Entre resultados e desafios para 2017

Durante o pequeno-almoço debate da revista Marketeer, dedicado ao universo do turismo, os intervenientes analisaram os desafios e problemas que se colocam ao sector.

Texto de Sandra M. Pinto

Fotos de Pedro Simões

O turismo nacional tem vindo a acolher um conjunto de novos players que conseguem trazer uma nova dinâmica ao sector, a qual vem quase sempre acompanhada de algumas polémicas. Perante esta dicotomia, e a conclusão final de que há espaço para todos, precisamos é de saber geri-lo. Um dos desejos manifestados pelos participantes é que as facilidades dadas aos novos players sejam extensíveis aos que já actuam no mercado, para que as condições sejam iguais para todos. Ou então, «que os novos players se ajustem às regras que já vigoram, de modo a não existir um desfavorecimento relativamente ao trabalho desenvolvido pelos players, digamos, mais antigos e tradicionais», observação que mereceu a concordância de todos.

A dificuldade será perceber e ter a absoluta certeza de que todos estão a prestar os mesmos serviços dentro dos mesmos moldes, «o que nem sempre é fácil, aliás, é praticamente impossível de se conseguir», pelo que importa balizar as actividades para que, perante o mercado, todos se apresentem com iguais oportunidades de crescimento e fortalecimento. Encontrar um ponto de equilíbrio entre as pretensões de todos os players é claramente o objectivo a atingir. «Vejamos, por exemplo, a aprovação das novas taxas aplicadas ao alojamento local, a qual vai terminar com uma série de pseudovantagens para aqueles que exercem a actividade de uma forma, digamos, menos profissional».

Na opinião da mesa, esta regulação vai trazer uma paridade de oportunidades com evidentes proveitos para todos os players, «pois, não nos podemos esquecer nunca que estamos perante dois tipos de serviços, cuja base é a mesma, mas onde a forma como a actividade é exercida é completamente diferente. Então, perante isto, a legislação não pode ser a mesma para todos, antes tem de existir um meio-termo entre as pretensões de ambos, de forma a evitarmos a todo o custo a concorrência desleal». A isto acresce a segurança, «aspecto por vezes bastante descurado por parte do alojamento local, perante o qual não existe uma fiscalização, pelo menos da mesma forma como a que é exercida na hotelaria regular. Obviamente que esta é uma tarefa complicada, quando só em Lisboa temos 20 mil camas, mas a verdade é que é preciso alterar esta situação». Todos concordam que é preciso existir um controlo relativamente às pessoas que reservam estadias através do alojamento local, seja no que diz respeito ao seu número e à sua proveniência, entre outros aspectos. A esperança de todos reside em que «a situação seja efectivamente alterada e que o alojamento local seja chamado à responsabilidade de, digamos, prestar contas, pagando impostos e dando maior atenção a temas importantes, como o da segurança».

Este foi um dos temas em cima da mesa e que serviu de ponto de partida à discussão durante o pequeno-almoço, que teve lugar no Hotel Dom Pedro Palace, em Lisboa, e onde estiveram presentes: Paulo Monge (director de Vendas Sana Hotels), Rogério Cardoso (director do International Student Identity Card), Diamantino Pereira (director da Agência Abreu), Álvaro Covões (director da Everything is New), Timóteo Gonçalves (General Manager da Halcon Viagens), Isabel Barata (administradora do grupo SATA), Agustin Macedo (Hospitality Sales Director Sonae Turismo) e António Loureiro, director-geral da Travelport.

Com a finalidade de se alcançar um debate mais aprofundado por parte de todos, foi decidido que nenhuma das intervenções seria atribuída directamente no texto.

A sustentabilidade do crescimento

Todos os intervenientes declaram que o ano de 2016 trouxe excelentes resultados para as suas actividades, o que, no cômputo geral, se revelou, novamente, em excelentes resultados para o sector do turismo. Mas, será este crescimento sustentável? Será que 2017 vai ser ainda melhor do que o ano que agora está prestes a terminar? A opinião é unânime e a resposta é positiva, mas «será o crescimento a dois dígitos real? A verdade é que não sabemos quantos turistas visitam Portugal, sabemos o número de turistas que chegam de avião e que desembarcam nos aeroportos, mas o número total não se sabe, andamos à volta de estatísticas».

