Diz-me a verdade, foste tu que escreveste?
Por Ana Luísa Rego, especialista em comunicação e marketing
Escrever qualquer um escreve.
Escrever bem e ser original é outra coisa.
Mas copiar… isso está ao alcance de todos.
Não fui à missa nesse domingo, mas fiz a minha parte de missão. Era final de tarde e numa conversa servida com bolo de aniversário pedem-me uma “ajudinha rápida”.
Uma associação local precisa de um donativo específico em géneros, mas não sabe como consegui-lo. Em menos de 15 minutos e uma chamada pelo meio, consegui montar uma estratégia na minha cabeça. Em uma hora e com ajuda da AI, consegui expandir essa estratégia e ainda redigir (sem revisão) os next steps, e-mails de contacto e agradecimento. Para mim, que faço isto há mais de 12 anos, foi canja. Para quem recebeu este banho de informação, foi algo que demoraria dias ou semanas e nunca seria tão estruturado.
Não o fiz sozinha, é certo. Usei o Chat GPT, como faço muitas vezes ao longo dos meus dias de trabalho. Sou da opinião que dominar as ferramentas de AI dá um boost ao nosso desempenho e permite-nos trabalhar de forma mais iInteligente e rápida. Mas também partilho da opinião do Nuno Jerónimo, founder and Creative partner na agência O Escritório, quando diz que precisamos de chegar a sítios onde o computador não chega, porque é aí que está a nossa mais-valia. Se for para repetir tudo o que a máquina faz – ou seja, o que já existe – não estamos a acrescentar nada nem a ser necessários.
A mediocridade e o razoável não me servem. A vertente humana, principalmente num contexto profissional, tem de trazer mais, tem de ter a habilidade de se superar e, acima de tudo, trazer a criatividade, a originalidade e emoção para o que a máquina já faz como básico.
É por isso que para mim é cada vez mais que estranha a quantidade de conteúdos que circulam e que são claramente fabricados pela máquina, mas assinados como sendo gerados pelas pessoas, sem que elas lhes tenham acrescentado valor. Também me estranha que isso aconteça em meios de comunicação e que profissionais de diferentes áreas os veiculem como conteúdos de opinião originais. Estranho ainda mais que considerem que os leitores não reconheçam as suas origens.
A estrutura e o modelo de apresentação do texto sempre iguais. O ritmo das frases e dos parágrafos martelados e fabricados em chapa. Gatilhos de transição entre o texto pouco coesos ou escolha de palavras é incomum. Textos tendencialmente muito genéricos e pouco profundos. Este é o formato. O conteúdo, não sendo completamente desprovido de sentido e valor, é muito mediano.
Para quem se formou em jornalismo, a originalidade dos textos e a citação das fontes de informação é uma lei intocável.
Sabem aquela indicação que vem no final dos textos sobre o acordo ortográfico, que por exemplo os media e o mercado livreiro passaram a disponibilizar? Será que o futuro (já presente) da honestidade intelectual vai obrigar a que seja identificada a origem dos textos?
Para o caso, fica já a minha.
Composição do texto: 100% humano; 0% AI.