pessoas são na Havas?
Cerca de 200 entre Havas Worldwide e Fuel. A Fuel tem cerca de 50 pessoas.
A Fuel não está na Havas Worldwide.
Não. A Fuel sempre esteve um bocadinho independente. Reporta, como sempre aconteceu, à Havas. Faz parte do grupo, mas tem um posicionamento independente, como sempre teve.
Mas por que é que faz sentido dentro do grupo continuarem a ter duas agências de publicidade num país tão pequeno?
Todos os grupos têm agências independentes. O Grupo WPP tem, o Omnicom também…
Na Havas são apenas estas duas.
Sim. Mas o que aconteceu foi que a Fuel nasceu há uns anos para gerir conflitos de interesse internacionais… não eram nossos sequer.
Temos aqui [Havas Worldwide] a Peugeot e a Citroën, a Fuel tem a Volvo e a Jaguar. Enquanto havia Continente e Modelo, aqui tínhamos Continente, na Fuel tinham Modelo. Nasceu assim.
Mas o que aconteceu foi que a Fuel ganhou vida própria e começou a ganhar clientes e a desenvolver-se também…
E a roubar-vos clientes também… O Continente ficou com a Fuel.
(risos) Não foi roubar. Ninguém rouba nada a ninguém. Foi uma decisão pacífica. Faz parte de uma estratégia.
Que estratégia é essa? Ficar com as duas maiores agências do mercado?
A MediaMonitor não é o driver da nossa estratégia. Mas faz parte de uma estratégia.
Mas qual é a estratégia?
No caso do Continente – que foi o único caso – foi uma transição natural que foi feita. Quando houve a fusão das duas marcas Modelo e Continente, houve um período em que a marca ficou dividida entre as duas agências. O que resolvemos foi cada uma focar-se nas coisas que tinha nas mãos. Foi uma pura estratégia de divisão de uma carteira de clientes. Não fazia sentido a marca estar a ser trabalhada por duas agências. Decidimos que a Fuel passaria a estar focada naquela marca, que tem um volume de trabalho absolutamente louco.
No último ano do Continente na Euro, sabe quantos filmes fizemos? Mais de 500! Muitos deles são o mesmo filme com uma terminação diferente, mas cada um precisa de uma arte final, de uma bobina, de entrega de bobinas nos meios… Era impossível estarmos a trabalhar a marca dividida. Transferimos até membros das equipas que estavam aqui para a Fuel.
A nível internacional existe também a Arnold que, em Portugal, não durou muito tempo.
O que acontece é que a Arnold é uma rede de agências mundial. Era aquilo a que se chama um hub criativo, uma daquelas agências mais arrojadas, mais criativas… Só que nos EUA houve um repensar do conceito da Arnold, que passou a ser um tipo de agência diferente.
A Arnold hoje nos EUA é um híbrido entre agência de publicidade e consultora de negócios, à la McKinsey. Contrataram uma grande equipa de consultores de negócio que prestam serviços de consultoria. E depois apresentam soluções de comunicação.
Em Portugal está previsto ser relançada?
Não. Até porque em Portugal o mercado não está lá ainda. Já pensámos trazer este modelo para cá, mas ainda não tomámos decisão nenhuma.
No fundo é um modelo que vem dizer que a comunicação não é uma coisa à parte, faz parte de um negócio e deve estar integrada na estratégia global da empresa. É uma consultora de negócios e agência de publicidade que entrega depois o produto final, por isso é que poderia ser interessante trazer o modelo para Portugal.
O que mudou no mercado desde que chegou à publicidade em 2008, vindo de uma área bem diferente [banca de investimentos]?
Este mercado é muito co-relacionado com o contexto económico, que foi o que mudou realmente.
Houve um período em que o contexto económico se agravou, por volta de 2008, em que houve um lag entre essa situação e as agências ressentirem-se por reacção dos clientes.
Mas a partir de 2009 até hoje tem vindo a haver uma contracção claríssima do mercado. No fundo houve uma adaptação gradual ao longo deste tempo das empresas ao contexto económico. Essa adaptação traduziu-se em contracção dos orçamentos de comunicação, seja na vertente da compra de espaço de media, seja na vertente de criatividade. Sendo que as agências de criatividade pura acabam por se ressentir menos nos contextos de retracção do que as agências de media. As agências de media quando há uma contracção de mercado ressentem- se mais rapidamente e de forma mais abrupta do que as agências de criatividade.
Porquê?
Primeiro, porque a componente de criatividade nos orçamentos das empresas é menor do que a componente de media. Portanto, é mais fácil cortar na media. E a criatividade é sempre necessária para ser utilizada mesmo na pouca media. Há aqui uma maior resistência…
Quando isto vier a inverter também se vai sentir mais rapidamente e de forma mais abrupta (para cima) na media do que aqui. Sentimos que tem havido uma contracção de mercado em todas as vertentes. Quem lhe disser o contrário, ou está a brincar, ou está a mentir. Mas o que nós fizemos em reacção foi redobrar o nosso esforço comercial.
