Educar pessoas e treinar algoritmos: O novo modelo de alta performance na gestão de marketing

Por André Zeferino, consultor em Estratégia de Marketing, autor dos livros “Digital Marketing Analytics” e “Marketing Mindset” e co-autor de “Marketing Futureland”

É um tema desafiante e inevitável para as organizações que estão mais avançadas no seu trabalho de casa perante o exercício de perceberem onde começam e acabam os benefícios de ambas as forças de trabalho – a humana e a tecnológica – a trabalharem juntas num modelo híbrido.

Na realidade, este é um cenário que as empresas sempre enfrentam quando incorporam novas tecnologias que produzem impacto nos métodos de trabalho implementados.

Com os avanços mais recentes da inteligência artificial (IA), o tema do artigo foca-se fundamentalmente nos seguintes pontos críticos:

• Faz sentido continuar a educar pessoas para operarem ferramentas que já são hoje instrumentalizadas com maior eficiência pela IA?

• Quando investir no treino dos próprios algoritmos para que estes aumentem ainda mais a competitividade do negócio?

• Como conjugar as capacidades entre pessoa-máquina criando um modelo híbrido de elevada performance?

O peso da IA nas ferramentas de marketing

O ritmo de incorporação da IA nas ferramentas de marketing tem vindo a aumentar consideravelmente nos últimos anos, transitando da tradicional componente de ingrediente (do tipo “intel inside”) para um interface aplicacional interactivo, recebendo inputs dos utilizadores.

Esta última vertente trouxe maior popularidade à importância da IA, originando picos de adopção exponencial, pelo facto de proporcionar um contacto verdadeiramente próximo com os benefícios e vantagens da tecnologia, aumentando a democratização do seu uso e despertando no mais comum dos utilizadores um sentimento imediato de elevada conveniência.

Actualmente existem inúmeras ferramentas e tarefas de marketing, sobretudo na vertente digital, já executadas por IA em diversas capacidades:

• E-mail marketing: para automatizar campanhas, segmentação de listas, personalização de conteúdos e optimização de tempos de envio;

• Gestão de conteúdos: para criar artigos, descrições de produtos e publicações em diversos meios, com supremacia na geração de grandes volumes de conteúdos num curto espaço de tempo;

• Chatbots e assistentes virtuais: para suporte, envolvimento e geração de leads;

• Gestão de redes (e media) sociais: para agendamento e optimização dos períodos de publicação, sugestões de conteúdo, análise de sentimento e respostas frequentes;

• Optimização dos mecanismos de pesquisa (SEO): insights para pesquisa de palavras-chave (tendências e oportunidades), optimização de conteúdo e análise de backlinks;

• Publicidade pay-per-click (PPC): gestão e ajuste de bids, optimização de anúncios e segmentação de públicos em campanhas;

• Personalização: recomendações de produtos e campanhas com base no comportamento e nas preferências dos utilizadores;

• Testes A/B: automatização dos processos de teste, facilitando a optimização de variados elementos em conteúdos, meios e campanhas;

• Reporting e análise predictiva: geração de insights acionáveis a partir de volumes consideráveis de dados, prevendo o comportamento do cliente (jornada, rotatividade, etc.) e pontuação de leads.

O grau de adopção da IA varia entre empresas e indústrias, mas há uma certeza universal – considerando a dinâmica da própria indústria Martech, novas ferramentas fortalecidas pela IA vão continuar a surgir e a criar oportunidades crescentes de mudança instrumental na gestão das funções de marketing.

Qual é o momento-chave para incorporar o uso da IA nas tarefas de marketing?

Continuar ou deixar de formar pessoas no uso de ferramentas com práticas manuais consideradas totalmente obsoletas face às capacidades da máquina exactamente para a mesma tarefa não é um processo simples, desde logo pelo respeito pela componente humana (contexto ético) que não pode ser ultrapassada sem uma abordagem honesta, transparente e profissionalmente rigorosa.