Concordando os intervenientes com esta opinião, houve quem dissesse que o crescimento é real, não sendo a dois dígitos, será a um dígito, o que é de facto um crescimento palpável do sector do turismo nacional. «Concordemos todos no crescimento a dois dígitos, o facto é que se nada de extraordinário acontecer nos próximos dois anos, esse crescimento será para manter». A dúvida assenta em perceber se ele é sustentável, além dos dois anos ou não, tendo sido dado como exemplo o Porto, onde são esperadas novas aberturas, com predominância para os 5 estrelas, estando previstos sete novos hotéis desta categoria. A resposta não se fez esperar, com a maioria dos participantes a concordar em que «vai acontecer uma altura em que a oferta e a procura se vão encontrar, mas não será de mais este número de aberturas?». Fica a questão, com a achega de que todos são da opinião que, em determinadas situações, e, no caso da cidade Invicta, a oferta de camas ainda é escassa.

Mas, mesmo em Lisboa há situações em que o número de camas se revela insuficiente, havendo mesmo a necessidade de descentralizar, «e ainda bem, pois esse é mesmo um dos principais desafios que se coloca ao turismo nacional. É prioritário conseguir descentralizar, pois Lisboa está óptima, o Porto também e o Algarve mantém-se com bons índices, o resto do País precisa de mais atenção».

Concordando todos que os empresários nacionais têm vindo a desenvolver um extraordinário trabalho ao nível do investimento no sector, é por de mais evidente que «aquilo que hoje oferecemos aos turistas que nos visitam é muito diferente do que lhes era oferecido há 20 ou 30 anos, a mudança para melhor é muito grande, seja nos hotéis ou nos restaurantes. Isto é muito importante, pois o actual turista de lazer já não se satisfaz apenas por ter um bom quarto de hotel. No fundo, tudo conta no resultado final da experiência que se teve, se foi boa ou não. E hoje o que proporcionamos a quem nos visita são boas experiências, de qualidade».

Simultaneamente, foi referido que, para lá do sector do turismo, o País mudou, «as estradas e os acessos são melhores, o património apresenta-se recuperado e bem preservado, apesar das tremendas dificuldades, o que faz com que hoje o produto Portugal esteja efectivamente muito bom».

Tudo isto fundamenta a crescente procura pelo destino, realidade que todos acreditam se vai manter e até crescer nos próximos anos. É interessante, por exemplo, observar como a origem de quem nos visita mudou, «sendo que hoje o boom por parte dos turistas franceses é por de mais evidente, o que se vê bem nas lojas de luxo da capital», resultado da abertura das novas rotas e da entrada no mercado das companhias aéreas low cost.

Portugal não é só Lisboa e Porto

Tudo certo quanto às principais cidades, mas e o resto do País? «Conteúdos, é tudo uma questão de conteúdos», defendem os participantes, «só gerando interesse podemos conseguir levar mais pessoas a conhecer outras zonas portuguesas». Tal afirmação levou a qua se ouvisse defender que conteúdos já existem, acontece que «estão subaproveitados e pouco divulgados numa relação directa com o turismo e o incremento do número de visitantes».

Regressa à mesa a palavra descentralizar, «tal como Lisboa não é só o Chiado ou o Príncipe Real, Portugal não é só Lisboa ou Porto. Descentralizemos e ponhamos os turistas a conhecer a nossa história, a nossa cultura e o nosso vastíssimo património».

Mas e o tal excesso de turistas de que alguns falam, será que ele existe? Peremptoriamente, a resposta de todos foi não, «enquanto se conseguir fazer a reserva de um restaurante no próprio dia para jantar, não há excesso de turistas».