Tornámo-nos numa agência muito focada no new business e começámos a olhar para mercados internacionais.
E que mercados internacionais são esses?
Por força da posição internacional do Ricardo [Monteiro] nós já temos vindo a colaborar com agências no Brasil e em Espanha. Sempre que essas agências estão em situações que precisam da nossa ajuda nós começámos a ajudá-las muito mais. Temos feito trabalhos no Brasil e em Espanha.
Depois o que fizemos foi atacar mercados em que não estávamos e que através de contactos aqui conseguíamos chegar facilmente, como, por exemplo, Marrocos, Angola e Moçambique.
Quais os clientes que estão a trabalhar nesses países?
Em Marrocos fizemos um trabalho enorme com a Méditel. Fizemos o desenho das lojas da Méditel, que é uma das maiores operadoras de telecomunicações em Marrocos. Em Angola estamos a trabalhar com o Banco Kwanza, que é um banco de investimentos, e fizemos tudo desde a marca, o site, intervimos nas instalações, fizemos o evento de lançamento da nova marca do banco, todos os documentos (relatórios e contas, brochuras).
Temos trabalhado bastante com eles e com o Governo angolano. Em Moçambique ainda não fechámos nada, mas temos óptimas perspectivas. Diria que espero ter novidades nos próximos tempos quanto a Moçambique.
No ano passado ganhámos um concurso grande no Reino Unido. A Sociedade Ponto Verde faz parte de uma rede de empresas similares pela Europa toda, chamada Pro Europe. Através do nosso cliente Sociedade Ponto Verde fomos a Inglaterra a um concurso. Concorremos contra agências inglesas. Foi um concurso bastante grande, que nos ajudou a equilibrar as contas.
Têm equipas em países como Angola, Marrocos ou Moçambique?
Não. Até agora tem sido tudo feito a partir de Portugal. Muitas vezes até a pedido dos nossos clientes de Angola, que preferem que nós tenhamos a estrutura cá do que lá. Porque é mais fácil guardar confidencialidade à distância. E hoje em dia nós conseguimos trabalhar de forma remota.
Temos é que ir lá bastante, claro. Moçambique já é um mercado diferente. A cultura é completamente diferente e a pergunta sobre qual é a nossa estrutura lá aparece sempre.
Por enquanto não temos lá pessoas, mas se começarmos a trabalhar com clientes há-de haver lá uma estrutura com certeza. E reportará a Portugal.
Quanto é que o negócio internacional representa no volume de negócio?
Tem peso sobretudo para compensar alguma contracção de mercado em Portugal.
Conseguiram manter o volume de negócio estável desde 2008?
Não. Isso ninguém conseguiu no mercado.
Algumas das áreas até melhoraram. Como somos um grupo um bocadinho heterogéneo, há agências que se ressentem mais nestes períodos do que outras. O que temos conseguido fazer é compensar alguma da contracção em Portugal com esses mercados onde os trabalhos são grandes e as margens também são muito maiores.
E o que nos espera no futuro?
É muito difícil fazer previsões.
E como se estão a preparar para isso dentro do grupo?
Temo-nos vindo a preparar desde 2008 quando percebemos que ia haver uma contracção grande de mercado. Tomámos medidas de contenção. O que vem aí é uma incógnita.
O que prevejo, e acho que é consensual, é que o próximo ano vai ser muito difícil para toda a gente. Todas estas medidas de austeridade causam uma reacção imediata, que é a retracção brutal do consumo. Há um multiplicador nesta equação que faz com que a retracção do consumo seja muito maior do que as pessoas estavam à espera, não só pelo efeito da austeridade, que faz com que esse efeito seja imediato, mas pela consequência da enorme incerteza que as pessoas têm relativamente ao futuro.
As pessoas não gastam só porque não têm dinheiro porque deram mais ao Estado, não gastam também porque não sabem o que vem aí e têm medo. E isso é muito mais difícil de contrariar, mais do que a própria austeridade. No dia que venham a baixar impostos (nunca vi isso acontecer na minha vida), nós não vamos voltar aos níveis de consumo que tínhamos antes porque as pessoas estão receosas. É difícil restaurar os níveis de confiança.
Quanto é que estão a cair os orçamentos de publicidade dos clientes da Havas Worldwide?
Face ao ano passado, as quedas nos orçamentos de criatividade rondarão em média 10%.
Isso implicou redução de pessoas?
Não temos feito despedimentos, mas temos chegado a acordos com algumas pessoas e temos vindo a reduzir já desde 2008. Face a 2008 temos menos 15 pessoas.
Curriculum
Idade
39 anos
Formação
Gestão de Empresas
Livro
“História de Israel”
Música
Thievery Corporation
Filme
“Out of Africa”
Hobbies
Equitação e golfe