Digital cresce mas media tradicionais são fundamentais
O digital tem um papel cada vez mais importante na comunicação das empresas, respondendo, em alguns casos, por mais de metade do orçamento. Mas os media tradicionais continuam a ter relevância, especialmente a nível estratégico.
Texto de M.ª João Lima, M.ª João Vieira Pinto e Rafael Paiva Reis
Fotos de Paulo Alexandrino
Não se pode falar de comunicação sem o digital. Este meio é uma das formas preferenciais das marcas comunicarem com os seus clientes, merecendo, no caso de algumas, cerca de 50% do budget de comunicação. Mas isso não irá ditar o fim da publicidade multiplataforma, sendo necessário o seu complemento enquanto new media com os meios tradicionais. Este foi um dos tópicos abordados no primeiro Fórum de Comunicação da Marketeer, um almoço que contou com a presença de Anabela Silva (BP), Catarina Zagalo (Deloitte), Cristina Tavares (Fidelidade), Cristina Viegas (RTP), Filipa Remígio (Artsana), Frederico Paiva (Samsung), Leonor Dias (Vodafone), Luís d’Eça Pinheiro (Brisa/Via Verde), Miguel Salema Garção (CTT), Nuno Ferreira Pires (Pestana) e Nuno Pinto de Magalhães (Central de Cervejas).
O digital é visto como uma das formas de chegar a targets que, de forma tradicional, não seria possível, permitindo uma relação directa com os clientes e, acima de tudo, personalizada. Mas ainda falta optimizar a estratégia de actuação a este nível. «Há equipas que estão habituadas a fazer campanhas 360o: mupis, spot de rádio e de televisão. Mas o spot de televisão acaba por ser exactamente igual no digital. E há que mudar a mentalidade. Inclusive, há campanhas idealizadas para digital que, perante o seu sucesso, foram adaptadas para televisão. E isto representa exactamente o oposto do que acontecia, estando perante a “digital first mentality”. No entanto, mudar esta mentalidade, com equipas com mais de 20 anos de experiência, requer investimento e tempo. Mas a nova geração ajuda a mudar este paradigma, passando o foco para o engagement nas redes sociais. Ainda assim, há um longo caminho a percorrer», explicam.
Nas áreas de Marketing das empresas, que não raras vezes englobam também a responsabilidade pelas vendas, a palavra conversão tornou-se fundamental. E esta é mais facilmente visível nos canais digitais até pelas métricas que lhes estão acopladas. No entanto, as empresas ainda estão no processo de encontrar quais são os canais resistentes, sendo que, cada vez mais, a media tradicional pede para se manter os níveis de investimento. E, muitas vezes, se estes não são mantidos, é porque os responsáveis pela gestão de orçamentos não vêem o retorno. Certo é que há marcas que, fazendo pré-vendas, têm muito mais procura do que o produto que têm para venda. E os responsáveis de comunicação defendem que os media têm de entender este movimento e adaptar-se a ele. «O comboio digital não é apenas um comboio de comunicação. É também de venda. E esse é um ponto muito importante», sustentam. Ainda assim avançam que «investir em rádio, em drive time, tem uma conversão excepcional para um determinado tipo de produto e marcas! Isso acontece com as love brands».
À mesa onde os profissionais conversam ouve-se, inclusive, dizer: «Apesar de se falar muito no preço, as pessoas não verificam o preço quando vão abastecer o carro. E os instrumentos de fidelização funcionam muito bem. Também aqui a rádio é muito importante para construir awarness, já que as pessoas abastecem em geral logo de manhã ou ao final do dia.»
No fundo as marcas percorrem o mesmo caminho dos consumidores. Há uma exploração dos novos canais, porque se a marca tem algo de novo a dizer, tem de estar no digital, pois é neste meio que o cliente está. Ainda assim, não deixa a media tradicional, já que os canais digitais são mais explorados, quando se procura alcançar uma relação de maior proximidade.
E os media?
