Inteligência Artificial: presente envenenado ou game changer?
Por Tânia Tadeu, directora da agência Taylor
De todas as tendências que já se fala para 2020, no que diz respeito às estratégias de Relações Públicas (RP) existe uma que realmente me chama à atenção, talvez porque efectivamente a sua implementação e a importância que lhe é dada ainda não seja uma realidade na maioria das agências de comunicação no nosso país. Falo da Inteligência Artificial (IA) e da forma como afecta ou afectará o trabalho dos consultores.
O universo Big Data, com todo o acesso aos dados que temos hoje na internet, contribuiu sem dúvida para fomentar a “loucura” que estamos a viver em torno da IA e a área da comunicação, nomeadamente das Relações Públicas, não é excepção.
Provavelmente, a primeira coisa que nos vem à cabeça quando falamos de IA é o medo intrínseco da substituição, que deixemos de ser úteis, capazes e eficazes, que se torne uma luta inglória entre as nossas valências e as tecnologias capazes de executar tarefas específicas tão bem quanto, ou até melhor, que nós humanos conseguimos.
Ah e tal, executam melhor as tarefas, mas onde fica a emoção e a criatividade? Aquela improvisação que nos salva no último instante? A capacidade de antecipação? A relação que vamos construindo com os jornalistas e os influenciadores digitais? Aquele feeling de que há algo que não está bem, que o cliente não está satisfeito, que aquele artigo não vai sair como gostaríamos?
Pois bem, vamos tentar analisar o real impacto da IA nas agências de comunicação, nas estratégias de RP e nos próprios profissionais e de que forma pode afectar e contribuir para a evolução deste sector:
1 – Maior rapidez no poder de decisão
Antes de mais, a IA aumenta o nosso poder de decisão, diminuindo as incertezas e fundamentando as escolhas dos consultores de RP nos dados que agrega e disponibiliza. Dados esses recolhidos e analisados de forma bem mais rápida e sem tanta propensão ao “erro humano”, dotando assim os profissionais de informação útil para fundamentar e melhorar o seu trabalho.
Certamente já ouviram falar de ferramentas como o TrendKite, Swonkie ou Hootsuite, todas elas plataformas digitais que aumentam precisamente o nosso poder de conhecimento e decisão. O TrendKite assume um interesse especial, pois, através da IA, coloca as RP num outro patamar, agregando numa única solução integrada a monitorização de media e influenciadores, analytics, divulgação junto dos jornalistas, gestão de influenciadores e inteligência social.
Uma imensidão de dados que permite, entre muitas outras coisas, seleccionar os jornalistas e influenciadores mais impactantes face aos objectivos, análises temáticas exclusivas, estimar o ROI de iniciativas de RP, segmentando mensagens, publicações e target com base em insights do público, ou medir o impacto com relatórios precisos e com múltiplas análises… Basicamente, integra o impacto de earned media no marketing, reafirmando a importância das RP nas estratégias de comunicação;
2 – Aumenta a capacidade de definição e adaptação
Essa informação dá-nos uma maior capacidade de definição e adaptação das campanhas e acções de RP, desde a identificação do tipo de abordagem aos media e influenciadores, aos temas trendy, canais a usar e os mais eficazes, quais os conteúdos que geram mais interesse e a quem… Aumentando, sem dúvida, a taxa de sucesso das mesmas. Isto é, claro, se tivermos a capacidade crítica para interpretar toda a informação e construir em cima da mesma a estratégia e os planos das nossas campanhas;
3 – Detectar oportunidade, prever e minimizar crises
A IA permite detectar e analisar vários factores diferentes ao mesmo tempo, disponibilizando dados a uma velocidade sónica que nos permite, por um lado, identificar tendências e oportunidades e, por outro prever, potenciais ameaças na direcção dos clientes. Dá-nos, assim, tempo para preparar planos de acção mais eficazes. Por exemplo, se existir um pico significativo nas notícias com referências negativas às TVDE, as associações de táxis podem perceber que é a altura ideal para potenciar as suas mensagens e reforçar o seu posicionamento. Ao mesmo tempo, podem e devem adaptar o seu plano de crise, já que rapidamente estas notícias podem proliferar para o seu lado;
4 – Time is Money
Quantas vezes pensamos “tanto tempo perdido com tarefas tão básicas”? O sonho de qualquer profissional é ganhar tempo para se dedicar às questões que realmente são importantes e desafiantes. Com a IA, simplificar tarefas é, de facto, possível com a automatização das mesmas. Falamos da criação e actualização de contactos, transcrição de áudio e vídeo em texto, automatização do e-mail, por exemplo na sua organização, resposta ou follow-up, monitorização e relatórios de media e digital ou até mesmo na identificação automática de media lists face aos temas abordados nos comunicados de imprensa e respectivo envio;
5 – Conteúdos à medida para OS influenciadores
A análise rápida que a IA efectua sobre a informação pública, disponível nas redes sociais, permite-nos determinar um nível cada vez mais “real” de influência, não apenas baseada em números, mas em factores como o engagement e tipo de relação e lealdade dos seguidores para com os influenciadores. Ou seja, saber quais são os verdadeiros influenciadores a alcançar, aqueles que se identificam realmente com a nossa marca e que têm os seguidores que se sentem mesmo impactados por eles, que comentam, que partilham e que efectivamente compram. Por outro lado, os dados fornecidos pela IA podem ajudar-nos a alcançar com maior precisão o nosso público, criando e direccionando o conteúdo certo, tendo em conta as suas necessidades, interesses e desejos;
6 – Influência directa e sem intermediários
Um outro aspecto, talvez um pouco mais polémico, é o facto de que com a interpretação da big data ser possível aos profissionais de RP passarem a falar e a influenciar directamente o target final, eliminando intermediários, como media e influenciadores, e passando assim a trabalhar com inúmeros canais directos. Trata-se de uma verdadeira mudança: o público-alvo deixa de ser um grupo de pessoas e passamos a poder atingir individualmente e personalizadamente cada pessoa. É não ter que esperar que os interessados pelo nosso produto ou marca leiam notícias ou visitem os seus influenciadores favoritos para saberem das novidades.
Lógico que outras questões se levantam – a real função dos media, aumento de fake news, limites da privacidade ou a perda de noção do que é “real“, que obviamente enfraqueceria o estrelato dos influenciadores. Tem coisas boas e muito más… O que será de nós se só recebermos a informação que nos dão porque influenciam os nossos feeds diários de informação no e-mail, Google, Facebook, Instagram, Twitter, etc.? Bem, um tema certamente para um outro artigo.
Inteligência artificial: presente envenenado ou game changer?
Sim, provavelmente o medo da substituição não faz sentido e estamos a hiperventilar sem motivos. Pelo contrário, a IA não só não vai diminuir a importância do trabalho dos consultores de Relações Públicas como irá contribuir para melhorar a sua performance e eficiência por todos os aspectos falados.
O desafio está lançado para 2020. Dotar as agências e os profissionais de IA nas suas rotinas e processos, não por ser apenas mais uma trend mas efectivamente pelo carácter útil e extremamente precioso no tempo que se ganha, na informação que reúne e dota. Basicamente, no PODER que dá a quem perceber a sua real importância.
Diria que a grande tendência é continuarmos ávidos e atentos às tecnologias de IA, testar as mesmas e aceitar que 2020 pode ser um ano de game changer em que as IA irão ter um contributo decisivo.