Depois do intervalo… Art marketing ou marketing na arte?
Por Nuno Pinto de Sousa – Mestrado Ciências da Comunicação (Internet e novos media), Universidade Católica Portuguesa
A sociedade enfrentou o seu maior desafio, devido a um problema de saúde pública sem precedentes e à escala global. Agora começamos a ver a possibilidade de calma e progressivamente podemos voltar ao ritmo das nossas vidas, apesar de nos irmos defrontar com um mundo diferente… Os agentes culturais podem retirar deste período várias lições.
O sector da cultura foi o primeiro a sair de cena e provavelmente será o último a regressar aos seus ‘palcos’. Mas foi igualmente, a par da área da saúde, o primeiro a corresponder com a sua capacidade criativa. Apesar de nem sempre receber os apoios e investimentos suficientes para o desenvolvimento da sua actividade ou, por outro lado, não ter a merecida audiência, aplausos e reconhecimento. Mas teve de forma espontânea ou organizada, de iniciativa individual ou colectiva, a habilidade de apenas com uma câmara ou até um simples smartphone, recuperar os seus arquivos e registos vídeo para partilhar os seus conteúdos em plataformas digitais.
Desde músicos a companhias de teatro ou dança, escritores ou empresas de audiovisuais, todos emitiram horas e horas de entretenimento para todas as idades e estilos, preencheram as horas mais difíceis das nossas vidas, enquanto vivíamos tempos de incerteza e angústia, foram os artistas e toda a comunidade da indústria cultural que nos proporcionaram alguns momentos de alegria e esperança.
Quando começamos a ter noção e conhecimento dos números de público que aderiram a estas iniciativas nas plataformas digitais, apesar de forma gratuita, mas que ultrapassaram em larga escala a capacidade das suas salas, no novo ciclo, todo este awareness e experiência não devem ser desperdiçados. Acredito que devem ser reforçados e potenciados a dois níveis distintos: a incorporação deste tipo de “códigos” nas suas estéticas e conteúdos; e em estratégias de comunicação e marketing igualmente de forma criativa.
Esta oportunidade claro que se depara, num primeiro momento, com um vasto conjunto de recursos, que têm de ser devidamente planeados e conjugados porque, à semelhança de outros meios, também este ambiente tem a sua linguagem própria: as equipas com os skills específicos, a aquisição de ferramentas e software, uma parte do orçamento de comunicação, especificamente para o digital; e, finalmente, o tempo, devido à ‘barreira’ das partilhas, algoritmos e rankings.
Sem terem a necessidade de recorrer a todos elementos da designada digital culture, nomeadamente os processos técnicos, as formas de expressão e narrativas ou as experiências imersivas, podem facilmente – e sublinho- com criatividade, amplificar a sua comunicação com ideias das mais simples às mais complexas: uma companhia de teatro ou dança, um vídeo no YouTube com uma entrevista com o autor, encenador, ou até algum protagonista; uma orquestra com partilha de alguns ensaios, um artista plástico a mostrar o seu estúdio; um escritor ler umas páginas do seu novo livro num podcast, entre muitas outras formas…Embora alguns deste passos já tenham sido dados, agora precisam de ganhar uma nova dinâmica e consistência.
Porque as vantagens de aplicar os new media são significativas e de diversa ordem. Além de terem a possibilidade de divulgação junto do público antes das suas performances, podem criar uma maior expectativa ou até uma descrição mais pormenorizada; criar espaços de diálogo directo entre as suas comunidades e os artistas, sem necessidade de intermediação; ter o feedback imediato e reacção do seu público; criar também uma sensação de pertença e igualmente de benefícios ao público mais fiel e frequente; e, acima de tudo, uma vantagem primordial ao aplicar os new media, um maior engagement e impacto na sociedade.
Esta pode ser, no fundo, a questão mais sensível. Mas se todos consideramos a cultura como um pilar fundamental, quer para a construção dos nosso valores e personalidade como indivíduos, ou como forma de construirmos a nossa memória e identidade no plano colectivo, se ao agentes culturais desejam ter uma participação activa na disseminação das suas ideias e lançar a discussão para os temas mais abrangentes e delicados da sociedade contemporânea, se a comunicação e o marketing tem evoluído ao longo das últimas décadas, então estão reunidas todas as condições para que ao agentes culturais tenham todos os aplausos…
Contudo, é preciso também olhar para este “intervalo” com outra perspectiva: a de que o Covid-19 nos obrigou infelizmente a suspender por momentos as nossas vidas, ao distanciamento social, mas também a parar e reflectir e olhar para o futuro que se advinha repleto de novos desafios. Nesta área de actividade, que a comunicação e o marketing não deixem de ser um cargo meramente funcional ou secundário, mas que se admita possa estar à disposição, com todas os novos meios digitais para a captação e fidelização de novos públicos e audiências para todos os agentes culturais ou, para ser ainda mais objectivo e concluir, se o marketing é uma arte, porque não estar igualmente ao serviço da arte?