Esta decisão deve ser orientada por uma análise profunda e casuística, considerando o seu alinhamento com os objectivos do negócio e atendendo aos vários cenários neste processo – reforço da capacidade humana, complementando-a, ou a sua substituição total.

Neste âmbito, existem factores a ponderar, quer de natureza operacional, quer estratégica, que envolve a complexidade das tarefas; os benefícios potenciais da IA bem como os seus limites e ainda os recursos disponíveis:

• Retorno do investimento: avaliar se o tempo, o esforço e os recursos necessários para treinar a máquina justificam os benefícios esperados em termos de eficiência, precisão e economia de custos (custo-benefício entre IA e trabalho manual);

• Complexidade da tarefa: a complexidade de algumas tarefas pode exigir um julgamento, intuição ou criatividade de natureza humana;

• Tarefas repetitivas e demoradas: são fortes candidatas à automação para serem executadas de forma consistente, rápida e sem fadiga, libertando os recursos humanos para um trabalho mais criativo e estratégico;

• Escalabilidade: amplia a capacidade da tarefa para lidar com maiores volumes de dados e operações em regime 24/7, sem haver necessidade de aumentar o trabalho humano para o efeito;

• Consistência e precisão: se a tarefa exigir um alto grau de precisão, a IA poderá reduzir o risco de erros humanos, seguindo regras e padrões predefinidos de forma consistente e em conformidade com protocolos específicos;

• Análise intensiva de dados: capacidade extrema na análise processual de dados, padrões e insights, inferindo diagnósticos e conclusões de vária ordem (investigacional, investimento, etc.);

• Disponibilidade de dados: a automação depende de dados históricos suficientes e disponíveis para treinar modelos de machine learning (ML) de forma eficaz;

• Disponibilidade tecnológica: avaliar se o momento actual das tecnologias de IA e ML estão optimizadas para serem aplicadas em tarefas específicas, já que estas podem exigir capacidades de IA mais avançadas e não disponíveis;

• Considerações éticas e legais: avaliar se as iniciativas de IA estão alinhadas com princípios e directrizes éticas e legais.

O treino dos algoritmos

Treinar algoritmos de IA para operar ferramentas de marketing envolve uma combinação de elementos entre definição de metas, preparação de dados, engenharia de recursos, técnicas de ML e uma optimização interactiva e recorrente para produzir resultados com um impacto efectivo.

Estes modelos são treinados periodicamente para que se adaptem às mudanças nas dinâmicas de marketing e estejam alinhados com as estratégias e os objectivos do negócio, passando a ser considerados novos activos de valor acrescentado.

Este investimento pode levar a iniciativas de marketing mais eficazes e que melhoram as experiências do cliente, aumentando a rentabilidade das operações e proporcionando às marcas uma vantagem altamente competitiva nos respectivos mercados.

Estima-se que esta tendência de formar e treinar algoritmos de IA para operar ferramentas de marketing continue à medida que o seu valor e as vantagens competitivas são reconhecidas e comprovadas.

O modelo híbrido de elevada performance

A partir do momento em que determinadas ferramentas de marketing são geridas por modelos de IA, torna-se fundamental assegurar e garantir que os profissionais de marketing ganhem competências sobre como a IA funciona dentro do contexto aplicacional das ferramentas, e sobretudo em como colaborar de forma eficaz com as mesmas – neste caso, educar e treinar pessoas e máquinas para trabalharem de forma colaborativa.

Os profissionais de marketing são necessários para definir estratégias, produzir criatividade, interpretar os insights gerados pela IA e garantir que todo este processo esteja alinhado com os valores e objectivos da marca (supervisão ética e responsável).

A implementação de modelos de IA em ferramentas de marketing requer, desejavelmente, uma conjugação de experiências multidisciplinares a funcionar em estreita colaboração entre profissionais de marketing, cientistas de dados e especialistas de IA numa simbiose funcional bem-sucedida.

Todas estas circunstâncias irão ter impacto futuro nos modelos formativos actuais sobre ferramentas de marketing – e muito em particular nas ferramentas digitais aplicadas na gestão de marketing –, observando o foco de questões colocadas oportunamente no início deste artigo.

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