Durante o almoço, destaque ainda para o panorama da comunicação e para a transição dos marketeers de Powerpoint para os de Excel. «As métricas estão mais complicadas, há mais desafios no digital. Neste universo, as equipas recebem imersões diárias oriundas do Google ou Facebook. Permite, no entanto, que haja uma forma de comunicar personalizada para cada utilizador e, por outro lado, permite alcançar outro feedback, estando perante uma situação mais sofisticada. As nossas salas, no futuro, serão como as da banca, percebendo onde se está a investir o dinheiro, em tempo real», afirmaram.
Mas certos players continuam dependentes dos meios tradicionais, até pelo facto da infoexclusão ser uma realidade em Portugal. Existem marcas que continuam a precisar da televisão, havendo, inclusive, métricas que comprovam que este meio é mais eficaz em termos de recall. No caso da rádio, o horário prime-time ainda merece um investimento significativo.
Quanto ao futuro, foi reconhecido que os media tradicionais passam por uma fase conturbada, mas existem formas de dar a volta, cabendo a cada meio traçar a melhor estratégia para o fazer. Esta necessidade de reinvenção também influenciará os anunciantes que, com a perda de importância dos meios tradicionais, perderão alguma cobertura e terão de redefinir as suas estratégias. «Os anunciantes terão esse problema: para chegar à quantidade de pessoas a que chegam hoje, terão de investir muito mais, uma vez que as audiências estão cada vez mais segmentadas e a tendência será para o acentuar desta situação», sublinharam os presentes.
Ainda que os media tradicionais continuem a ser um importante elemento dos planos de comunicação dos anunciantes, há quem já questione a eficiência da publicidade nestes meios. «Os media tradicionais continuam a ter um papel muito importante mas, quando se quer personalizar uma experiência e aumentar a proximidade com o cliente, o meio digital é o preferencial. Aliás, existe a percepção de que os meios tradicionais não cumprem a missão de entregar informação como acontece no digital», expuseram os participantes. No entanto, acrescentam que, no que diz respeito à percentagem de vendas no digital, para alguns negócios, ainda é marginal, «mas é reconhecida a capacidade de melhorar os registos».
Quando antes havia uma campanha no ar, hoje há várias a decorrer ao mesmo tempo. Algo que decorre da segmentação. A informação que se tem hoje sobre os perfis das pessoas é completamente apurado, o que permite direccionar as mensagens consoante os consumidores e as necessidades que estejam a sentir. Esta mudança implica uma maior exigência em termos de gestão de equipa, porque se trata de gerir não uma campanha do início ao fim com o mesmo princípio, métricas fechadas e tudo muito organizado, mas estar a gerir 30 em simultâneo.
Mais ainda, quando é preciso perceber como é que está a marca, não se pode olhar apenas para os meios tradicionais. Os relatórios que vinham de empresas de clipping já não chegam. Hoje, uma grande percentagem do que é dito sobre as marcas está a circular no online e no digital. «O digital permite ganhar uma notoriedade pública que antes não existia. O que é uma oportunidade de comunicação e um desafio. Existem variadas empresas que têm equipas dentro da área de comunicação dedicadas à produção de conteúdos audiovisuais, porque com a plataforma digital passam a ganhar escala para gerar notoriedade sobre a marca de um ponto de vista institucional e de produto. O vídeo de um evento que teve 15 pessoas pode ser partilhado nas redes sociais, no LinkedIn e também ser escalado», mencionam os participantes.
Quanto aos meios tradicionais, todos os participantes concordam que continuam a fazer falta sempre que é preciso trabalhar posicionamento. É aí que se consegue passar de forma massiva uma mensagem mais transversal. Além de que a credibilização de determinadas informações ainda passa muito pelos meios tradicionais, que atestam essa credibilidade da informação.
Quanto ao futuro, a palavra-chave é adaptação, pois o sucesso da estratégia das marcas dependerá da capacidade de interpretação do mercado e actuação no mesmo. «O mercado e o consumidor ditam os comportamentos. No futuro, alguns players irão acabar, outros irão crescer e, durante este processo, outros irão nascer. Tudo dependerá da capacidade de adaptação», concluem os participantes.
Artigo publicado na edição n.º 251 de Junho de 2017.