Com os stopovers das companhias aéreas, nomeadamente a TAP, Portugal ficou a ganhar, pois, sendo algo que algumas companhias estrangeiras já o fazem desde há alguns anos, a verdade é que, com o incremento de programas como este, quem não tinha pensado em visitar Portugal passa a ponderar fazê- -lo, «o que em tudo só nos pode beneficiar, pois, apesar de poderem ser estadias de uma noite, o que pode implicar algumas questões aos hoteleiros, a verdade é que são clientes que de outra forma não ficavam em Portugal, pois nem sequer tinham curiosidade em ficar. Com este género de programas tudo isso muda, e muitos turistas equacionam mesmo voltar ao nosso País com mais tempo».

Para lá da hotelaria

O crescimento do sector não se fica pela universo da hotelaria, pois o mundo das agências de viagens também tem vindo a ganhar com o incremento de Portugal enquanto destino turístico de referência, não apenas na Europa mas no mundo. «A realidade é que não são só os estrangeiros que nos visitam, como o português continua a viajar de uma forma cada vez mais regular. O que está a influenciar a procura não é a capacidade aquisitiva das pessoas, mas sim o facto de termos uma oferta muito maior e alargada por parte das companhias aéreas a preços cada vez mais competitivos de e para quase todos os destinos». Isto funciona em ambos os sentidos, «sendo esta uma das razões pela qual cada vez mais estrangeiros nos visitam».

Mas, e o turismo interno? Será que também ele tem crescido? Como foi referido «o resto do País vive muito do turista nacional». A realidade parece demonstrar que sim, apesar de «o turista nacional se apresentar muito racional na compra, olhando com muita atenção para as oportunidades, as quais, a este nível, são colocadas no mercado pelos hotéis, muitos deles pequenos hotéis familiares localizados no interior do País».

A afirmação levantou uma opinião que defende que «o negócio do turismo interno fugiu das agências e dos operadores para passar directamente para o hotel, facto que leva a que, a partir do momento em que se inflaciona o preço em determinadas regiões, como o Algarve, tal vai beneficiar as pequenas unidades hoteleiras de outras regiões, acabando por levar à tal descentralização dos turistas com evidentes ganhos para determinadas regiões, por exemplo, do interior do País».

Foi apresentado o caso de Sesimbra, verdadeiro caso de sucesso da hotelaria da região. Esta realidade é igualmente testemunhada por um dos players, com a afirmação de que as promoções das agências para o mercado interno, que se apresentam agora para serem usufruídas no próximo Verão, estão a ser vendidas a um bom ritmo. «Devíamos estar a vender agora o Inverno, mas a verdade é que já estamos a vender o ano que vem, o ano de 2017 está já a ser contemplado nas brochuras agora apresentadas aos clientes.» Além do Algarve, a realidade tem vindo a demonstrar que também em Lisboa e no Porto os meses de Julho e Agosto têm uma forte componente de turismo interno, pois «chegamos a encher algumas unidades apenas com turistas portugueses», comentou-se à mesa.

Conteúdos: valores a incrementar

Todos são unânimes em concordar no valor dos conteúdos, «sejam exposições, concertos, festivais, conferências ou outros». Perante as dificuldades em manter o número de visitantes durante a época chamada baixa, são também eles que podem e devem servir para alavancar o número de turistas. «De Novembro a Março só vamos conseguir manter o crescimento se criarmos conteúdos. Mas, conteúdos com interesse, que despertem a atenção das pessoas, que captem a sua curiosidade e que as façam sair de casa. É essencial ter em atenção que há conteúdos de Verão e outros de Inverno», afirmam os participantes.

Foi levantada a questão de que em época baixa os aeroportos não atingem a sua capacidade máxima, «ao contrário do que sucede na época alta, pelo que aqui o Estado pode desempenhar um papel fundamental, ao incrementar a abertura de novas rotas nestes meses, digamos, mais parados». A verdade é que mesmo nas rotas regulares operadas todo o ano, também se sente alguma quebra na época baixa, pois «as companhias aéreas voam quando há clientes, ou seja, se houver procura há ligações aéreas e há aviões, mas isto desde que exista procura. Se ela não acontece evidentemente que se verifica uma quebra».

A realidade é que, representando uma fatia cada vez maior ao nível do PIB nacional, o turismo está e é expectável que continue em grande crescimento.

Artigo publicado na edição n.º 244 de Novembro de 2016.

Artigos relacionados